‘Muito baixo’, Vardy quase deixou o futebol e agora pode virar filme

Artilheiro do Campeonato Inglês, com 14 gols, atacante abre o coração em entrevista exclusiva ao LANCE!. Nesta segunda-feira, ele vai para cima da defesa do Chelsea

Vardy marca contra o United e faz história na Premier League (Foto: Oli Scarff / AFP)
Vardy tem feito campeonato espetacular pelo Leicester City (Foto: Oli Scarff/AFP)

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O futebol cortou o coração de Jamie Vardy, 28 anos, algumas vezes. Quando adolescente, ele foi dispensado pelo clube da sua cidade, o Sheffield Wednesday. Em 2010, jogando pelo Stocksbridge Park Steels, da oitava divisão da Inglaterra, pensou em abandonar tudo. Entrou em curso técnico e começou a trabalhar em fábrica de solas de sapato feitas de fibra de carbono para pessoas com deficiências nos pés.

Cinco anos depois, ele é o artilheiro da primeira divisão do Campeonato Inglês, melhor jogador da competição e um dos primeiros nomes na lista de Roy Hodgson para a Eurocopa da França, no próximo ano. Nesta segunda-feira, às 18 horas (de Brasília), ele será o maior temor dos zagueiros do Chelsea. O Leicester City, grande surpresa da temporada europeia, volta à liderança se vencer.

- Cinco anos não faz tanto tempo assim, mas lembro que me questionava se valia a pena continuar. Ser dispensado pelo Wednesday foi a pior experiência da minha vida. Eles disseram que eu era muito baixo para ser profissional. Estava com 23 anos, em um time amador, recebendo 30 libras por semana (cerca de R$ 180) para jogar futebol - relembra o atacante, em entrevista por telefone ao LANCE! na semana passada.

A campanha do Leicester é temperada pelo improvável. Na liga de 2014/2015, com praticamente o mesmo elenco, a equipe esteve praticamente rebaixada. Escapou após conseguir cinco vitórias consecutivas na reta final. Agora, Vardy é o artilheiro (14 gols) e o terceiro colocado na tabela de goleadores é seu companheiro de ataque, o franco-argelino Riyad Mahrez (10), que até o ano passado estava no pequeno Le Havre, da França. Mais um que ouviu, a exemplo de Vardy, que não tinha jeito para o futebol. Mas por outro motivo: era muito magro.

- Eu não penso o que teria acontecido se tivesse desistido do futebol. Provavelmente seria uma pessoa frustrada, fazendo algo que não gosto e atuando por algum time amador aos domingos. Tudo muda muito rápido - observa Vardy, usando a si mesmo como exemplo.

Em 2013, o Leicester o tornou o jogador mais caro já contratado de um clube não profissional na história do futebol britânico. Pagou 1 milhão de libras (cerca de R$ 6 milhões) para tirá-lo do Fleetwood Town, da quinta divisão, e levá-lo para a elite. Um salto na carreira e de vida. Quando estava no Stocksbridge, jogava para 300 torcedores e, condenado por agressão em uma briga de bar, teve de passar seis meses usando tornozeleira eletrônica e em prisão domiciliar. Não podia sair de casa entre às 18h e as 6h da manhã.

- Eu tenho de ver pelo lado bom. Se as pessoas estão se lembrando disso hoje em dia é porque eu consegui chegar a algum lugar. Claro que não tenho orgulho disso, mas o que posso fazer agora? Foi um tempo difícil. Precisava pagar um táxi para voltar dos jogos e dos treinos e estar em casa às 18 horas. Se fosse uma partida fora de casa, eu tinha de ser substituído aos 15 minutos do segundo tempo e voltar correndo - relembra.

No Leicester, o futebol de Vardy deu um pulo porque ele passou a jogar ao seu estilo: jogo de contra-ataque e lançamentos para aproveitar a velocidade alucinante do centroavante. Ele fez gols em 11 partidas consecutivas do campeonato nesta temporada. Recorde na história da Premier League, a era moderna da liga inglesa, iniciada em 1992. Após 15 rodadas, a equipe foi derrotada apenas uma vez.

- Perdemos para o Arsenal. Eu me lembro que nos reunimos depois da rodada e dissemos que aquilo não ia mudar nosso estilo. Somos um time agressivo, que marca forte e tem sempre ritmo de velocidade. Continuamos assim porque o treinador acredita que podemos derrotar qualquer um - completa.

O "treinador" é Claudio Ranieri. Mais um desacreditado que está colocando seu nome entre os principais do continente pela campanha no Leicester. Um técnico que gosta de tomar vinho com o colega da outra equipe após os jogos, que faz questão de cumprimentar os jornalistas um por um antes de cada entrevista coletiva e que em 2004 foi escorraçado do Chelsea após levá-lo às semifinais da Liga dos Campeões da Europa.

Roman Abramovich, que havia comprado o clube londrino meses antes, tinha outro nome para assumir o cargo: José Mourinho, o mesmo que o enfrenta nesta segunda. O relacionamento entre os dois já foi péssimo. Melhorou após conversas por telefone.

- São 90 minutos em que todos dão tudo dentro de campo. Ficamos malucos para vencer. O treinador nos acalma porque ele tem experiência no futebol e um jeito bem tranquilo. Diferente de mim... Eu não sei até onde isso pode nos levar.

Título, Jamie?

- Melhor não falar sobre isso, por enquanto. Há muitas rodadas para acontecer. Se ficarmos pensando tão longe assim, vamos nos distrair e não olhar o próximo adversário.

A vida de Vardy virou de cabeça para baixo. Ele era um dos grandes cotados para receber indicação ao prêmio de "personalidade esportiva do ano", oferecido pela BBC (não aconteceu), a empresa Walkers lançou uma linha de batatas chips em homenagem ao atacante e produtores de Hollywood entraram em contato com seu empresário para fazer um filme sobre sua carreira.

- É um pouco demais, não é? Um filme sobre mim... Mas se quiserem fazer mesmo, eu vou assistir - prometeu.

Um improvável título para o Leicester ou da Eurocopa pela Inglaterra no ano que vem apenas deixaria o roteiro mais emocionante.

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