Luccas Claro relembra orgulho do pai e vê Roger e Marcão abrindo mais portas para treinadores negros na elite

Jogador exalta temporada pelo Fluminense, nega frustração por ficar fora da seleção do Brasileiro, projeta ansiedade na Libertadores e enaltece base tricolor

Luccas Claro - Fluminense
Luccas Claro comemora gol marcado pelo Fluminense no Campeonato Brasileiro (Foto: Lucas Merçon/Fluminense FC)

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Durante a última temporada, Luccas Claro viveu diferentes tipos de emoções. Se em campo ele foi o melhor jogador do Fluminense, fora das quatro linhas o zagueiro de 29 anos precisou lidar com a perda do pai. Pedro Barboza dos Santos Neto foi vítima de complicações da Covid-19 no início de fevereiro, três dias antes do jogo entre o Tricolor e o Atlético-MG, no Maracanã. Mesmo com a dor, o atleta se colocou à disposição do técnico Marcão, foi titular e eleito o melhor do confronto. Em entrevista ao LANCE! por videochamada, Luccas relembrou a relação com o pai e uma mensagem que o deu forças para seguir.

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- É difícil falar, porque é um sentimento que infelizmente muitas pessoas já passaram. Cada um sente de uma forma, não podemos julgar ninguém. Cada um tem seu momento, seu tempo. No primeiro momento, no desespero, pensei em não jogar, mas conversei com a minha esposa e minha mãe. Uma das coisas que meu pai mais gostava de fazer era me ver jogando. Ele ficava muito feliz em assistir, ver que eu estava realizando meu sonho e o dele também - afirmou Luccas.

- Meu pai sempre foi presente na minha vida, o tempo que eu morei em Curitiba ele sempre estava lá. Depois fomos juntos para a Turquia. Aqui no Rio de Janeiro um pouco menos por conta da pandemia, mas sempre muito presente. Assim que ele foi internado tivemos um jogo contra o Goiás e ele assistiu no quarto do hospital junto a um rapaz que estava internado também com Covid-19. Depois esse homem me mandou uma mensagem dizendo o quanto meu pai era orgulhoso, feliz, que ele falou o tempo todo, contou praticamente nossa história toda em poucos dias. Essa mensagem também me ajudou, deu conforto, paz e tranquilidade para eu entrar em campo. Com certeza ele estaria muito feliz por me ver atuando - completou.

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Com relação às quatro linhas, quarta opção quando chegou ao Fluminense, a temporada foi marcante para um incansável Luccas Claro. De acordo com o "SofaScore", ele foi o jogador mais seguro do Campeonato Brasileiro, líder em menos dribles sofridos, com quatro, não levou nenhum cartão amarelo e também não cometeu erros defensivos. Além disso, teve uma média de 0,71 faltas por jogo. Mesmo assim, o jogador não entrou na seleção da competição, que teve Gustavo Gómez (Palmeiras) e Victor Cuesta (Internacional) na zaga. O fato gerou críticas até do atacante Fred, que "cobrou" o companheiro na lista.

- Até agradeci ao Fred. É um cara muito inteligente, cabeça, que se posiciona muito bem. Tudo que ele fala é escutado pela torcida do Fluminense e por torcedores, também tem muita repercussão. Fiquei muito feliz com a minha temporada, mas é difícil falar em merecimento. Se eu falo que mereci estar na seleção do campeonato, algumas pessoas podem entender errado e achar que outro não merecia. Não é desta forma que eu penso. Até outros atletas fizeram uma grande competição - disse o defensor.

 - Mas o que vale é a minha consciência, eu estar tranquilo e ciente de que fiz um grande trabalho. Que conquistamos algo muito grande como equipe e consequentemente apresentei meu trabalho individualmente. Isso sim me deixa feliz e satisfeito, vou evoluir cada dia mais. Acredito que um dia eu posso estar na seleção do campeonato, mas sem colocar isso como meta. Minha temporada só foi boa porque me dediquei ao clube e ao grupo, pensando no dia a dia, jogo a jogo, sem vislumbrar algo na frente. Acredito que começar a pensar muito na frente você se perde no hoje. O diferencial foi ter os pés no chão e pensar pouco a pouco - concluiu. 

REPRESENTAÇÃO FORA DE CAMPO

Nesta temporada, Luccas Claro terá a oportunidade de trabalhar com dois dos três treinadores negros na Série A do Campeonato Brasileiro, Marcão, hoje auxiliar, e Roger Machado, contratado em fevereiro. Os dois já se uniram em ação contra o racismo quando eram os únicos técnicos negros da elite em 2019 e se enfrentaram no Maracanã, no jogo Fluminense x Bahia. Atualmente, além dos dois, há apenas Jair Ventura, no Sport.

- O Fluminense fazendo esse trabalho pode abrir portas para outros profissionais, mostrando nosso valor. Claro que primeiro vem a qualidade do Roger como treinador. O clube quando vai contratar procura saber muito sobre o extra-campo, como a pessoa é. Acredito que primeiro vem a pessoa, depois a qualidade como técnico. O treinador está no cargo por qualidade. Realmente é difícil alcançar o status de um técnico de Série A, mas com o trabalho do Roger com o Marcão temos a esperança que possa abrir as portas para mais profissionais que também tem qualidade e podem treinar grandes clubes, como o Fluminense - analisou o zagueiro.

Falando em Roger, Luccas se reapresentou junto ao restante do elenco principal - que estava de folga - na última quarta-feira. Depois de ter a primeira semana de trabalho, o grupo, enfim, fica à disposição do novo treinador. O defensor elogiou o método de trabalho do novo comandante, exaltou a vontade demonstrada e admitiu que as primeiras atividades foram intensas.

- É um trabalho curto ainda. Vamos aprender muitas coisas com ele, como gosta, principalmente no jogo, ainda não tivemos a chance de fazer uma partida com ele. Mas o Roger veio conversar com cada um de nós individualmente, perguntando onde gostava de jogar, se podia contar com cada um em posições diferentes. Foi uma conversa muito aberta e franca, é claro, para que ele sinta vontade de usar os atletas onde achar melhor para a equipe ou onde o jogador se sente confortável - avaliou.

- É um cara trabalhador, já mostrou isso, os treinamentos são até um pouco puxados (risos), o que é normal, principalmente nessa primeira parte. Precisamos disso porque depois a sequência não dá tempo. É uma filosofia diferente que vamos nos adaptar aos poucos e depois fica automático. O mais importante é entender o mais rápido possível o que ele quer para a equipe. É legal ver a disposição que eles (Roger e Odair) têm de evoluir, a vontade de querer treinar e jogar. Realmente transmite para nós - completou.

Luccas Claro e Marcão - Santos x Fluminense
Luccas Claro e Marcão se cumprimentam antes de jogo do Fluminense (Foto: Mailson Santana/FFC)

VEM, LIBERTADORES

A empolgação pelo novo trabalho se dá também pelos desafios que o Fluminense terá pela frente em 2021. O clube está de volta à Libertadores após oito anos sem disputar o torneio e terá vários estreantes, inclusive Luccas Claro. Do elenco atual, apenas Muriel, Danilo Barcelos, Egídio, Nenê, Ganso, Lucca, Fernando Pacheco, Hudson e Fred já jogaram a competição. Para o zagueiro, é natural que haja ansiedade, mas os jogadores vão aprender a lidar com isso até a estreia na fase de grupos, entre 20 e 22 de abril.

- Uma alegria muito grande. Será minha primeira Libertadores. Claro que bate uma ansiedade imaginar como vai ser. São jogos completamente diferentes, aguerridos. Cada adversário tem a sua característica. Temos que estar preparados para tudo, cada adversidade, as dificuldades. Um jogo com muita pressão, principalmente quando tem torcida. Não sabemos se terá, mas temos que ficar prontos. Claro que bate a ansiedade, mas tento controlar para não ficar pensando e isso acaba atrapalhando. Mas somos humanos, temos o sonho de jogar uma Libertadores. Momentos antes da partida pode até bater um nervosismo, mas vamos tentar controlar isso - disse.

Outro ponto importante do elenco são os vários garotos do Fluminense. A maioria deles disputou no último ano o primeiro Brasileirão no profissional e nesta temporada é provável que mais atletas formados em Xerém subam para a equipe principal. No Tricolor, porém, os jovens já aparecem com experiência. Luccas Claro exaltou a formação do Flu e falou sobre a relação com a empolgação natural por um torneio importante.

- Tem ansiedade sim nos meninos, mas eu sempre brinco e falo que os jovens do Fluminense já chegam no profissional prontos para jogar, preparados para a pressão. Não sei o motivo, talvez por terem quatro grandes clubes na capital e, por isso, já disputam clássicos no Sub-15, Sub-17, Sub-20, estão sempre na Seleção Brasileira. Acredito que isso pode ajudar muito nesse processo. Eles têm não só a qualidade, mas a personalidade de vestir a camisa de um grande clube e fazer grandes jogos. Claro que cada um é diferente, mas é incrível ver a qualidade que tem a base do Fluminense e quão preparados já chegam ao profissional - finalizou.

Luccas Claro ganhou o coração do torcedor tricolor. Mesmo quando recebeu proposta do Gençlerbirligi, da Turquia, por onde atuou antes de chegar ao Flu, decidiu renovar o contrato até o fim de 2022. Indo para seu terceiro ano no clube (chegou no fim de 2019), o zagueiro soma 44 jogos e seis gols marcados, todos na última temporada, a mais artilheira da carreira.

Luccas Claro
Luccas Claro comemora gol (Foto: Mailson Santana/Fluminense FC)

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No início da temporada você chegou a ser o último na fila dos zagueiros do elenco, mas a partir do início do Brasileirão se firmou e terminou como um dos destaques da temporada. Foi o melhor ano da carreira?

- Foi uma temporada muito importante e legal para mim, para o Fluminense também. Casou perfeitamente. É difícil um atleta se destacar quando a equipe não está bem, então a colocação do time, o campeonato sólido que fizemos me ajudou. Sempre trabalhei muito e me cobrei para evoluir. Tenho outras temporadas que trago com carinho que foram grandes anos no Coritiba e na Turquia, mas sem dúvidas, se tratando de números, foi a melhor da minha carreira.

L!: O que você pode dizer que aprendeu de principal com o Odair Hellmann e depois com o Marcão?

- O Marcão nós já conhecíamos. É um treinador da casa, já tinha feito um belo trabalho no final de 2019 na nossa briga para permanecer na Série A. O Odair é um cara que chegou com uma filosofia diferente, que trabalha muito a união do grupo, o conjunto. É um treinador parceiro, que você pode contar com ele. É aberto ao diálogo e tenta manter o grupo o mais unido possível. É um cara muito bom no quesito vestiário. No dia a dia é trabalhador, dedicado. Um treinador jovem que quer crescer, evoluir, chegar a lugares grandes. Isso é importante, ver a disposição que ele tem como técnico, passa isso aos atletas e conseguimos fazer o que nos pedia. O time aguerrido, que luta muito, que busca a vitória. Muitas vezes não dava na técnica, mas pela vontade que ele nos dava conquistamos os resultados em campo. O Marcão sem muito tempo para trabalhar manteve as coisas boas que o Odair deixou, colocando um pouco o jeito dele. Mas como já conhecíamos ficou mais fácil. Ele conhece muito bem o clube, tem identificação grande. Para nós já estávamos adaptados, então foi fácil dar sequência.

L!: Qual a importância dos mais velhos, ainda mais em um ano com Libertadores que muitos vão disputar pela primeira vez?

- É uma importância gigantesca. Isso ficou muito claro, essa mescla que temos dos mais experientes e da juventude ajudou muito a nossa equipe em momentos que precisava acelerar ou cadenciar mais, pensar. Nas dificuldades, ter jogadores como Nenê e Fred que sempre chamam a responsabilidade para pedir calma, tranquilidade, dizer que teremos a oportunidade, entrar na partida. Eles chamam o jogo, pedem a bola o tempo todo. O Nenê me cobra muito para dar a bola porque ele quer jogar, resolver, mostrar o futebol. Tem sido muito legal. Acredito que unidos podemos buscar grandes coisas nessa temporada.

L!: Você perdeu seu pai para a Covid-19 e o país vive o pior momento dessa pandemia. Você acredita que o futebol precisa parar? Como vê os protocolos adotados durante o Brasileiro? Foi eficiente? 

- Acredito que o protocolo tem sido bem feito, até porque testamos em todas as partidas. Se um atleta tem Covid-19 fica sabendo muito rápido e já se isola para se proteger e proteger outras pessoas. Mas é difícil falar em paralisação, porque teria que ter uma real comprovação de que isso poderia se propagar mais ou não. Obviamente que se é para evitar mais casos, como tem acontecido, claro que devemos parar. Mas acho que com muita cautela, sabedoria. As pessoas responsáveis por isso, as autoridades, fazerem com toda atenção possível para que o melhor seja feito colocando a vida de todos em primeiro lugar.

L!: O que a torcida pode esperar da temporada? Dá para sonhar com título da Libertadores?

- Os títulos são possíveis. Entramos nas competições para vencer. Tivemos um ano muito bom sem pensar muito na frente, mas jogo a jogo. Esse é o nosso segredo, precisamos manter isso em nós. Pensar dia após dia, com calma, fazer nosso trabalho, buscar a vitória na primeira partida, depois na segunda e assim em diante. É para buscar a classificação e, caso passar, começar a pensar nas outras fases.

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