‘O direito de torcer para um time vai além da restrição da sociedade’

A convite do LANCE!, transexual Raíssa Rosseto escreve texto sobre o preconceito nos estádios no dia da Parada do Orgulho LGBT em São Paulo. Viva a diversidade!

torcedor corinthians (foto:Arquivo Pessoal)
Raíssa Rosseto, torcedora do Corinthians e transexual (foto:Arquivo Pessoal)

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"Esse “jargão” não é meu, claro!!! Mas hoje estou me sentindo meio narcisa. Pois esse bordão nunca fez tanto sentido. Mas eu precisava começar meu texto com um bordão, já que é de praxe no mundo da bola. Imagina uma loucura maior do que uma transexual falar sobre futebol? Ou até mesmo gostar do esporte! Mas, sim! Gosto, torço e assisto!

Ainda criança, jogava bola forçada! Meu pai queria me ver jogando futebol, me botou uniforme do Corinthians e me mandou para o campo, mas ninguém mandava a bola para mim. Eu só corria feito uma barata tonta para lá e para cá... Mas pênalti, eu sabia chutar! Era a única hora em que eu chegava perto da bola e marcava gol, não era tão perna de pau assim, não!

No colégio a coisa era diferente, o futebol era permuta! Para poder completar o time de vôlei, que eu gostava de jogar, tinha que fazer parte do time de futebol também. Mas tinha umas regras! Já que me botavam no gol, onde ninguém queria ficar, meu time tinha que ter uma zaga forte, para eu não levar bolada! Quando ela vinha, queria é proteger minha cara e a defesa era só uma conseqüência! Era quase um balé. Mas acabei gostando do futebol.

É um esporte democrático, ou pelo menos deveria ser! Mas acabo assistindo de casa, pois cada vez mais vejo que a torcida é mais intolerante! Já são uns contra os outros, em um ambiente predominantemente masculino, imagine uma trans no estádio? A confusão que não seria...

Meu time vai jogar, vou torcer, mas não vou torcer contra o Palmeiras, como a maioria dos corintianos vai fazer, nem contra ou a favor do São Paulo! Vou me jogar na parada gay, um ato político importante para pessoas como eu terem os mesmos direitos civis que vocês que estão lendo. Somos todos iguais na nossa diferença e a diversidade deveria ser mais respeitada no nosso país tão diverso, seja de gênero, torcida, time ou qualquer outra coisa. Em um ambiente tão intolerante, não me atreveria ir ao Morumbi, mas na Paulista vai ter trans com camisa do Verdão, do Tricolor e até do Coringão! Vai ter torcedor “heterossexual” apoiando a causa LGBTS e até beijando na boca. Pois temos direito de torcer também, mesmo que longe dos estádios.

E esse direito é do brasileiro, apaixonado por futebol, seja ele o machão que vai brigar nos estádios ou nas ruas, ou meu amigo gay, ou mesmo que sou trans, enfim! O direito de gostar e torcer para um time vai além da restrição que a sociedade tenta criar, assim como em tudo mais na nossa vida.

Agora é esperar o resultado dessas batalhas, na grama da Ilha do Retiro, do Morumbi ou a do asfalto da Paulista! E vamos ver no que vai dar! Deixa a bola rolar. E vida que segue.

*Raíssa Rosseto, 30 anos, maquiadora, corintiana como cerca de 30 milhões espalhados pelo país. Possui identidade de gênero diferente da biológica, nasceu com corpo masculino. Escreveu esse texto a convite do L!, que apoia a causa LGBT (Gays, lésbicas, bissexuais, transexuais, travestis e transgêneros). Neste domingo, haverá a 20ª edição da Parada do Orgulho LGBT, na Avenida Paulista, o maior movimento do país contra o preconceito de gênero. 

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