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‘Estou muito satisfeito. Levantamos o handebol’, diz Morten Soubak

Dia 01/03/2016
00:52

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Um dinamarquês com a fala mansa, bom de papo, convicto de suas ideias e que levou o handebol feminino do Brasil a um outro patamar. Esse é Morten Soubak, de 50 anos, atual comandante da Seleção Brasileira feminina.

No Brasil desde 2005 e no comando do time feminino desde 2009, o treinador fala fluentemente o português Ainda carrega um pouco do sotaque, mas nada que atrapalhe. Afinal, é casado com uma brasileira e já tem um filho.

Após o inédito título mundial em 2013, na Sérvia, e a queda nas quartas de final na Olimpíada de Londres-2012 diante da forte Noruega, Morten quer mais. Primeiro, faturar o pentacampeonato Pan-Americano. Depois, outro Mundial. E para terminar: faturar os Jogos Olímpicos no Rio.

Em conversa com o LANCE!Net, o técnico falou sobre esses e outros assuntos, como o desenvolvimento da modalidade no país, a demora para a entrega do Centro de Treinamento em São Bernardo (SP) e seu contrato. Confira abaixo:

LANCE!Net: Um segundo título mundial da Seleção Brasileira incomodaria no cenário mundial?
Morten Soubak: Acho que esse Mundial vai ser extremamente difícil. Aumentou o número de boas equipes europeias, vai ser mais complicado, com certeza. Mas penso também que olhando um pouco na história de mundias de handebol, é dificil achar uma equipe fora da Europa com medalha. Se conseguirmos uma, vai ser sensacional e histórico. Nunca uma equipe conseguiu isso.

L!Net: O que mudou desde o título mundial na Sérvia, em 2013?
MS: Já de 2011 para cá, mudou muito. Se pegarmos o Campeonato Europeu do ano passado, temos Noruega, Espanha, Suécia e Montenegro. Aí, no Mundial na Sévia, tivemos Brasil, Sérvia, Dinamarca e Polônia. Nenhuma equipe foi repetida, lógico que nós não poderíamos. Então, é muito claro que é o dia que define quem vai ganhar ou não. Não temos equipes no feminino que são mais avançada do que as outras. Quem é mais estável de todas é a Noruega. As coisas estão muito similares. É difícil falar quem está no topo hoje em dia.

Morten Soubak comanda a Seleção Brasileira feminina de handebol desde 2009 (Foto: Divulgação)

L!Net: O Brasil joga mundial como atual campeão. Como trabalhar isso com as jogadoras?
MS: Não tenho dúvida que nossos adversários querem derrubar o campeão do mundo. Aconteceu que somos nós. Tivemos um tempo para pensarmos sobre isso, lidar com isso. Talvez, também, para a ficha cair. Espero que já tenha caído. Estamos sendo vistos de uma forma diferente, não tenho dúvida. O respeito aumentou um pouco. Não é só jogar contra o Brasil, é jogar contra o campeão do mundo. Todo mundo quer mostrar que foi um erro, que uma equipe da América não tem nada a ver lá, que quem manda são os europeus. Já sentimos isso, temos de lidar com essa sensação. Penso que isso vai ser retomado durante o Mundial e temos de saber que vai ser uma motivação para várias equipes que vão jogar contra a gente. Temos de entrar com a cabeça parecida como jogammos na Sérvia, em 2013, ou no Brasil, em 2011: pensando em cada jogo que vamos fazer, no nosso plano de jogo. Não podemos pensar no que foi feito.

L!Net: Como mostrar para as pessoas que se o Brasil não for campeão mundial novamente, isso não é algo fora do normal?
MS: Isso, eu não sei. Mas já percebi que não é uma questão de handebol. Uma diferença aqui é que só gostam de quem ganha. Acho uma pena para o esporte em geral, para quem trabalha com esporte tentando fazer algo para evoluir. Não tem muita coisa a ser feita em relação a isso, mas quem está dentro do handebol vê que o masculino e feminino estão fazendo um trabalho para alimentar o desempenho das Seleções para o futuro, chegando mais perto dos melhores. Não somos um esporte como futebol, vôlei ou basquete que estão em todo o planeta. O handebol é uma modalidade europeia. É a questão de tentar jogar contra eles. Agora, tivemos o Qatar que fez isso no Mundial masculino. Mas é muito difícil. Tomara que tenha um reconhecimento do trabalho. Independentemente de como vai ser no Mundial, vamos continuar do mesmo jeito e focar na Olimpíada do Rio para tentarmos ganhar a primeira medalha olímpica. Se não acontecer, vamos continuar para fazer evoluir o esporte dentro do Brasil.

L!Net: O handebol é muito praticado nas escoloas. Por que não existe essa evolução até a fase adulta?
MS: Existem muitos elementos que incluem esse aspecto de "por que não?" Tenho uma bagagem nórdica, sei como é feito lá e sei como é feito aqui. Lá, você começa, por exemplo, com quatro, cinco, seis anos. Vai com o pai no clube, tem o técnico que é técnico. Aqui, é o professor que teve alguns meses de Educação Física que colocam como treinador. No Brasil, começa na escola e acho legal, excelente. Mas as condições dadas não são iguais. Os professores não têm a mesma formação que os técnicos na Europa, porque isso não foi dado para eles. E quando a criança começa com dez anos na escola, o alemão, norueguês ou dinarmarquês já têm uns seis anos de handebol em comparação ao brasileiro. Esses anos fazem a diferença. Por isso, acho importante alguns meninos e meninas terem contrato na Europa como está acontecendo. Além disso, tem muito a ver com a falta de lugar para ir, faltam clubes ou times. Muitas equipes são por faculdade, universidade... Número de jogadores tem. Mas não há para onde ir. A Dinamarca tem o mesmo tamanho do Estado do Rio de Janeiro, mas tem mil clubes. E as crianças começam a jogar a partir de cinco anos. Isso faz muita diferença.

L!Net: Como é a relação na Dinamarca entre os fãs e os atletas? Só importa quem ganha também?
MS: Talvez, exista algo diferente, mas é óbvio que todos querem ganhar. Mas em relação aos fãs, existe uma atenção ao handebol muito grande no país inteiro. Passam de quatro a oito jogos por semana na televisão. Então, conseguem ter um público parecido com o da seleção de futebol. É popular, um esporte grande e cada clube tem muitos fãs. E pagam para entrar. Aqui, você tem de chamar. É um país que existe uma cultura bem implementada do handebol.

L!Net: O que mudou em relação a estrutura depois do título mundial? E o Centro de Treinamento em São Bernardo do Campo já está pronto?
MS: Temos uma grande apoio dos nossos patrocinadores, do Ministério do Esporte, do Comitê Olímpico do Brasil. Mas infelizmente, não fizemos muitos trabalhos com o time de base feminino. Faz muito tempo que houve algo. E aquele Centro de Treinamento em São Bernardo, não sei quando vamos começar a utilizar. Era para estar pronto, mas não está.

Nota da redação: Segundo a assessoria de imprensa da Confederação Brasileira de Handebol, o Centro de Treinamento já foi finalizado e agora resta providenciar as instalações internas, como móveis, arquitetura... A previsão é que ele seja entregue no fim deste ano.

L!Net: Isso atrapalha?
MS: Falando sobre a Seleção adulta, não está atrapalhando. Mas gostaria de estar treinando com o time de base. Faz um ano que não treino com o júnior, nem o juvenil. Isso claro que afeta o trabalho lá para frente. Penso mais no time da base com um centro de treinamento. No adulto, a maioria das nossas atletas está na Europa. Então, dependemos das datas internacionais. É mais fácil para a gente ir para Europa e ficar por lá uma semana fazendo alguns jogos. E nas férias em junho e julho, as atletas ficam no Brasil. Mas com a base, é uma situação diferente.

L!Net: Como foi sua adaptação ao Brasil? Ainda sente alguma dificuldade no país?
MS: Quando vim para o Brasil em 2005 para ser técnico no Pinheiros, assumi que daria um passo para trás. Ninguém pensa que o Brasil é um lugar do handebol, e, talvez, não seja. Sair de um clube da Dinamarca (Kobenhavn), trabalhando com seleção masculina de base...

L!Net: Alguém te chamou de maluco?
MS: Não. E nem deveria. Ninguém sabia como era o handebol do Brasil. Agora, todo mundo quer saber. Nunca tive tantas ligações de clubes europeus para saber de meninas daqui para jogar na Europa. A ficha mudou nesse sentido. E no masculino também. Na época, poderiam pensar maluco, mas acho que hoje ninguém pensa.

L!Net: Tem alguma atleta especifica?
MS: A mais conhecida é a Tamires, do Györi (HUN). O técnico me ligou. Uma atleta sair do Rio de Janeiro diretamente para o campeão da Liga da Europa, nunca tinha visto isso. Mostra que se um clube tem olhos para o Brasil, serviu para algo.

L!Net: O que significa ter duas atletas melhores do mundo?
MS: Se você joga pelo Brasil, tem chances de ser eleita a melhor do mundo (risos). A primera coisa que temos de colocar é que elas são muito boas jogadoras, determinadas e fizeram uma vida profissional vivendo de handebol. Pelo o que fazem no clube e na Seleção, foram reconhecidas. Lógico que o avanço que tivemos ajuda. E isso também tem um retorno ao handebol do Brasil, é um marketing para a modalidade. Os clubes europeus querem saber o que tem aqui. Não é normal ter duas brasileiras eleitas em dois anos.

NR: Alexandra Nascimento foi a melhor do mundo da temporada de 2012, e Duda Amorim de 2014.

L!Net: Como foi o planejamento o Pan ainda mais sabedo que o Brasil é tido com um dos favoritos?
MS: Também espero entrar como favorito. Mas estamos sabendo que vamos ter dois adversários difíceis: Cuba e Argentina. É um torneio importante e vamos focar para ganhar. Ao mesmo tempo, tudo o que estamos fazendo nos jogos e treinos, tem de servir como preparação para o Mundial. Acabou o Pan, vamos nos encontrar uma vez em outubro. E aí, é o Mundial. Sete meses depois, estamos no Rio. Mesmo que falem que falta um ano, é pensar em quantas fases de treinamento nós vamos ter até a Olimpíada.

L!Net: Você tem contrato até o fim da Olimpíada. Como será depois?
MS: Primeiro, o foco está em Toronto, em seguida no Mundial e na Olimpíada. Depois, não sei. Não sei o que pensam na Confederação, mas não vou esperar até os Jogos Olímpicos. Minha vida precisa ser resolvida antes disso, bem antes. Em seis a oito meses, vou saber se é para continuar aqui ou em outro lugar.

L!Net: Como analisa o trabalho até agora na Seleção?
MS: Estou muito satisfeito. Penso que conseguimos levantar o handebol. Não somos apenas uma equipe que participa de Olimpíada e Mundial. Conseguimos dar um upgrade e mostrar para nós mesmos, e nossos adversários, que temos capacidade de chegar mais próximos. Estou muito contente, só tenho de falar parabéns para as meninas. O que fiz foi implementado e aceitado por elas, que foram atrás até individualmente para ter uma evolução. Isso ajudou muito a criar a equipe que temos hoje. O convênio com o Hypo (AUT) ajudou muito.Estou bem contente com o que foi feito até o momento.

L!Net: Acredita que uma nova parceria hoje funcionaria?
MS: Acho muito interessante fazer algo parecido. Não precisa ser exatamente do mesmo jeito, mas ajudaria. Temos meninas jovens com potencial para chegar à Seleção adulta. E como não tem treino para júnior e juvenil, seria legal tentar algo com equipes europeias. Temos meninas jovens que podem ser aproveitadas. Seria legal pensar nelas e fazer algo nesse sentido.

L!Net: Como lidar com o fato de a Seleção jogar uma Olimpíada no Brasil? Isso preocupa?
MS: Podemos errar, mas já tivemos a experiência de jogar um campeonato importante em casa (Mundial 2011). Na Olimpíada, vai ter mais atenção ainda, mais pressão. Não tem discussão. Mas as meninas adoram jogar em casa, se sentam a vontade. A pressão elas têm no dia a dia, jogam na Europa, a Liga dos Campeões. Agora, é na Seleção. Isso dá uma bagagem para a Olimpíada. Os Jogos vão ser no Rio. Isso não vai mudar. Vai acontecer, então, qual nossa resposta em relação a isso?

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