Luiz Gomes: ‘Saída de Rafinha é uma vergonha para o Flamengo e o futebol brasileiro’

'É uma realidade triste e cruel com o futebol brasileiro, furto do amadorismo, da má gestão, da falta de visão histórica de que se alimenta a cartolagem tupiniquim'

Rafinha - Flamengo
Rafinha aceitou proposta do Olympiacos, da Grécia, e deixou o Flamengo (Foto: Marcelo Cortes/Flamengo)

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Em agosto de 2006, em pleno Campeonato Brasileiro, o Flamengo fechou a venda dos direitos do volante Jônatas ao Espanyol, de Barcelona. Se nunca chegou a ser um fora de série, o jogador teve papel importante, naquele ano, ajudando o time a conquistar a Copa do Brasil. Acabou sendo um nome lembrado por Dunga na sua primeira convocação como técnico da seleção brasileira para um amistoso contra a Noruega. As tentativas do então presidente Kléber Leite de manter o jogador foram em vão, e ele acabou se transferindo para a Espanha onde teve, aliás, carreira muita curta.

Na época, um amigo catalão, surpreendeu-se com o negócio. E não esqueci jamais do que ele disse. "Um clube como o Flamengo não pode perder um jogador para o Espanyol. Se fosse o Barcelona, o Real, ou até um Valencia, tudo bem. Mas para um clube do tamanho do Espanyol não faz sentido, é absurdo". Era um pensamento objetivo e cheio de razão. Porém, desprendido da realidade brasileira daqueles dias. E o que é pior, continua atual até hoje, quando a história se repete outra vez, com o mesmo Flamengo.


A saída de Rafinha para o Olympiacos, da Grécia, pegou de surpresa a diretoria rubro-negra e caiu como uma bomba no Ninho do Urubu. Repercutiu negativamente, ainda mais, em função do momento de instabilidade que o clube atravessa com a troca de treinador e o desastrado início de Brasileirão. Essa, era a pior hora para perder um jogador do nível do lateral direito e justo na posição – talvez a única – em que o elenco não oferece peças de reposição minimamente à altura.

O Olympiacos tirar Rafinha da Gávea é muito pior do que o Espanyol ter levado Jônatas. Primeiro porque o volante era, à época, um jogador ainda com muito tempo de futebol, pela frente, um investimento que poderia render ao clube de Barcelona um bom dinheiro em caso de revenda dentro da Europa – o que acabou não acontecendo. Já Rafinha, aos 35 anos, ainda que com todo o talento e o currículo que tem na bagagem, é um jogador em fim de carreira e muito certamente os dois anos dessa experiência grega serão os últimos antes de pendurar as chuteiras.

Em segundo lugar, porque o Flamengo de 2020, com uma situação financeira estável e com razoável capacidade de investimento, não lembra nem de longe o Flamengo de 2006, ainda embaralhado nas cifras de dívidas impagáveis, tão comuns ao futebol brasileiro.

Tudo bem que Rafinha tinha uma cláusula no contrato que se houvesse interesse de um clube europeu o Flamengo teria obrigação de liberá-lo sem custos. Tudo bem que o jogador passa por um momento pessoal complicado, com desavenças familiares e isso pode ter pesado. Mas o negócio traz um choque de realidade ao nosso futebol: o mais rico dos clubes brasileiros não tem condições de segurar um jogador, de oferecer algo que concorra com uma proposta feita por um clube da Grécia – um país que até dois anos atrás estava falido, que quase levou parte da comunidade europeia de arrastão para o buraco.

De novo, como disse lá atrás meu amigo catalão, não estamos falando de Alemanha, Espanha, Inglaterra, Itália, França, nem sequer de Portugal. Não estamos falando do Bayern, de Real ou Barça, dos Manchesters, do Chelsea ou do Liverpool, da Juventus, do PSG, nem tão pouco de Benfica e Porto. Estamos falando, com todo respeito, da Grécia e sua liga mediana e do Olympiacos.

O caso de Rafinha é só mais um entre tantos exemplos. Em toda janela de transferências, clubes médios e pequenos das principais ligas europeias, clubes do leste, como os da Ucrânia, vêm aqui à cata de jogadores, não apenas os consagrados, alguns ainda na base ou recém saídos de lá que se vão sem que sejam sequer apresentados ao torcedor. É uma realidade triste e cruel com o futebol brasileiro, furto do amadorismo, da má gestão, da falta de visão histórica de que se alimenta a cartolagem tupiniquim. Um abismo que só aumenta entre os dois lados do Oceano Atlântico.

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