Recorde? O que vale nos Jogos Olímpicos são as medalhas

Mesmo no ápice de suas formas, poucos atletas quebram um recorde mundial na Olimpíada. Dirigentes e técnicos analisam e garantem: ‘Querem ser campeões. O recorde pouco importa’

Michael Phelps (foto:AFP)
Michael Phelps tem um recorde mundial obtido em Londres-2012 (foto:AFP)

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Conquistar uma medalha olímpica é uma coisa para poucos atletas. Imagine, então, subir no pódio e ainda bater um recorde mundial de sua modalidade. Pode até parecer estranho, já que os Jogos Olímpicos são considerados o ápice da carreira de todos os atletas, e eles chegam para competir em sua melhor forma. Mas as principais marcas da natação e do atletismo quase nunca são atingidas durante uma Olimpíada.

Enquanto o atletismo conta com 47 provas no calendário olímpico, a natação tem 32 disputas. Provas e brigas por medalhas não faltam. O problema mesmo é a ausência de recordes mundiais nas 79 competições, já que somente 14, das atuais marcas, foram quebradas durante os Jogos.

Apesar de as duas modalidades serem diferentes na forma de preparação e de competição, a opinião dos treinadores sobre o assunto é praticamente a mesma. Entrar em uma piscina ou pista (e campo) de atletismo durante os Jogos Olímpicos é muito diferente do que em um Campeonato Mundial ou qualquer outro torneio. Não pela forma física dos atletas, que está mesmo perto de seu ápice, mas pela maneira como as disputas são encaradas.

– A Olimpíada é uma competição estratégica. Antes de pensar em recorde, o atleta pensa em medalha. Por isso, temos visto poucos recordes. Como a briga pelo lugar no pódio é tática, o atleta não usa o máximo de sua plenitude. O pico de um atleta não dura mais do que 20 dias. Mesmo quem chega no ápice de sua performance, pensa primeiro em ganhar a medalha. Ele não entra para bater recorde do mundo, porque isso pode tirá-lo da briga – afirmou o superintendente de Alto Rendimento da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAt), Antonio Carlos Gomes, ao site do LANCE!.

Outro fator apontado pelos especialistas envolve o aspecto psicológico. Se classificar (ou ser convocado) para uma Olimpíada já é algo complicado. Imagine, então, perder a chance de subir no pódio por estar focado na quebra de um recorde.

– Nos Jogos Olímpicos, os atletas querem ser o melhor lá, querem ser campeões olímpicos. O recorde mundial é o que menos importa. E a pressão psicológica é grande, maior do que em um Mundial, um Pan-Americano, ou qualquer outra competição. É um evento que acontece a cada quatro anos, com visibilidade grande – disse o coordenador da natação feminina da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), Fernando Vanzella.

Na natação são seis recordes mundiais obtidos em uma Olimpíada. No atletismo, oito. O nadador americano Michael Phelps é dono de uma dessas marcas. Já Usain Bolt só obteve uma com o revezamento jamaicano. O que mostra como é difícil faturar uma medalha olímpica e bater um recorde ao mesmo tempo.

NA NATAÇÃO:

A jovem nadadora americana Missy Franklin já tem quatro ouros olímpicos
Missy Franklin tem o recorde mundial nos 200m costas de Londres-2012 (Foto: AFP PHOTO / VALERIE MACON)

No total, são 32 provas olímpicas e seis recordes mundiais

- 400m medley - Michael Phelps (EUA) - 4m03s84 - Pequim-2008
- Revezamento 4x100m livre (masc) - Estados Unidos - 3m08s24 - Pequim-2008
- 1.500m livre - Sun Yang (CHN) - 14m31s02 - Londres-2012
- 200m costas - Missy Franklin (EUA) - 2m04s06 - Londres-2012
- 400m medley - Shiwen Ye (CHN) - 4m28s43 - Londres-2012
- Revezamento 4x100m medley (fem) - Estados Unidos - 3m52s05 - Londres- 2012

Veja a opinião de Fernando Vanzella, coordenador da natação feminina da Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA)

"Os resultados têm sido mais complicados de serem batidos. Em Pequim-2008, ainda vivíamos a era dos trajes. Na época, se pegasse um atleta fora do comum e ainda usando os trajes tecnológicos... O próprio (Cesar) Cielo é um bom exemplo disso.

Se não bastasse, os atletas querem mais ser campeões olímpicos do que se tornar o recordista mundial. A pressão psicológica também interfere muito, é uma competição disputada a cada quatro anos. Já o recorde, o atleta faria a qualquer momento.

Além disso, grandes times, como os Estados Unidos, fazem a seletiva muito próxima aos Jogos. Será que o atleta mantém a competitividade por tanto tempo? É difícil responder.

É uma situação individual, mas tem muito disso: as seletivas, a pressão de ser campão olímpico... Ninguém vai lamentar se vai bater o recorde ou não. Mas o peso de ser campeão é maior. "

ATLETISMO:

Olimpíadas 2012 - Londres - Bolt na prova dos 100m
Usain Bolt tem o recorde mundial com a equipe jamaicana no revezamento 4x100m em Londres-2012 (Foto: DYLAN MARTINEZ)

No total, são 47 provas olímpicas e oito recordes mundiais

- 400m com barreiras - Kevin Young (EUA) - 46s78 - Barcelona-1992
- 800m - David Lekuta Rudisha (KEN) - 1m40s91 - Londres-2012
- RevEzamento 4x100m (masc) - Jamaica - 36s84 - Londres-2012
- 200m rasos - Florence Griffith-Joyner (JAM) - 21s34 - Seul-1988
- Heptatlo - Jackie Joyner-Kersee (EUA) - 7.291 pontos - Seul-1988
- Revezamento 4x400m (fem) - União Soviérica - 3m15s17 - Seul-1988
- 3.000m com obstáculos - Gulnara Galkina (RUS) - 8m58s81 - Pequim-2008
- Revezamento 4x100m (fem) - Estados Unidos - 40s82 - Londres-2012

Veja a opinião de Adauto Domingues, técnico da Seleção Brasileira para os Jogos Olímpicos, especialista em provas de fundo e meio-fundo

"Durante os Jogos Olímpicos, existem provas que você precisa dar até quatro tiros das eliminatórias até a final. Em um meeting, é um tiro só. Além disso, em muitos casos, nas provas mais longas, você tem um “coelho” para ditar o ritmo. O que é diferente de uma Olimpíada.

O primeiro objetivo é vencer. E nesse caso, a prova se torna mais tática, e não rápida.

Imagine que você seja uma maratonista e vai tentar correr a prova em Berlim (ALE). Mas três dias antes, você tem algum problema. Mesmo assim, você larga para tentar bater o recorde mundial, mas chega no meio e vê que não está bem. Nesse caso, você pode abortar e, um mês depois, tentar melhorar a marca em outra corrida do mundo.

Na Olimpíada, não tem esse um mês depois. É uma grande pressão psicológica do próprio atleta. Se não estiver bem naquele dia, só daqui quatro anos. "

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