Luiz Gomes: ‘Tempos difíceis’

'No Brasil, a ameaça do desemprego, da perda de renda, atinge em cheio a quem vive em torno do futebol'

Grêmio x São Luiz
Último fim de semana teve diversos jogos sem público nos Estaduais (Foto: Lucas Uebel/Grêmio)

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Só os médicos, os sanitaristas, os profissionais de saúde pública, do alto de sua competência, sabem o que é melhor para enfrentar a pandemia do coronavírus. É preciso confiar que estão certos e cumprir o que determinam. Neste sentido, a CBF e as federações tardaram a tomar as medidas necessárias. E o fazem após outras modalidades nacionais, bem mais rápidas em reagir e enquadrar-se nas recomendações internacionais de suspender competições e eventos de massa.

Não havia razão, no cenário atual, para manter campeonatos em andamento, ainda que com jogos de portões fechados como ocorreu no fim de semana em boa parte das capitais. Além do risco para a saúde de jogadores e das comissões técnicas, convenhamos que não há sentido em haver futebol sem público. Como disse Guardiola, quando foi questionado sobre a paralisação da Premier Ligue, jogar com arquibancada vazia é como apresentar uma peça num teatro sem plateia. Uma dupla punição aos atores do espetáculo.

Mas serão os centenas de milhares infectados espalhados por todo o planeta - com todo respeito e solidariedade que merecem as famílias dos que e se foram - as maiores ou mesmo as únicas vítimas dessa peste? Muito longe disso. Um preço tão alto pelas medidas adotadas agora será pago também por centenas de milhares de pessoas que, sobreviventes, terão suas vidas fortemente abaladas, perderão seus empregos com a falência ou a quebra de sustentabilidade de empresas, o fechamento de seus negócios individuais, a estagnação de setores inteiros da economia.

O esporte se insere firmemente nesse contexto. Nos EUA, com a suspensão da temporada da NBA, ficaram sem sua fonte de renda todos os funcionários que trabalham nas arenas da liga que, sem vínculo empregatício ou qualquer proteção social ganham por jogo em que atuam. Jogadores têm feito vaquinhas para garantir que tenham as necessidades básicas atendidas e que possam, em um país onde o sistema se saúde pública tem nível de terceiro mundo, arcar com os custos do tratamento em caso de contaminação.

Já há preocupação, se a paralisação perdurar por muito tempo, com o futuro de algumas franquias da NBA. Com despesas elevadíssimas, pelos salários milionários pagos às grandes estrelas, o basquete americano precisa da receita de jogos para manter girando a roda do seu negócio. Uma situação igual, diga-se, a de todas as outras ligas de esportes nos EUA e a dos principais clubes de futebol na Europa, na Ásia e aqui do outro do Oceano Atlântico.

No Brasil, a ameaça do desemprego, da perda de renda, atinge em cheio a quem vive em torno do futebol, como os quadros móveis que atuam nas arenas, os ambulantes que gravitam em torno dos estádios e, até, porque não, os próprios jogadores. Bem ou mal, apesar do amadorismo da gestão e das dívidas impagáveis, a maior parte dos chamados grandes clubes ainda tem como segurar a barra. Mas, penalizados por uma estrutura arcaica e um calendário que os mantêm ativos por apenas três ou quatro meses por ano, os clubes pequenos não terão como aguentar sem jogar por muito tempo. Sem arrecadação, atrasarão salários, sem pagar terão de dispensar jogadores antes mesmo do que o previsto. A imensa maioria já vive agora essa situação de risco.

A demora da CBF e das federações em fazer o que devia ser feito não chega a surpreender, especialmente em uma país onde o presidente da república se acha no direito de desrespeitar recomendações médicas e fazer demagogia em praça pública. Que belo exemplo! Com a suspensão de todas as principais competições ao redor do mundo, o esporte faz a sua parte na mobilização global pela saúde e a vida. Ainda é cedo para se saber por quanto tempo esse período de quarentena esportiva vai perdurar. Mas, que ninguém se iluda, quanto mais o tempo passar, mais para muitos e sob muitos aspectos, o esporte jamais voltará a ser o mesmo.

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