Lauter no Lance!: Grazie, Carlo!
Brasil vence amistoso com espetáculo coletivo

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Nas últimas duas décadas, nossa seleção sempre priorizou o craque, o individual, o showman, em detrimento do time, do coletivo. Hoje, meninos, eu vi um time de futebol que vestia amarelo. Hoje o espetáculo veio do time, e não dos craques. Uma "Jam Session" especial, com alguns solos bonitos, um grande pianista homenageando, quem sabe, um amor perdido pela vida, ou o trompetista já gasto pelo tempo, desfilando dores de perdas, transformadas em sequência de notas mágicas, que tocam almas, escancaram histórias. Mas sempre voltando ao tema querido por Carlo Ancelotti, o virtuosismo do conjunto. Maestro Ancelotti, dirigiu magistralmente sua banda!
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Um time incansável, marcando os pobres coreanos, atualmente uma das três melhores seleções da Ásia, acuados, amassados em sua própria intermediária. E o público que assistiu, mundo afora, encantado, se pergunta: onde estavam vocês, estes anos todos? A última grande apresentação desse conjunto admirável, competitiva e virtuosa, deve vir lá de 1982, da frustrante campanha do Mundial da Espanha, no velho e triste estádio Sarriá. Ou não! Talvez somente o time tricampeão mundial de 1970 tenha praticado o "Futebol Total" que assistimos, neste primeiro tempo de Brasil e Coreia. Sim, escrevi estas, mal traçadas e rabiscadas linhas no intervalo do jogo, sob o efeito inebriante de uma jazz Band dos sonhos. Feras domadas, amestradas, mas soltas numa savana pouco pisada nos últimos 50 anos!
Saudosos lampejos virtuosos, dos meninos da bola, enfim, voltei a ver! Me lembrei de uma noite chuvosa e fria, num Blue Note meio vazio, de uma Nova Iorque ainda pré 11/09. Entrei, ainda era cedo, umas 7 da noite. E dou de cara com Ray Charles, que segundo o garçom que me atendia, estava "On Fire" com sua banda e convidados (e que convidados!) desde as 4 da tarde! Era uma seleção do século, do milênio, que, por sinal, estava quase no fim, era 1998. Sob sua a batuta, talvez em sua última grande sessão de jazz e, por conta disso, os jogadores jogavam, literalmente, por música! Encantado, eu não tirava os olhos destes senhores da música, só me lembrei de pedir algo para beber horas depois. Não me lembro sequer se respirei. Não tenho a mínima noção de como voltei ao hotel.
Seleção de Carlo Ancelotti seguiu pressionando mesmo vencendo de muito
Só sei que a sensação é muito parecida com o que sinto, nesse momento, numa manhã fria e chuvosa do meu Rio de Janeiro, aos 12 minutos do segundo tempo, com o Brasil vencendo o amistoso contra a Coreia do Sul por 4 a 0, e pressionando, amassando a, acuada, Coreia, como se estivesse perdendo!
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Nesse momento, a câmera filma Carlo Ancelotti, que mastiga freneticamente seu chiclete, e quase sorri. Como naquela noite fria e chuvosa de uma noite qualquer de 1998 em NY, quando num momento em que a banda inteira tocava Georgia on My Mind, apenas Ray parou de tocar, levantou as mãos, abriu leve sorriso, e, provavelmente, tenha agradecido por aquele momento de performance, entre amigos, um bando de gênios, dando a alma, por uma boa música, numa noite chuvosa, quase terminando, competindo com o suave barulho de chuva, lá fora. Pra eles não havia "lá fora", o mundo era aquele pequeno palco, aquelas poucas mesas ocupadas, e era eu, pensando que jamais veria algo igual na minha vida.
Eu estava errado. Ainda haveria espaço para alguns momentos como este. Para um sorriso único e um brilho no olhar inesquecíveis de alguém, ou um raro momento do esporte, ou talvez um instante de afeto de filhos, uma música que nos marca para sempre. Ou um simples amistoso lá na Coreia, lá também uma noite de chuva, ouvindo Ray Charles cantar, pela milésima vez Georgia on My Mind, vejo um time jogar por música, inteiro e incansável. É como se o maestro tenha colocado para trabalhar na construção de uma casa, como pedreiros, marceneiros e pintores, Oscar Niemeyer, Lúcio Costa e Ruy Ohtake. Hoje, eles tinham nomes diferentes. Eram Vini, Raphinha Matheus.
Nesse momento, aos 32 minutos do segundo tempo, o jogo está 5x0, e Carlos Ancelotti, começa a mudar o time, desfazendo ou pouco a magia de bola. Sim, hoje vimos um time jogar, dar show, marcar com garra! Enfim, jogar como um grande time, que nasce pré-maturo, mas na hora certa. Ancelotti, do banco, balança a cabeça positivamente. Eu, do meu canto, respondo ao sorriso de Carlo. Grazie, Carlo!
Já fomos melhores nisso!
Há quase 2 horas, em Santiago do Chile, foi definida a cidade-sede dos Jogos Pan Americanos de 2031. Eles acontecerão em….
… Assunção, orgulhosa capital do Paraguai!
Desde as primeiras apresentações, a sensação que nos transmitiam era, do lado do Paraguai, um trabalho real, factível, já consolidado. Do nosso lado, um certo desleixo, algumas pontas desconexas e não totalmente desenvolvidas. Parecia que o projeto brasileiro carecia de conteúdo. Levava-se em conta o histórico recente de grandes disputas, como o Pan de 2007, a Copa do Mundo de 2014, e os Jogos do Rio 2016. Que deixaram, além de muitas dúvidas na lisura das eleições, a sensação de sermos imbatíveis. Dúvidas também pairaram em Santiago hoje. Como algumas promessas, invariavelmente esquecidas à cada eleição. Seja a recorrente despoluição da Baía da Guanabara (citada desde 1998, na primeira tentativa de sediar uma Olimpíada) à criação da Linha 3 do Metrô do Rio, chegando em Niterói e São Gonçalo, entre muitas outras promessas olímpicas. E muitas outras questões levantadas, mas não respondidas (plano de segurança e antiterrorismo, o mais citado e pouco respondido). Enquanto a candidatura de Assunção se baseava em fatos, leis e projetos esportivos consistentes e funcionais, nós apresentávamos imagens bonitas das praias, calçadões cheios de pessoas sorridentes e de locais de provas prontos (muitos obsoletos, carentes de obras). Enfim, como é sobre esportes, podemos dizer que nadamos, nadamos, pra morrer na praia.

Mas, cá pra nós, são praias lindas mesmo. Tomara que dê sol amanhã! Enfim, fica a lição. Façam a lição!! Eles fizeram.
Lauter Nogueira
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