‘Basta de descaso e de enxugar gelo. A sociedade exige e o futebol merece’

Mauricio Murad, sociólogo da Universo, e da Academia L!, autor do livro "Para Entender a Violência no Futebol", fala sobre os casos de brigas entre torcidas e descaso do estado

Palmeiras x Corinthians
Briga generalizada antes do clássico entre Palmeiras e Corinthians deixou uma pessoa morta 

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Em 2016 no Brasil já são 5 as mortes causadas por confrontos de torcedores organizados: 2 no Ceará, 1 no Rio de Janeiro, 1 no Rio Grande do Norte e 1 em São Paulo. Mais uma morte anunciada. Há uma guerra declarada entre a Mancha e a Gaviões e não é de hoje. As redes sociais contam tudo, inclusive anunciaram que ontem (domingo) seria um dia de “medir força”, em diversos pontos da cidade e mesmo fora dela. O jogo marcado pras 16h começou antes das 10 da manhã, quando delinquentes armados de paus, ferros, rojões, armas brancas e de fogo barbarizaram o domingo paulista.

Dezenas de feridos, gente hospitalizada (um em estado grave) e um cadáver absolutamente inocente, de um idoso ainda não identificado, que caminhava, parece, em direção a igreja, ritual que fazia todos os domingos de manhã, serenamente, segundo relatos de vizinhos. Inaceitável brutalidade! Até quando? As causas dessa violência têm que ser atacadas duramente pela ação repressiva das polícias, contra essas facções de vândalos infiltrados nas torcidas uniformizadas.

A repressão é fundamental, mas não é suficiente. É necessário um trabalho coordenado de prevenção, de inteligência, entre as diversas instituições da polícia e da justiça, para evitar o problema e “cortar o mal pela raiz”. Faz-se necessário também um trabalho de longo prazo, de reeducação, para mudar a cultura das organizadas de baixo pra cima: parcerias e campanhas de pacificação envolvendo os ídolos dos times, com os setores pacíficos, que são a grande maioria das 435 agremiações cadastradas na Anatorg, Associação Nacional das Torcidas Organizadas.

Destas, 15% foram reincidentes em atos de violência, em 2014 e 2015, o que mostra que há uma imensa massa de torcedores, com os quais se pode conversar, planejar e investir na cultura desses coletivos, a fim de isolar, controlar e punir severamente os transgressores. Culturas de alegorias, festas, cânticos, criatividade, espontaneidade e outras ações sociais feitas por eles, ao longo do ano. Auditoria nas contas das torcidas e responsabilização dos clubes também são iniciativas benvindas.

Os violentos e homicidas são perigosos e estão conectados com o chamado crime organizado e o tráfico de drogas, mas ainda assim são minorias, que não podem criminalizar as multidões de adeptos apaixonados pelo futebol.

Punição-prevenção-educação, eis a estratégia de um plano nacional, prioridade de governo e de Estado e obrigação constitucional, o qual tem que partir de Brasília para alcançar todo o país. Nos dois últimos anos, somente 3% de todos os crimes ocorridos no universo do futebol foram punidos até as últimas consequências. Esta lamentável impunidade, infelizmente, não é um caso isolado no Brasil, é mais regra do que exceção. Basta de descaso e de enxugar gelo. A nossa sociedade exige e o futebol merece.

* Mauricio Murad, sociólogo da Universo, autor do livro Para Entender a Violência no Futebol e membro da Academia LANCE!

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