Prass fala dos desafios e da carreira: ‘O mais difícil no futebol é gerir pessoas e egos’
- Matéria
- Mais Notícias
Jogador mais experiente do elenco do Palmeiras, Fernando Prass conquistou rapidamente um posto entre os líderes do grupo aos 35 anos – os cabelos grisalhos já lhe rendem o apelido de “coroa” na Academia.
Contratado para esta temporada, o goleiro credita esta instantânea ascensão na hierarquia palmeirense à sua vivência no futebol, sobretudo à capacidade que avalia ter para ler o vestiário em bons e maus momentos.
Prass esteve na redação do Diário LANCE!, falou de Verdão e de outros temas relevantes dentro do esporte. Nesta sexta-feira, ele é dúvida diante do Bragantino, às 19h30, no Pacaembu, depois de torcer o tornozelo direito durante o treinamento de quinta. Fará teste no vestiário. Se não atuar, Bruno jogará.
BATE-BOLA - FERNANDO PRASS
LANCE!Net: Você foi agredido naquela briga com a Mancha em março. Voltou a falar com eles?
Não tive contato nenhum, dificilmente nós temos contato com a torcida. Sou jovem ainda, mas tenho bastante experiência de vida. Em todo lugar existem as pessoas boas e más. Não é só no futebol, na política e na vida também. Sempre me afastei de algo que eu não compartilho. Com o tempo e convivência, as máscaras um dia caem. Foi no futebol, mas é cotidiano.
L!Net: Você assiste a futebol na folga?
Eu assisto mais ao que está relacionado diretamente a mim. Vejo os adversários que vamos enfrentar. Gosto de futebol, mas a nossa vida é tão corrida que às vezes a gente joga na terça e tem futebol quarta à noite. Aí saio para ir ao cinema com os meus filhos (Caio e Helena, casal de gêmeos, de cinco anos), para jogar bola. Meu filho agora está numa fase que está doido por futebol.
L!Net: Ele também é goleiro?
Não. Ele começou como goleiro porque viu o pai de luva e, como sempre somos exemplos para os filhos, no começo ele queria camisa de goleiro, luva e queria jogar no gol. Só que agora ele vai ser jogador de futebol, não vai ser mais goleiro. Ele acha que goleiro não é jogador.
L!Net: Você incentivaria seu filho a seguir carreira no futebol?
Claro, se ele quiser ser. Ele que vai decidir, não sou eu quem decido. O que vou passar para ele é que as coisas não são como vemos na televisão. O que vemos na televisão é uma minoria. O que a TV vende é Neymar, Ronaldinho Gaúcho, e isso não chega nem a 1% do que é o futebol. A realidade é totalmente diferente. Passei pelas duas realidades: estava no Grêmio havia dez anos e fui emprestado para a Francana, em São Paulo. Coloquei na minha cabeça que ou eu saía da Francana para uma coisa melhor ou eu pararia.
L!Net: Chegou perto de parar?
Não. Eu fui emprestado para a Francana em 2000, por cinco meses, mas tinha contrato com o Grêmio por mais dois anos.
L!Net: O que você fazia antes de se dedicar totalmente ao futebol?
Esse era o problema, eu não fazia nada (risos). Eu estudava. Fiz quatro semestres do curso de educação física, mas na minha cabeça eu não tinha outra perspectiva que não fosse o futebol. Eu fui para o Grêmio com 11 anos. Até os 21 eu fiquei no Grêmio. Então fiquei dez anos no Grêmio, naquele espaço de tempo em que um jovem digamos normal estaria fazendo seus testes vocacionais para encaminhar a carreira.
Fernando Prass na redação do Diário LANCE! (Foto: Eduardo Viana)
L!Net: Que diferença vê entre o Palmeiras ao que você chegou e o atual?
Em termos de grupo era muito fragilizado. Tínhamos pouquíssimos jogadores. Na Libertadores jogamos contra o Tigre (ARG) sem 12 ou 13 jogadores. Isso também por um motivo que é ruim para o clube, com eleição com o calendário em andamento. Isso dificultou e muito o trabalho. É difícil sair dois meses atrás num mercado como está o brasileiro hoje, muito acirrado. Mas com bastante calma, tranquilidade e confiança foi se fazendo um trabalho muito bom.
L!Net: Você admite que questão política, seja no Palmeiras ou outro clube, atrapalha a parte desportiva?
Cada clube tem a sua particularidade. Algumas vezes atrapalha dentro de campo porque indiretamente chega ao jogador. Pode ser uma oposição que queira atacar a situação e tenta isso por outros caminhos, como desestabilizar o time dentro de campo por meio de um ou de outro jogador. O ideal seria que tivesse tranquilidade, mas sou a favor que em todo lugar, não só no futebol, haja uma oposição. Aí dá para se discutir ideias e se debater. No lugar que não tem oposição é uma coisa estranha, sinal que as coisas não andam bem.
L!Net: Como conquistou espaço de líder do Palmeiras em tão pouco tempo?
Um pouco é pela vivência no futebol. Já participei de situações no Grêmio quando eu estava subindo para o profissional, com 19 anos, em que houve uma reunião dos jogadores para se tomar uma posição, foi tomada uma posição forte e não se esperava uma contrapartida do presidente (José Alberto Guerreiro) da maneira como foi. Foi uma situação mal gerida que até hoje eu levo para mim como exemplo. São muitos anos participando de vestiário, e isso me dá a noção de saber o que vai acontecer no vestiário em determinadas situações.
L!Net: E como foi esse episódio que você vivenciou no Grêmio?
Na época, eu estava subindo para o profissional, havia algumas pendências com o grupo, e nós tomamos uma posição forte sem antes esperar uma posição do presidente. E o presidente estava com a situação encaminhada para ser resolvida. Só que, pela atitude dos jogadores, ele foi para o enfrentamento, teve o atrito e gerou um desgaste desnecessário.
L!Net: Qual foi a decisão dos atletas?
Na época nós estávamos na pré-temporada, e o grupo iria voltar da pré-temporada para Porto Alegre (RS) como forma de reivindicação
L!Net: Como é o ambiente no vestiário do Palmeiras atualmente?
O ambiente é bom. É um grupo com muitos jogadores novos, com uma base do ano passado, uns dez jogadores, e muito jogador novo. Tem uma liga muito boa. Pode ser fácil falar porque agora está ganhando, mas nunca tivemos muito problema interno com esse grupo. E espero que nós não tenhamos, porque a convivência com 30, 40 pessoas não é muito fácil. Tem dias que você vai estar de bom humor, tem dias que vai ter mau humor.
L!Net: Qual lição você carrega da goleada para o Mirassol (6 a 2)?
Poderia ter sido menosprezo, uma semana mal trabalhada, uma viagem mal organizada, autoconfiança demais, mas eu particularmente não senti isso. Falamos que o jogo não poderia nos enganar nem o Mirassol. O Mirassol perdeu o jogo seguinte em casa e depois acabou no rebaixamento. E, daquela situação catastrófica, nós nos fortalecemos e estamos numa situação muito melhor.
L!Net: Qual é a participação do Gilson Kleina na boa fase do Palmeiras?
O Gilson pegou um trabalho muito difícil, porque ele estava no grupo que foi rebaixado. Então isso traz um peso extra. Se fosse outro treinador, estaria com a conta zerada. Então o Kleina encarou uma pressão muito forte, num começo com grupo muito reduzido, tendo que improvisar jogadores. Passou pelos problemas e agora tem outro que é o grupo com muitas opções, que por um lado é bom e por outro é ruim. É difícil de se gerir um grupo grande, porque é complicado para o jogador trabalhar forte a semana inteira e saber que não vai para o jogo. E o Gilson está conseguindo gerir isso. Não penso em ser treinador, mas a parte mais difícil no futebol é a de gerir grupo, pessoas, egos. No futebol se trabalha muito com isso, tem visibilidade, status e querendo ou não, entra no grupo.
L!Net: Você também sofre com atraso de salário no Palmeiras?
O Nobre vem pagando a carteira religiosamente em dia, o direito de imagem ele vem pagando desde que ele assumiu. O que há é uma pendência de dois meses, que era a pendência que tinha quando ele assumiu. Então todo dia que vence a carteira e a imagem, ele está cumprindo à risca. Também está cumprindo à risca as premiações. E ele já passou também para a gente que ele tem um planejamento financeiro e, dentro de pouco tempo, vai estabilizar tudo.
L!Net: Essa clareza com que ele expôs isso também é importante?
Isso é essencial. O jogador entende que o clube passa por um momento de dificuldade. Até mesmo mesmo na vida pessoal você não tem dinheiro para pagar uma conta e você tem de dar um jeito. Mas tem de ter clareza, olhar no olho para falar, porque aí você consegue lidar muito melhor com essas situações financeiras, que são delicadas. Pelo menos com ele, desde que ele chegou, ele, Brunoro e Omar têm sido bem claros com a gente. Nós também temos um canal aberto para falar. Não podemos nos melindrar por cobrança, fazer uma cobrança e ficar de cara feia. Está todo mundo querendo a mesma coisa.
L!Net: Por qual outro assunto você se interessa além do futebol?
Eu leio muito jornal. Uma das coisas que mais me incomodam no futebol e me angustiam é a concentração. Então nós chegamos à tarde na concentração, eu durmo para descansar. Acordo, desço para a recepção para tomar meu cafezinho, leio o jornal. Aí no outro dia pela manhã acordo um pouco mais cedo, tomo café, leio o jornal até para passar o tempo. Leio tudo, de cabo a rabo. Sou curioso.
L!Net: Já decidiu o que vai fazer quando se aposentar?
Dentro da normalidade eu consigo jogar mais uns bons anos. Ainda não sei o que vou fazer. O cara fica 20 anos no futebol... Pode ser que eu faça alguma coisa ligada indiretamente ao futebol.
- Matéria
- Mais Notícias