Esporte como política de Estado: Congresso torna a Lei de Incentivo permanente
Votação simboliza reconhecimento do papel transformador do esporte

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Em uma demonstração rara de unidade em torno de uma única pauta, o Congresso Nacional aprovou por unanimidade o Projeto de Lei Complementar (PLP) 234/24, que torna permanente a Lei de Incentivo ao Esporte (LIE). A votação, com apoio integral tanto na Câmara dos Deputados quanto no Senado Federal, simboliza um reconhecimento inequívoco de todos os partidos – seja de direita, centro ou esquerda –, do papel transformador do esporte no desenvolvimento humano e na inclusão social. A convergência política em torno do tema revela que o esporte tem a força de ultrapassar barreiras políticas e representa oportunidade, inclusão e esperança para milhares de jovens e famílias em todo o país.
A mobilização política para o avanço e a aprovação do projeto foi notável. Na Câmara, a proposta foi analisada por uma Comissão Especial sobre o tema e o texto foi relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB/SP), ex-ministro do Esporte (2006-2011). Já no Senado, a relatoria foi da senadora Leila Barros (PDT/DF), medalhista olímpica (1996 e 2000), que se emocionou no Plenário ao ver a política pública ser aprovada por todos os parlamentares presentes. A definição desses nomes demonstra como a discussão incorporou não só conhecimento político, mas também uma trajetória marcada pela prática esportiva. Os debates também contaram com ampla participação social de outros atletas e ex-atletas de diferentes modalidades, que acreditam que investir no esporte é investir em educação, cidadania e oportunidades que transformam vidas em todas as regiões do Brasil, especialmente em comunidades mais vulneráveis.
Por meio da Lei de Incentivo ao Esporte, pessoas físicas e jurídicas podem contribuir com o fomento do esporte, desde a base até o alto rendimento, ao destinar parte do seu Imposto de Renda a projetos aprovados pelo Ministério do Esporte, por meio de doação ou patrocínio – um mecanismo que democratiza o financiamento esportivo e conecta a sociedade civil ao desenvolvimento de políticas públicas. Criada há quase 20 anos (Lei 11.438/2006), a LIE deixou de ser um instrumento provisório, que dependia de reavaliações periódicas a cada cinco anos, para tornar-se uma política permanente.
O texto aprovado no Congresso atualiza pontos relevantes. Entre as mudanças está a ampliação, a partir de 2028, de 2% para 3% do percentual de renúncia fiscal para pessoas jurídicas, podendo chegar a 4% em projetos desportivos ou paradesportivos com foco em inclusão social. Já o percentual de 7% para pessoas jurídicas foi mantido.
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Captação de R$ 6 bilhões em quase duas décadas
Ao longo de quase duas décadas, a LIE já viabilizou a captação de R$ 6 bilhões, sendo R$ 1 bilhão apenas em 2024, quando mais de 6 mil projetos foram cadastrados no programa – um recorde histórico que evidencia a vitalidade e a capacidade de mobilização social do programa. Com uma política de incentivo perene, conferimos segurança jurídica, afastamos os riscos de descontinuidade dos projetos e aceleramos o processo, uma vez que não há mais a necessidade de reavaliação periódica da norma pelos legisladores.
O caráter permanente dessa lei representa, ainda, um salto de qualidade para o setor esportivo. A estabilidade jurídica não apenas garante previsibilidade às instituições e aos atletas, como também confere segurança às empresas que optam por investir parte de seu imposto em projetos esportivos. A previsibilidade, garantida nesta lei, permite que programas regionais e nacionais sejam planejados a longo prazo, reduzindo a dependência de recursos sazonais e assegurando a continuidade de iniciativas que fazem do esporte uma ferramenta concreta de inclusão, prevenção à violência, promoção da saúde e melhora da qualidade de vida.

Vetor de desenvolvimento econômico
Mas o alcance da lei vai além dos benefícios sociais. O esporte é também vetor de desenvolvimento econômico. O Relatório PIB do Esporte Brasileiro, lançado este ano pelo Instituto Sou do Esporte, mostrou que o setor movimentou R$ 183,4 bilhões em 2023, o equivalente a 1,69% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. O levantamento afirma que a cada R$ 1 investido pelo poder público, o retorno econômico foi de R$ 12.
Esse potencial não se traduz apenas em números, mas em iniciativas concretas que projetam o Brasil no cenário internacional. Neste ano, grandes eventos realizados no país contaram com recursos da Lei de Incentivo ao Esporte. A Street League Skateboarding (SLS), maior liga mundial de skate street, recebeu cerca de R$ 10,5 milhões entre 2023 e 2025. Na ginástica, o aporte de R$ 1,9 milhão viabilizou o 41º Campeonato Mundial de Ginástica Rítmica e garantirá a manutenção de 29 centros de treinamento espalhados pelo país. Ações como essas comprovam que o investimento público não apenas fortalece os investimentos em esporte e educação, mas também consolida o Brasil como palco de competições globais e reforça a imagem positiva do país no cenário internacional.
E não para por aí. A Lei de Incentivo ao Esporte não atua sozinha, ela se soma a outros pilares de financiamento que sustentam, sobretudo, as modalidades de alto rendimento nacional. Quando completou duas décadas, o Bolsa Atleta (Lei nº 10.891/ 2004), já havia destinado mais de R$ 1,5 bilhão a cerca de 37 mil atletas, tornando-se o maior programa de patrocínio individual do mundo. Somente neste ano, o programa bateu recorde de beneficiários, com 9.207 esportistas apoiados.
A esse esforço soma-se a Lei das Loterias, que desde 2001 tem transformado o cenário de financiamento do esporte nacional. Em mais de 24 anos, já repassou mais de R$ 17,42 bilhões às confederações esportivas.
Foi graças a esses mecanismos que o Brasil conseguiu manter parte dos investimentos mesmo em períodos mais delicados, como em 2019 e 2020, quando a transformação do Ministério do Esporte em Secretaria Especial de Esporte e a pandemia da Covid-19 resultaram em cortes orçamentários. Nesse cenário de crise, foram justamente os chamados recursos extraorçamentários – advindos das loterias e de patrocínio das estatais – e os gastos tributários, como os viabilizados pela Lei de Incentivo ao Esporte, que mantiveram a engrenagem do esporte funcionando.
Segundo dados da Transparência no Esporte, em 2020, do total de R$ 154 bilhões investidos no setor, apenas 6,93% vieram do orçamento estatal, enquanto os gastos tributários responderam por 46,22% e os recursos extraorçamentários por 46,85%. Esse quadro começou a se alterar no ciclo dos Jogos de Paris, quando, em 2024, o investimento total alcançou R$ 2,23 bilhões, com um crescimento expressivo do orçamento público, que saltou para 12,25%. O resultado não demorou a aparecer: as Paralimpíadas colocaram o Brasil no top 5 do quadro de medalhas, com recorde histórico de 89 pódios, enquanto os Jogos Olímpicos renderam 20 medalhas e o segundo melhor desempenho da história do país.
Compromisso histórico com o futuro do esporte brasileiro
Esses números evidenciam que o esforço coletivo – entre Estado, empresas, atletas e sociedade – tem se traduzido em resultados concretos. Mas o desafio que se coloca daqui em diante vai além de ampliar investimentos: é preciso assegurar governança, transparência e eficiência na aplicação dos recursos, a fim de garantir a inclusão social e a melhoria real da qualidade de vida da população. Mais do que medalhas, trata-se de consolidar o esporte como política pública estratégica, capaz de educar, gerar empregos, movimentar a economia e projetar o Brasil no mundo.
Nesse sentido, a decisão do Congresso de tornar a Lei de Incentivo ao Esporte permanente não deve ser lida apenas como a aprovação de um texto legislativo. Trata-se de um compromisso histórico com o futuro do esporte brasileiro. A experiência orçamentária do país mostra que, embora o esporte desempenhe papel central no desenvolvimento social e humano, os investimentos públicos diretos ainda são limitados e, muitas vezes, dependentes de negociações políticas ou de fontes alternativas, como a renúncia fiscal. Agora, com a estabilidade da LIE e o engajamento crescente de empresas e contribuintes, a expectativa é de que o Brasil consiga ampliar a captação de recursos, democratizar o acesso à prática esportiva e consolidar, de forma duradoura, o esporte como vetor de transformação social e econômica.
Marcus Deois e Gabrielle de Castro no Lance!
Marcus Deois é publicitário, especialista em relações institucionais e governamentais, marketing e comunicação institucional. É sócio-diretor da ÉTICA Inteligência Política e atua no mercado político há mais de 15 anos.
Gabrielle de Castro é jornalista, com experiência em comunicação no setor de relações institucionais e governamentais. É assessora de comunicação na ÉTICA Inteligência Política.
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Os autores apresentam e defendem suas ideias e opiniões, esse texto não reflete necessariamente a opinião do Lance!.
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