Montanhista realiza expedição inédita entre brasileiros

Henrique Franke se aventura no projeto Catorze 8.000+, que consiste em escalar as 14 montanhas mais altas do mundo, todas com mais de 8 mil metros de altitude

Henrique Franke - Montanhista
Henrique Franke em ação (Foto: Arquivo pessoal / Divulgação)

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Dois roteiros, um objetivo: entrar para a história do montanhismo. Henrique Franke, 31 anos, tem duas possibilidades mapeadas para conseguir um feito inédito entre montanhistas brasileiros. O primeiro plano é fazer a Double Head e ir do cume do Everest, ponto mais alto do planeta (8.848 metros), ao do Lhotse (8.516 metros), no Nepal, em menos de 24 horas. O segundo, escalar o Broad Peak (8.051 metros), no Paquistão. As duas rotas fazem parte de um projeto ainda maior e ambicioso, o Catorze 8.000+, que consiste em escalar as 14 montanhas mais altas do mundo, todas com mais de 8 mil metros de altitude e localizadas nas cordilheiras do Himalaia e do Caracórum, que abrangem, além do Nepal e do Paquistão, territórios da China e da Índia. Destas, duas já foram vencidas por Franke: o próprio Everest, em 2018, e o Manaslu, em 2019. Até hoje, apenas 40 montanhistas do mundo conseguiram escalar todas elas, nenhum do Brasil.

- A ideia com o projeto era de fazer ao menos uma expedição por ano, mas a pandemia alterou a viagem de 2020. Neste ano, escalaria o Cho Oyu (a sexta montanha mais alta, também localizada no Nepal). A obrigatoriedade do adiamento me ajudou a planejar e estruturar os roteiros, permitindo a escolha por um caminho inédito - conta Franke.

A decisão de qual dos trajetos ele fará em 2021 se dará mais perto do embarque, pois depende dos protocolos definidos para a reabertura das montanhas para escaladas e da situação da pandemia de covid-19 na região. Se optar pela prioridade, Franke sairá do Brasil no dia 31 de março. Caso escolha a segunda alternativa, a expedição será realizada em junho.

A preparação física do montanhista está ocorrendo para a Double Head, pois a escalada dupla exige mais do corpo. Segundo o educador físico Henrique Bayer, responsável pelos treinamentos preparatórios, nesta expedição precisa-se de uma maior resistência neuromuscular para aguentar a demanda das duas montanhas. “A ideia é criar uma base de força sólida e deixá-lo mais forte e mais resistente, para criar uma margem de perda de força quando os treinos encerrarem e houver a viagem”, explica Bayer. A Double Head também exige, ainda, de duas a três garrafas de oxigênio a mais em razão do maior tempo permanecido acima da zona da morte.

Engenheiro ambiental de formação e atuação, Franke viu as escaladas entrarem em sua vida em 2012, quando começou a praticar em rochas. No ano de 2015, realizou a primeira escalada de alta montanha – a partir de 4 mil metros de altitude -, que já somam 15. A ligação com o esporte vem desde a infância, quando fez parte do movimento escoteiro, o qual acredita ter influenciado para criar vínculo com a natureza. Desde 2017, quando subiu o Aconcágua, dedica-se integralmente aos projetos relacionados ao montanhismo, unindo as paixões à natureza e ao esporte com o trabalho.

- Praticar montanhismo exige uma soma dos preparos mental, físico e espiritual. Passa-se o tempo todo testando limites em uma atividade de autocompreensão constante em que é preciso saber a hora exata de dar um passo atrás para depois retomar o trajeto com mais força - explica Franke.

Durante as escaladas, o apoio emocional da equipe contribui com os avanços.

- Às vezes, uma só palavra de incentivo vinda do rádio no acampamento-base faz toda a diferença para ir adiante. Por instinto de sobrevivência, a mente sempre quer te empurrar para um lugar seguro, dá vontade de desistir. Esse é mais um dos tantos momentos em que o trabalho em grupo se mostra essencial. No alto, 70% é preparo psicológico e o restante se divide entre técnica, experiência e capacidade física - relata.

No total, as expedições duram aproximadamente dois meses. No pacote da aventura, entra, ainda, desembarque no aeroporto mais perigoso do mundo para pousos (Lukla), compras de mantimentos, dias de caminhada, noites de descansos em lodges com sacos de dormir, temperatura próxima a -10ºC durante os trekkings e -50ºC nas escaladas, preparo de acampamento-base e participação no ritual budista Puja, tradição local que abençoa a trajetória de subida dos montanhistas.

As experiências em montanhas renderam a Franke, ainda, a oportunidade de criar um projeto social que permite a ele aplicar o conhecimento adquirido no curso de Engenharia Ambiental para ajudar o povoado de Phortse, que não dispõe de água potável desde o terremoto de 2015 no Nepal. Parte dos recursos arrecadados para a expedição – além de uma arrecadação paralela – será destinada à implantação de um projeto de saneamento ofertado às 700 pessoas que dividem cem casas próximas ao campo-base do Everest, em uma área onde só há vegetação rasteira.

- Em todas as expedições que realizo, dispenso o uso de helicóptero para deslocamentos entre áreas de acampamentos. Faço questão de ir a pé para criar interações e conhecer cultura e realidade locais. Foi assim que pude viabilizar este auxílio à uma população quase invisível pois fica do lado oposto à parte turística – de onde a maioria sai para escalar - conta.

Nos retornos de cada viagem, Franke recorrentemente escuta a pergunta “o que sentiu ao chegar lá em cima?”, a qual costuma responder dizendo ‘satisfação’, ‘frio’, ‘fome’, ‘cansaço’ e ‘medo’. Embora as cinco palavras possam parecer sensações soltas, estão completamente relacionadas com o real sentimento do feito alcançado.

- Ao mesmo tempo em que a pessoa se sente capaz e vencedora ao passar por todos os limites impostos, nota-se o quanto se é frágil perante a natureza. Naquele momento, tem-se o mundo aos pés, mas ninguém enxerga - disse.

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