Pesquisadores brasileiros participam de estudo de universidade dos EUA sobre lesões na NFL em 2020

Nágela Freitas e Augusto César Ferreira De Moraes trabalham em uma pesquisa que testa hipótese de que houve aumento na incidência de lesões em decorrência da ausência de pré-temporada na NFL

Dak Prescott
Dak Prescott é retirado de campo após sofrer grave lesão no tornozelo direito, contra o New York GIants (Foto: Reprodução/Twitter/Tom Fox)

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O interesse do Brasil na NFL cresce a cada ano, com o país sendo já o terceiro maior consumidor da liga, atrás apenas dos Estados Unidos, obviamente, e México. Isso abre espaço para ter brasileiros envolvidos nos mais diversos setores do esporte, incluindo o acadêmico. Esse é o caso de Augusto César Ferreira De Moraes e Nágela Freitas, que fazem parte de um grupo de pesquisa da Universidade do Texas, que testa a hipótese: “A falta da pré-temporada tem efeito no aumento de lesões em jogadores da NFL”.

Augusto César Ferreira De Moraes é professor colaborador da Universidade de São Paulo (USP) no departamento de epidemiologia. Tem pós-doutorado pela prestigiada universidade John Hopkins, nos Estados Unidos, e pela USP. Nágela Freitas é fisioterapeuta, especialista em ortopedia e traumatologia pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Ela é personagem já conhecida por parte dos fãs da bola oval, como ex-integrante do NFL de Bolsa, onde fazia levantamento semanal das lesões da liga.

O Lance! conversou com os dois profissionais para entender como dois brasileiros foram convidados a integrar uma pesquisa acadêmica da Universidade do Texas. E os dados que já foram coletados até o momento sobre o assunto.

O lado bom das redes sociais

A ideia do estudo, que começou em dezembro do ano passado, é de Gregory Knell, professor assistente da Universidade do Texas. O pesquisador norte-americano já conhecia Augusto César Ferreira De Moraes por participações em outros projetos na área da saúde. Sabendo da paixão do brasileiro por NFL, o americano o convidou para integrar a pesquisa sobre o impacto da ausência de pré-temporada nas lesões. Um assunto que trouxe inúmeras discussões na mídia que acompanha o futebol americano, após os jogos da pré-temporada em 2020 terem sido cancelados em decorrência da pandemia de coronavírus.

- Tinha uma discussão grande na NFL e meios esportivos sobre o que viria acontecer em lesões musculares e articulares pela falta da pré-temporada. Há uma discussão sobre a quantidade de jogos da pré-temporada, falam que são muitas partidas, até a NFL queria diminuir para dois ou três jogos. Ao contrário do que a gente pensa, os treinos na NFL dificilmente reproduzem o jogo. São unidades separadas e acabam fazendo um ou dois treinos com equipamento completo. Esses jogos de pré-temporada seriam os treinos efetivos. Por causa da pandemia eles acabaram não acontecendo. A hipótese é que a incidência de lesões articulares, principalmente do joelho, aumentou, por falta desta adaptação ao jogo, por conta da ausência da pré-temporada. Quando você está jogando, competindo, isso pra qualquer esporte, o seu sistema muscular e articular se capacitam pra prevenir lesões – explicou Moraes.

Mas a inclusão de Nágela Freitas transparece o lado bom das redes sociais e o impacto da mídia. Augusto conheceu o trabalho da fisioterapeuta através de uma citação na ESPN sobre uma postagem no Twitter da fisioterapeuta. Ao checar o conteúdo nas redes sociais, Augusto se impressionou com o detalhamento que a fisioterapeuta fazia das lesões na NFL. Quando a oportunidade da pesquisa junto à Universidade do Texas bateu em sua porta, ele não pensou duas vezes e chamou Nágela para participar do trabalho.

- Não tenho nenhum fisioterapeuta no meu grupo de pesquisa da USP e ninguém se encaixava neste padrão. Fui na cara de pau para convidar ela. A sorte minha e do Gregory é que ela topou. A Nágela, pelo pouco que conheço, é muito organizada e já tinha um histórico de ficar coletando dados de lesões. E em janeiro, ela começou esse trabalho de coleta de dados conosco.

Nágela é uma referência nas redes sociais para aqueles que buscam informações sobre lesões de jogadores da NFL. Os posts da fisioterapeuta no Twitter detalhando lesões têm um enorme engajamento na rede. Ela, inclusive, é uma fonte de informações para os profissionais da ESPN no Brasil, emissora que detém os direitos de transmissão da liga de futebol americano.

- Eu via a necessidade de ter uma linguagem que trouxesse a parte técnica, mas divulgasse para as pessoas que não tem tanta compreensão da área. Tem coisa que é óbvia na minha cabeça como profissional da saúde, mas falta trazer isso (para o grande público) de forma mais simplista. Como fazia vídeo de levantamento de lesões, tinha listado isso semanalmente. Com planilhas com nomes dos jogadores, lesões... Então já tinha esses dados, mas não de todos os anos, como vamos fazer, com um número bem bacana trazendo temporadas comparativas – explica Nágela.

Estrelas caídas

Alguns astros do esporte, logo nas primeiras semanas da temporada 2020, tiveram graves lesões. Nomes como Dak Prescott, Nick Bosa, Saquon Barkley, Ronnie Stanley e Joe Burrow logo vêm a mente. Isso foi um dos fatores que mais alertaram o mundo da NFL que algo poderia estar errado em relação a anos anteriores.

- Acho que o ponto que foi levantado nesta temporada é que vimos muitos jogadores importantes com lesões graves. A questão na pré-temporada é que há uma rotatividade muito grande, jogam muitos jogadores reservas. E aí existem muitos atletas reservas que sofrem essa ruptura ou algum tipo de lesão na pré-temporada. O ponto, realmente, que foi levantado é que, na temporada, os jogadores tiveram que ir de 0 a 100 – digamos assim – já num jogo que tem validade. Sendo que normalmente vemos esses jogadores jogando poucos minutos na pré-temporada, justamente para ter essa preparação – opina Nágela.

Metodologia e coleta de dados

Na divisão de tarefas do estudo testando a hipótese da falta de pré-temporada no aumento de lesões dos atletas na NFL, Augusto é responsável pela parte metodológica, enquanto Nágela atua na coleta de dados. A pesquisa segue o método caso-controle, no qual você pega os casos da ‘doença’ e compara com os dados do grupo de controle. Desta forma, o trabalho vai analisar as lesões nas temporadas de 2011 e 2020, anos que o período de pré-temporada foi limitado por causa de assuntos extracampo – ano passado pela pandemia e em 2011 por causa do locaute dos jogadores, que negociavam um novo acordo com os proprietários de franquias. O comparativo será com outras cinco temporadas, entre 2015 e 2019, que a pré-temporada foi completa, sem nenhum problema extracampo.

- Basicamente a metodologia é essa. E tem outras variáveis como tipo de gramado, idade do jogador, qual posição e qual unidade ele joga, etc – define o professor colaborador da USP.

Nágela, desde janeiro, está dedicando seu tempo e atenção a coletar e encontrar dados referentes às lesões. E já teve um fato curioso que chamou a atenção dos pesquisadores.

- O K’Waun Williams (do San Francisco 49ers) teve uma lesão rara de LCA (ligamento cruzado anterior do joelho). Ele ficou três ou quatro semanas fora e voltou, não indo para cirurgia. Não me lembro de um jogador que teve lesão desta e não foi para cirurgia. Porque se tem uma lesão parcial de LCA em algum momento vai romper. Então, normalmente, elas convertem em lesões totais. Mas não foi especificado o que teve com ele – disse.

Aliás, a falta de detalhamento das lesões pelas franquias da NFL é uma barreira que os pesquisadores têm que superar para obterem os dados corretos para o estudo. Nágela conta que, em certos casos, tem que pesquisar até em fotos para identificar em qual lado foi a lesão.

- Como já tinha certa listagem de alguns anos está um pouco fácil neste sentido. Mas eu tenho que entrar e pesquisar a lesão de cada jogador e não tem uma especificação muito grande. A perna estava bem difícil de identificar, pois eu estava separando entre lado esquerdo e direito. Às vezes, procuro a foto, vejo qual perna que tem a posição de proteção – afirma a fisioterapeuta, que completa:

-É um trabalho de formiguinha, tem que buscar em várias fontes e estamos trabalhando com fontes que o público tem acesso. Mas tem essa dificuldade, realmente, pois a NFL é um pouco nebulosa em especificar sobre as lesões. Como estamos falando sobre um tipo específico de lesão, é um número que conseguimos com mais facilidade pesquisar. Mas tem essa dificuldade e é um trabalho muito minucioso. Tendo que verificar em várias fontes diferentes.

Gostou do trabalho que os dois vão desenvolver na pesquisa da Universidade do Texas? Então, você pode acompanhar mais sobre o o trabalho dos pesquisadores nas redes sociais:

Augusto César Ferreira De Moraes
Twitter: @augustocesafm & @ycarerg
Instagram: @augustocesar.fm & @ycare_rg

Nágela Freitas
Twitter: @nahfreitas42
Instagram: @nahfreitas42

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