Brasileira está entre analistas da Fifa no Mundial Sub-17; veja entrevista exclusiva
Simone Jatobá está no Catar como integrante do Grupo de Estudos Técnicos

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Simone Jatobá tinha quatro Copas do Mundo no currículo. Duas delas como jogadora da Seleção Feminina, e outras duas comandando a equipe Sub-17. Agora, são cinco, mas numa função totalmente nova. A brasileira foi escolhida pela Fifa para integrar o Grupo de Estudos Técnicos (TSG, na sigla em inglês) do Mundial Sub-17, que está sendo disputada no Catar.
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Composto por ex-atletas e treinadores do mundo inteiro, o TSG é organizado pela Fifa em todas as Copas do Mundo, de todas as categorias. A função do grupo é acompanhar as partidas e elaborar relatórios sobre suas impressões. No final da competição, os estudos são distribuídos às federações do mundo todo.
— Isso ajuda no crescimento de todas as seleções, porque elas sabem quais são os pontos fortes, o que está acontecendo, quais são as evoluções em termos físicos, em termos táticos, em termos técnicos. É algo extremamente importante para a evolução do futebol e para as federações — explicou Simone Jatobá ao Lance!. A brasileira concedeu entrevista exclusiva nessa quarta-feira (19). Confira:
LANCE! Muito se fala em "escolas" no futebol. A Copa do Mundo Sub-17 demonstra que existem de fato essas escolas? Ou hoje em dia o futebol é mais homogêneo?
SIMONE JATOBÁ - A gente tem visto escolas, estilos de jogo realmente muito diferentes. A gente vê seleções jogando com características bem próprias. Por exemplo, as africanas, um jogo muito forte, muito veloz, habilidoso. São surpresas muito boas. Vimos também a Nova Zelândia com outra característica. Eu acredito que, eu acho que está bem homogêneo, sim.
Nessa questão de homogeneidade, a base costuma jogar como as seleções principais de seus países, ou não?
Acredito que sim. A gente vê características muito semelhantes às que a gente vê nos jogos do masculino principal. Acho que está acontecendo muito isso das federações (nacionais) estarem preparando os meninos para que eles tenham esse entendimento de jogo, na sua formação, para quando chegarem na equipe principal estarem jogando e atendendo a tudo aquilo que a confederação do seu país deseja como estilo de jogo. Mas, obviamente, a gente vê que há atletas diferenciados, com as suas características, e que isso balança o jogo.
Carlos Alberto Parreira já disse que esquemas táticos já foram esgotados. Tudo que se podia fazer já se fez. Temos, por exemplo, o 4-4-2, o 4-3-3, o 3-5-2. No Mundial Sub-17 você percebe que as seleções replicam exatamente o que a gente vê nas seleções principais, ou tem alguma diferença?
Temos visto muitas coisas interessantes. A gente tem visto, sim, o 4-4-2, o 4-3-3, o 3-5-2. Mas a gente tem visto também o 4-2-4, o 4-1-4-1, a última linha ofensiva sendo bem povoada. Eu acho que isso demonstra, sim, uma característica que vem da equipe adulta, mas que os juvenis, com essa idade, eles estão tendo, e os treinadores também, autenticidade com aquilo que eles estão colocando dentro de campo, não sendo robotizados. E, obviamente, dentro da característica do jogo e do adversário, se demandam estilos e sistemas de jogo diferentes e eles vão mudando de acordo com a ofensividade ou até mesmo as transições defensivas. Isso é muito interessante porque a gente tem visto coisas iguais, ma também diferentes do que a gente vê do principal.
No Mundial Sub-17 os jogadores ainda têm espaço para improviso? Eles têm chance de mostrar suas habilidades, de jogar mais por si do que apenas pensando na obediência tática?
Existe, sim, a obediência tática, isso é o fator principal para que a equipe fique organizada. Muitas equipes, a grande maioria, são muito organizadas, e essa organização se dá na construção. O improviso acontece muito, principalmente nessa idade, no meio-campo para frente. A gente vê também laterais improvisando com muita habilidade, entrando pelo meio. Eles têm respeito tático porque é o principal coletivamente, mas o desequilíbrio individual tem acontecido, sim.
Brasileira elogia seleções de Uganda e Burkina Faso no Mundial Sub-17
E quais seleções te impressionaram? Aquelas que você olha e pensa que daqui a quatro, cinco, dez anos terá bons frutos na principal.
Olha, Burkina Faso eu achei uma equipe que surpreendeu muito. Uganda, de fato, não conhecia e fiquei impressionada, porque o estilo de jogo muito rápido, habilidoso, jogadores conscientes, embora jovens. E, obviamente as equipes que a gente já sabe que tem tradição. O Brasil está com uma equipe muito boa, Portugal, Suíça está surpreendendo também, a Áustria, a gente vê aí as quartas de finais sendo muito bem representada. Mas essas duas equipes (Burkina Faso e Uganda) particularmente me surpreenderam, porque eu não conhecia e achei um futebol muito organizado, muito autêntico e muito ousado também, sem medo de jogar.
O futebol de base mudou muito nas últimas décadas?
Acredito que sim, mudou bastante. Antes a gente tinha muito jogo engessado e hoje a gente vê jogos muito interessantes, porque você coloca sistema tático, eles mudam durante o jogo e isso é muito interessante. Antes a gente via que entravam, por exemplo, num 4-2-3-1, mas o sistema defensivo era um 4-4-2 e não passava daquilo. Hoje a gente vê que durante o jogo tem uma mudança até mesmo de três ou quatro sistemas durante o jogo. Essa mudança, e até em termos de equilíbrio de seleções, eu vejo que evoluiu muito.
Como é que é na prática o trabalho que você está fazendo neste Mundial Sub-17? Como é a sua rotina de avaliações,? Todos os dias você vai no jogo, você acompanha alguma coisa pela TV?
É muito bacana, é algo que eu sou muito apaixonada. A gente acompanha em campo mesmo, todos os dias que têm jogos nós vamos para campo acompanhar ao vivo. Fazemos nossas anotações e tem todo o apoio da análise, para tudo que a gente necessita. Depois elaboramos um relatório, passamos todas as situações que a gente vê para os analistas e eles verificam se tudo aquilo que a gente reportou realmente existiu dentro do jogo, para ter essa comparação entre câmera e os nossos olhos de experiência, como treinadores, jogadores. A gente se reúne também para os nossos debates, para tudo aquilo que está acontecendo dentro de campo.

Você tem um roteirinho pré-estabelecido?
Temos um cronograma. Tem dias que a gente assiste dois jogos, tem dias que a gente assiste um jogo só, e nesse jogo a gente tem que avaliar todas as duas equipes. Nessa análise a gente vê a parte ofensiva, a parte defensiva, sistema de jogo, transições, tudo que acontece realmente, parte tática, que é muito importante para a gente pontuar jogadores que são destaques, jogadores que chamam atenção em deslocamento, em movimento, em troca de posição, tudo aquilo que o futebol demanda dentro de campo. A gente reporta e tenta ver o que também tem de diferente, o que está acontecendo diferente dentro de campo, que às vezes as câmeras não mostram. Estamos ali percebendo comportamento dos jogadores, comportamento da comissão técnica, como tudo funciona.
Como você considera que a Fifa pode usar esses dados ao final?
Isso é algo que tem me deixado muito impressionada também. Esses dados todos formam um levantamento que é feito no final da competição, e oito semanas depois ele é reportado e passado para todas as seleções. As seleções têm abertura e podem fazer essa troca com a Fifa. Isso faz o crescimento de todas as seleções, por elas estarem sabendo quais são os pontos fortes, o que está acontecendo, quais são as evoluções em termos físicos, em termos táticos, em termos técnicos. Isso é algo extremamente importante para a evolução do futebol e para as federações.
Esse tipo de trabalho faz parte da tua vida, do teu cotidiano, mas você já tinha feito para a Fifa, numa Copa do Mundo, um trabalho assim?
Um trabalho como este é a primeira vez.
Pessoalmente, considera uma realização, um reconhecimento do seu trabalho?
Ah, eu fico muito feliz. A Fifa representa algo muito grande para a gente em termos de futebol no mundo. Participei de duas Copas do Mundo como atleta e duas Copas do Mundo como treinadora. Esta é a minha quinta Copa do Mundo, mas de uma maneira diferente, no estudo técnico. É de uma forma que eu fazia quando eu era treinadora, mas num nível completamente diferente. Acho que essa troca, essa tecnologia, as coisas que eu estou aprendendo também com os outros observadores — porque nas nossas reuniões a visão, a forma de pensar, situações que ocorrem, que às vezes a gente acaba não notando tanto, depois são comentadas — está sendo muito gratificante. É um reconhecimento do meu trabalho, da minha carreira, da minha vida dentro do futebol, que é algo que eu sou realmente apaixonada.
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