Luiz Gomes: ‘Calendário jabuticaba faz convocações virarem estorvo’

'Brasil continua a ser um dos poucos, se não o único país do mundo civilizado da bola, onde as data Fifas não são respeitadas e os campeonatos continuam a rolar normalmente'

Daniel Alves (SP) - Fagner (Corinthians) - Bruno Henrique (Fla)
Convocados, Daniel Alves, Fagner e Bruno Henrique perderão, no mínimo, um jogo do Brasileiro (Fotos: Lancepress!)

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Nas entrevistas que dá, um dos temas preferidos do uruguaio Diego Lugano é falar da Seleção Brasileira. Do respeito que, como jogador, tinha pelo escrete canarinho mas, principalmente, por um sentimento que ele, como por vezes admitiu, não consegue compreender: a falta de apego do povo brasileiro pela camisa amarela. Para ele, é incrível como um time que tem em campo alguns dos melhores jogadores do mundo não consegue envolver o torcedor, despertar a paixão e de um país de apaixonados por futebol.

- No Uruguai, o futebol é um dos principais produtos de união nacional, desperta o sentimento de pertencimento da população – compara o ex-zagueiro, ex-capitão da Celeste e atual diretor do São Paulo.

Lugano não é o único a refletir sobre isso. E as explicações para o "fenômeno" são as mais variadas: a desmoralização da cartolagem durante a dinastia Teixeira-Marin-Del Nero que associou a CBF, e por tabela a seleção, à corrupção e todo tipo de falcatrua; o sumiço do time que nos últimos anos joga mais na Europa, na Ásia, nos EUA, como agora, e até no Oriente Médio, do que em terras brasileiras; a falta de vínculo dos convocados com o país, os nossos clubes, já que muitos praticamente saem da base para jogar nas ligas europeias sem terem disputado, sequer, um único Campeonato Brasileiro para deixar sua marca por aqui.

Mas o problema dessa relação, hoje, vai bem além da indiferença ou do desprezo do torcedor. O que se percebe, como na convocação de Tite na sexta-feira, é que a seleção desperta mais do que isso, um forte sentimento de rejeição.

Com Santos, Palmeiras e Flamengo brigando pela liderança do Brasileirão – palmeirenses e rubro-negros ainda vivos também na Libertadores – o atacante Bruno Henrique, o goleiro Weverton e o lateral Jorge foram chamados para dois amistosos absolutamente insignificantes contra Peru e Colômbia na terra do Tio San. Basta dar uma rápida navegada pela internet ou ouvir a conversa nas ruas para sentir a indignação de santistas, palestrinos e flamenguistas com os desfalques abertos nos seus times. Uma justa indignação.

Convenhamos, trata-se de um desgasta desnecessário. Bruno Henrique tem de fato se destacado no ataque rubro-negro, sendo um dos artilheiros do time na temporada. Mas não é jogador de seleção brasileira. Sua passagem será, com toda certeza, uma daquelas tantas que duram, quando muito, efêmeros minutos com a bola no pé. Já Weverton retorna mais de dois anos depois sua última convocação, no Jogo da Amizade contra a Colômbia, em 2017, quando só jogadores brasileiros foram chamados por Tite. Esse delay, por si só, demonstra a falta de importância que tem sua convocação numa hora dessas. Assim como a de Jorge que poderia esperar um pouco mais para fazer sua reestreia com a camisa amarela.

Tite, como de outras vezes, disse que teve "bom senso", que outros jogadores estão em observação e poderiam estar na lista, mas decidiu não convocar mais de um de cada clube para não causar desequilíbrio nos torneios em andamento. Ah, bom! Mas o fato é que para ficar, muito provavelmente no banco de reservas, Bruno Henrique, Weverton e Jorge vão desfalcar seus times ao menos em um jogo. O atacante fica fora de Avaí x Flamengo, o goleiro de Goiás x Palmeiras e o lateral de Santos x Athletico. Sem falar que na rodada seguinte, apenas quatro dias depois do segundo amistoso da seleção, Fla e Peixe se enfrentam no Maracanã no que pode até ser um confronto direto pela liderança.

Houve tempo em o torcedor vibrava quando um jogador do seu time era convocado. Para santistas e botafoguenses a hegemonia de anos na cessão de jogadores era motivo de orgulho. Como no Uruguai de Lugano, a seleção era um fator de unificação nacional. Hoje, isso virou um estorvo. O calendário jabuticaba da CBF é o pano de fundo de toda essa lambança. O Brasil continua a ser um dos poucos, se não o único país do mundo civilizado da bola, onde as data Fifas não são respeitadas e os campeonatos continuam a rolar normalmente enquanto a seleção joga. Resolver isso de vez já amenizaria muito o problema. Poderia ser uma tentativa de recomeço. De reconquistar o coração do torcedor.

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