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Década de 1970: rivalidade São Paulo e Palmeiras extrapola gramados e ganha toda a cidade

<b><a href="#">LANCE!</a></b> relembra a era onde o Choque-Rei mexeu com corações e ânimos das torcidas e elevou o clássico como o mais disputado (dentro e fora de campo) de São Paulo

São Paulo e Palmeiras se enfrentam pela 'final' de 1972: Telê e Parmalat iniciam seu duelo pessoal (Foto: Reprodução)
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Quando entrarem em campo no Morumbi às 21h40 (de Brasília) desta quarta-feira (30), Palmeiras e São Paulo iniciarão pela 17ª vez na história a disputa de um título do Campeonato Paulista. Entretanto, apesar dessa histórica rivalidade, algo que quase sempre extrapola as linhas do campo, será apenas a terceira vez que ambos jogarão uma final direta no estadual. 


O LANCE! irá destacar o ponto máximo dessas disputas. Já publicamos o retrospecto geral das decisões entre tricolores e alviverdes e o início da rivalidade.

E agora é a vez de irmos em dois tempos históricos onde a rivalidade se acentuou, deixando os gramados e contagiando torcida, imprensa e a própria cidade de São Paulo, elevando o Choque-Rei como o maior clássico da cidade.

O leitor perceberá que discussões sobre locais de jogos, datas e horários é usual quando se trata de Palmeiras e São Paulo, um assunto quase repetitivo a cada decisão entre os rivais. Vamos nessa...

A icônica capa de Placar de 1971 (Foto: Reprodução)

1971 E 1972: ARBITRAGEM POLÊMICA, DIRIGENTE NA BEIRA DO CAMPO E VERDÃO BRIGANDO PARA NÃO JOGAR NO MORUMBI

Palmeiras e São Paulo já haviam passado por muita coisa juntos desde os anos 1930, no primeiro capítulo da nossa série. O Verdão mudou o nome, pressionado por uma Segunda Guerra Mundial onde o Brasil se colocou como inimigo da Itália. Correu o risco de perder seu patrimônio, acusando justamente o Tricolor de arquitetar a manobra, em fatos que variam conforme o historiador (e seu time de coração) consultado.

O fato é que Palmeiras e São Paulo se tornaram de fato inimigos, mas nunca haviam disputado de fato um título. Para piorar, o Tricolor começou em 1957 a desviar suas atenções para a construção de seu estádio. E o Santos teve a esperada ascensão com Pelé comandando aquele que talvez seja o maior time de futebol que já atuou no Brasil. Com isso, por todos os anos 1960, foi o Peixe o alvo a ser buscado pelo Verdão e sua primeira Academia.

O cenário começou a mudar em 1970. Com o Morumbi pronto, o São Paulo era personificado na figura de Laudo Natel. Patrono eterno do clube. o ex-diretor do Bradesco havia sido empossado governador do Estado pela Ditadura Militar que assumiu o poder do país em 1964 e, como uma figura emblemática do poder, desviava sua influência para o Tricolor.

Era preciso honrar a novíssima casa com os títulos, afinal já eram 13 anos sem eles. E para isso, com a força de Natel, o Mais Querido formou um de seus mais memoráveis times. Trouxe do Rio de Janeiro (RJ) o meia Gérson, cérebro da Seleção Brasileira tricampeã mundial no México. De Santos chegou um tricampeão paulista e artilheiro nato, Toninho Guerreiro.  Para completar o elenco, dois uruguaios que também estavam no Mundial mexicano: Pablo Forlán e Pedro Rocha, contratados do Peñarol.

O título são-paulino veio em 9 de setembro, após uma vitória sobre o Guarani por 2 a 1, em Campinas (SP), em um certame onde o Palmeiras, mais preocupado com a entresafra de academias, lutou mais para assegurar o vice sobre a Ponte Preta, a grande surpresa daquela temporada.

Natel (à esquerda de Gérson): nova era tricolor (Foto: Reprodução)


Com a manutenção de seu time-base, o Tricolor parecia o franco favorito para 1971. Mas pelos lados do Parque Antártica, quem chegou à presidência foi Paschoal Giuliano. Italiano bonachão, era uma figura sedutora aos palmeirenses mais pelas frases de efeito que vez ou outra soltava na imprensa. Muitas deles com o São Paulo como alvo. Verdade ou não, é cunhado a Giuliano a frase 'Corinthians é rival, São Paulo é inimigo', além de atitudes como a de proibir a entrada de dirigentes rivais nas festas na sede alviverde.

Para o elenco, Giuliano deu o início à segunda Academia. Uma das ordens era dar chances às jovens promessas que povoavam o elenco alviverde e ainda não haviam se estabelecido como titulares, como o goleiro Leão, os laterais Eurico e Zeca, o zagueiro Luís Pereira, o ponta de lança Leivinha, os pontas Edu e Nei e o centroavante César.

Deu certo. Palmeiras e São Paulo disputaram o título paulista ponto a ponto e, por uma conveniência da tabela (coisa comum naqueles tempos) se enfrentariam na última rodada. O dia 27 de junho entraria para a história.

O mando era do Palmeiras, mas por conta das rendas, topou levar o duelo para o Morumbi. Armando Marques, maior nome do apito na época, foi escalado sem objeções das equipes. E o Verdão percebeu a arapuca que caíra dias antes do duelo em si. A começar pela venda de ingressos. Segundo 'O Estado de S. Paulo', apenas 20 mil bilhetes foram enviados para serem vendidos na sede palmeirense da Rua Turiaçu. A prefeitura também recusou a proposta dos verdes de colocar ônibus saindo para o estádio tricolor da Pompeia e o clima azedou de vez quando o clube descobriu que, mesmo supostamente sendo o 'dono' da casa na ocasião, ficaria nos vestiários destinados aos reservas.

No dia da partida, Giuliano protestou contra o banquinho colocado ao lado do quarto árbitro, onde se sentaria Laudo Natel para ver o jogo. Mas novamente, nada fez. Começado o jogo, o Palmeiras levou o gol de Toninho Guerreiro logo aos cinco minutos de jogo. E foi o prenúncio do que se desenharia. Na etapa final, Leivinha desviou um cruzamento para a área, mas Armando Marques anulou alegando toque de mão. Só ele. Dulcídio Wanderley Boschilla, bandeira no jogo, correu para o meio. A atitude desequilibrou de vez o Verdão. No final do confronto, torcedores tricolores já invadiam o campo. Um deles chutou para longe uma bola que ia ser usada pelos palmeirenses para cobrança de lateral. Foi o suficiente para ser perseguido e agredido por César, que cunhava ali o apelido de 'Maluco', dando o estopim para uma briga generalizada que terminou três alviverdes expulsos.  

Segundo a revista 'Placar', o incidente gerou um dos diálogos mais insólitos à beira do gramado já ocorridos no Morumbi. Diante da pancadaria entre torcedores e jogadores, Laudo Natel pediu a Giuliano que controlasse César ou 'chamaria sua polícia'. O palmeirense foi direto: 'façam algo com meu jogador e lhe quebro os dentes'. O benemérito tricolor, assustado, reagiu pedindo respeito 'às autoridades'. 'Autoridade só é quem de fato eu votei para me representar, não é o caso do senhor', disse-lhe o cartola alviverde, iniciando um dos pontos mais críticos do ódio entre as duas agremiações. 


Ainda nos vestiários, o clima era terrível. Palmeirenses caçavam Marques para agredi-lo. São-paulinos jogavam copos com urina no ônibus dos rivais. Gérson, à 'Folha de S. Paulo', dizia que no 'Rio esse tipo de coisa não acontece'. Ademir da Guia, quase sempre sereno, cuspia abelhas. Leivinha proferia 'palavrões impublicáveis', segundo o 'Estadão'. E o árbitro se virava para tentar explicar o que só ele vira de fato.


Por mais de seis meses o assunto na cidade foi o gol de Leivinha. Até mesmo corintianos e santistas demonstravam simpatia pelo Palmeiras e diziam que a partida, transmitida ao vivo pela televisão, algo raro naqueles tempos, fora estranha. Marques então incontestável, sofrera o primeiro baque da carreira e passara a ter seu nome vetado pelo Verdão para seus duelos.

Seja como for, foi a primeira conquista do Tricolor em sua nova casa, justamente contra o 'inimigo' dos velhos tempos e de forma polêmica, o que arrancava sorrisos sarcásticos de seus dirigentes, que foram à imprensa nos dias seguintes ao jogo valorizar a ausência de registros de violência e a ótima renda obtida com o jogo (Cr$ 913 196, recorde de então do futebol paulista, para 115 435 presentes).

'Folha' destaca a polêmica conquista tricolor (Reprodução)

Para 1972, Giuliano resolver trazer para técnico do Verdão Osvaldo Brandão. O gaúcho, radicado em São Paulo haviam décadas, era justamente o comandante do Tricolor no ano anterior. E o Palmeiras deu início à sua segunda Academia , com uma escalação que até as crianças alviverdes sabiam de cor naqueles tempos, no último grande período de glórias do clube antes da Parmalat.

O problema é que o Tricolor mantivera a base do ano anterior. Gérson já deixara o Morumbi para cumprir a promessa de encerrar a carreira no Fluminense, seu time do coração, mas com uma base daquelas, não haveria de ter problemas.

Se 1971 fora disputado, em 1972 o campeonato foi ainda mais acirrado. Os dois chegaram literalmente invictos na última rodada, mas com uma vitória a mais, o Verdão teria a vantagem do empate. Data do duelo: 3 de setembro.

Com o vivido no ano anterior vivo na memória, começou então um dos períodos mais turbulentos da história entre Palmeiras e São Paulo. Tudo remetia a efemérides. 30 anos da Arrancada Heroica de 1942, quando o clube deixou de usar Palestra Itália - de novo, por suposta pressão tricolor - e conquistou o título. 150 anos da Independência do Brasil, data icônica para o regime vigente no país naqueles tempos.

A semana que antecedeu o jogo foi um prato cheio de polêmicas para nós, jornalistas. O São Paulo queria um árbitro estrangeiro apitando o jogo decisivo. O Palmeiras não. A Federação Paulista de Futebol então determinou um sorteio. Mais reclamações tricolores. Mais ponderações palmeirenses.

O Verdão campeão de 72: a segunda Academia (Reprodução)


De um lado, Giuliano cravava que não jogaria no Morumbi, espalhava que nunca mais o Alviverde daria rendas ao rival (você já viu esse filme antes) e prometia bichos gigantescos - 'até cinco vezes maior que o do São Paulo' - em caso de vitória. César, pivô da muvuca registrada no ano anterior, prometia comprar um carro conversível com a grana e provocava os rivais dizendo que sequer faria gols. 'Vai ser 0 a 0, para eles sofrerem ainda mais', afirmou à 'Folha'.

Do outro lado, Manuel Poço, diretor de futebol tricolor, tentava responder a bravata alviverde. De um jeito estranho. Durante a semana, proibiu os jogadores de conversar com jornalistas. Justificava que o erro de Marques um ano antes compensava um erro de 1950, quando um gol mal anulado de Teixeirinha atrapalhou o São Paulo no Choque-Rei que acabou dando o título ao Verdão - título que tarimbou o clube como o representante paulista da Taça Rio de 1951. 

Mas a polêmica maior ficou por conta do local do jogo. Giuliano bateu o pé, não jogaria no Morumbi. Dizia que além do São Paulo treinar no local, nunca ele seria considerado campo neutro. Naquele ano, no duelo do primeiro turno (empate em 0 a 0), novamente os jogadores reclamaram dos gandulas e os dirigentes da presença de Laudo Natel e seu banquinho no gramado. A solução do dirigente foi exigir o Parque Antártica. E aí Poço deu uma frase que entraria para a história.

- Nunca um Choque-Rei será disputado em um estádio pequeno como o Parque Antártica. Não tem condições. Seria o mesmo que mandar a Seleção Brasileira jogar na Rua javari - disse o cartola.

O assunto imperou na crônica esportiva e nas ruas. São-paulinos lamentavam a queda bruta de renda em outro estádio senão o Morumbi. Palmeirenses batiam o pé. E a FPF decidiu o Pacaembu. 'Estadão', 'Placar' e 'Folha' protestaram, expondo os 'riscos' do jogo não acontecer na casa são-paulina, citando entre eles a falta de ingressos para todos os interessados em ver o jogo, que desta vez não teria TV ao vivo. Conselheiros alviverdes então trataram de pagar do próprio bolso um estranho anúncio nos jornais da cidade justificando a escolha do palco, onde exaltavam no título 'que deviam explicações somente aos palmeirenses' e que o objetivo 'é ganhar títulos, não ter lucros (sic)'. 'O dinheiro passa, os troféus ficam', escreviam os beneméritos.

Mais choradeira para o São Paulo, que lamentava o fato da Federação não intervir, como previa o regulamento. 'A FPF tinha dito no início do campeonato que poderia intervir no mando se algum jogo fosse decisivo no campeonato. Não fizeram nada disso agora', dizia o cartola Poço, que como sobrevida da polêmica protestou quanto à data (era dia do primeiro GP do Brasil de Fórmula 1 em Interlagos, por exemplo) e do horário. Natel chegou a acionar os militares. Tudo em vão.

Giuliano bateu o pé e ainda anunciou um aumento no preço dos ingressos, que foi de CR$ 6 para CR$ 7 a arquibancada. O suficiente para afastar são-paulinos do Pacaembu e tornar a festa ainda mais alviverde após o 0 a 0 no placar que deu o título ao Verdão, o segundo dos cinco que disputou - e faturou - na maior de suas temporadas na história.


O ponto final ainda estava longe de acontecer nas polêmicas. São Paulo e Palmeiras voltaram a se enfrentar na final do Campeonato Brasileiro do ano seguinte. E, desta vez jogando no Morumbi sem direito a reclamar, o Verdão superou o rival. Lembram da frase do dirigente são-paulino? Pois bem, em 1974 os rivais se encontraram na Libertadores. E adivinhem onde foi um dos jogos? Pois é, falta agora termos a Seleção na Rua Javari, mostrando que quando se trata dos rivais, as brigas sobre onde sediar jogo e afins sempre existiram e sempre vão existir. 

Voltaremos em breve, com mais capítulos dessa rivalidade. Não percam.


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