A trajetória do ‘Superman’: por que Valentim é tão querido no Palmeiras

Personagens que conviveram com o técnico interino do Palmeiras contam ao LANCE! por que tanta gente gosta dele e quer sua efetivação na Academia de Futebol

Alberto Valentim durante o treino deste sábado
Cesar Greco

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Para a torcida, ele é o "Superman da Pompeia". Os jogadores gostam de chamá-lo de "Alberto Série A", em referência aos oito anos jogando na elite italiana. Técnicos com quem já trabalhou valorizam seu interesse por aprender sobre futebol, sua lealdade e seu estilo "mineiro, mas com sangue quente". A verdade é que Alberto Valentim conquistou vários admiradores antes mesmo de assumir o lugar de Cuca, somar nove pontos em sequência e reacender a esperança de título no Palmeiras. O LANCE! ouviu alguns personagens dessa trajetória para entender por que o atual técnico do Verdão é tão querido - e, também por isso, tornou-se o favorito a dirigir a equipe em 2018.


Nível Série A

Uma fila de jogadores se forma na entrada da área após o treino. Egídio cruza da esquerda, Valentim cruza da direita. A cena era corriqueira na Academia de Futebol antes da saída de Cuca. O então auxiliar fazia apostas com o lateral-esquerdo, e cada bola que os atacantes colocavam na rede valia um ponto. Foi aí que os atletas começaram a chamá-lo de "Série A".

- Ele brinca que o cruzamento dele é cruzamento de Série A italiana - explica Egídio.

- Tudo é "Série A" (risos). É uma brincadeira dos jogadores, porque o Alberto jogou bastante tempo lá. É um sinônimo de qualidade. E ele também brinca, quer tudo no nível Série A, qualidade lá em cima. É assim nas peladas também. O único que não gostou da chegada do Alberto foi o Cesar Greco (fotógrafo), que era lateral-direito nas brincadeiras da comissão - conta Fernando Miranda, ex-preparador de goleiros do Palmeiras e auxiliar de Valentim no Red Bull, no Paulistão deste ano.

Valentim
Valentim tem cruzamento 'Série A' - Cesar Greco

Parecia só brincadeira, mas a atividade fazia com que os homens de frente aprimorassem as finalizações quase diariamente. E ainda mostrava duas coisas: o ótimo clima entre jogadores e Valentim, na condição de auxiliar-técnico, e o quanto eles valorizam os quase nove anos que o ex-lateral passou no futebol italiano, jogando por Udinese e Siena entre 1999 e 2008 - no Brasil, defendeu clubes como Guarani, São Paulo, Flamengo e Atlético-PR.

- A gente sabe que ele jogou bastante tempo na Itália e absorveu bastante coisa. Ele gosta de focar bastante na parte defensiva, passa bastante coisa que aprendeu lá. Eu tinha um pouco de dificuldade na marcação e ele me passou alguns atalhos. Na questão ofensiva ele também me ajudou, mostrou como chegar no ataque sem gastar muita energia. É um cara experiente na minha posição - elogia o lateral-direito Lucas Taylor, hoje emprestado ao Paysandu, que trabalhou com Valentim no Palmeiras (como auxiliar) e no Red Bull (como técnico).

As referências italianas

Alberto Valentim diz que tenta misturar duas escolas de futebol em suas equipes: a brasileira, com talento e improviso na hora de atacar, e a italiana, com extrema organização na hora de defender. Quando parou de jogar e decidiu ser treinador, ele foi à Itália para observar de perto os métodos de Luis Henrique (na Roma), Antonio Conte (na Juventus) e Francesco Guidolin (na Udinese).

Entre a saída do Red Bull e o retorno ao Palmeiras, no primeiro semestre deste ano, teve mais um período de aprendizado. Foi primeiro à Roma, onde fez estágio com Luciano Spalletti, técnico que o comandou na Udinese e uma de suas principais referências. Além de acompanhar a rotina do clube, Valentim sentou-se com o amigo para assistir a vídeos de jogos do Red Bull e avaliar pontos positivos e negativos. Chegava pela manhã, às 10h, e saía às 19h. Também ficou alguns dias na Udinese acompanhando Luigi Delneri antes de ser convidado por Cuca para reassumir seu posto na comissão técnica fixa palmeirense.

Luciano Spalletti e Valentim
Spalletti, hoje na Inter, recebeu Valentim na Roma - Acervo pessoal

- A escola europeia está muito viva na vida dele. É um cara que se mostra muito interessado, dedicado. Sei que ele esteve com o Spalletti recentemente, um cara que o recebe em casa. Ele investe no conhecimento. Se nós conversamos e menciono um livro para ele, quando vamos conversar de novo ele já comprou -elogia Ricardo Drubscky, hoje diretor do América-MG, que era técnico do Atlético-PR na primeira experiência de Alberto Valentim como auxiliar, em 2012.

Conquistando os chefes

Ricardo Drubscky, Vagner Mancini, Gilson Kleina, Ricardo Gareca, Dorival Júnior, Oswaldo de Oliveira, Marcelo Oliveira e Cuca. Alberto Valentim integrou a comissão de todos esses treinadores, sendo os dois primeiros no Atlético-PR e os demais no Palmeiras, desde 2014. Precisou adaptar-se a cada um deles. Cuca, por exemplo, trabalha há anos com Cuquinha e Eudes Pedro, auxiliares que carrega para todos os clubes, mas encantou-se com o trabalho de Valentim a ponto de sugerir o seu retorno ao clube após a experiência no Red Bull.

Embora tenham algumas diferenças na maneira de pensar o futebol, os dois faziam trabalho bem harmônico. Valentim aplicava os treinos nos dias pós-jogo e tinha liberdade para opinar. O auxiliar sempre deixou claro o desejo de se fixar como treinador, mas nunca se colocou como ameaça para quem esteve no cargo. Cuca gostaria de prepará-lo para sucedê-lo.

- O Alberto é um cara fácil de lidar, competente e trabalhador. Tínhamos um dia a dia muito saudável, sempre falávamos de futebol, de tendências táticas e de modernidade - elogia Vagner Mancini.

- O Alberto foi um camarada muito fiel comigo. Ele me protegia muito de confronto com jogador. Dizia: "pode deixar que eu resolvo isso, você não precisa entrar nessa". A gente percebia que era sincero. Eu, ele e o Omar Feitosa formamos um trio que se deu muito bem, até porque o Omar tem esse mesmo perfil, essa iniciativa de cuidar do ambiente. No trabalho em grupo, se você não gerir bem, não adianta ser tecnicamente muito bom - emenda Ricardo Drubscky.

Valentim e Drubscky no Atlético-PR
Valentim e Ricardo Drubscky no Furacão - Divulgação/Atlético-PR

A convivência com Omar Feitosa foi fundamental para as portas do Palmeiras se abrirem. O preparador físico, que na época era gerente de futebol, foi quem o contratou no início de 2014 para a comissão técnica do Verdão. 

Conquistando os jogadores

O início na Academia de Futebol não foi fácil para Alberto Valentim. O fato de ter sido contratado por Omar fez com que alguns jogadores o enxergassem como um "homem da diretoria" em meio à comissão técnica e tivessem receio de se abrir com ele. Como se sabe, o cenário hoje é muito diferente. Não é à toa que líderes como Dudu, Dracena e Moisés já defenderam publicamente a sua efetivação.

- O Alberto ficou próximo dos jogadores, e temos de ver essa proximidade como algo positivo, não pejorativo. Não é amizade, é uma aproximação de respeito. Ela acontece porque o Alberto comanda em uma via de mão dupla: ele gosta de passar as coisas que conhece, que já viveu, mas ele também ouve. A gente se sente valorizado quando é ouvido, isso aproxima as pessoas. É um cara que jogou, tem experiência internacional, e sabe se posicionar em relação ao atleta e ao ser humano. É um cara de idade próxima à dos jogadores também, e isso vai aproximando. Tenho certeza que os jogadores querem o Alberto por esse contexto todo - opina Fernando Miranda.

- Quando eu estava no Red Bull e soube que o Palmeiras queria me reintegrar depois do Paulista, o Alberto foi uma das primeiras pessoas com quem eu comentei. Ele dá essa liberdade de chegar e conversar, trata todo mundo igual. Isso faz os jogadores gostarem dele, tanto que estão pedindo a permanência dele - completa Taylor.

A experiência como treinador

Alberto Valentim deixou o Palmeiras no fim do ano passado, assim que o clube escolheu Eduardo Baptista para substituir Cuca. Ele já se sentia preparado para ser técnico e aceitou o convite para dirigir o Red Bull no Paulistão. Em sua primeira experiência no comando de uma equipe - sem contar os períodos como interino no Palestra Itália -, não conseguiu avançar aos mata-matas.

- Foi uma pena, a campanha não traduziu o que o time jogou. Nós fizemos boas apresentações, jogamos de igual para igual com os grandes, mas não tivemos resultados. Ficou um pouco de frustração, mas o trabalho deixou um saldo positivo. A gente chegou em meio a uma troca de presidente, eles já tinham a maioria dos jogadores, mas participar da montagem do elenco, montar uma programação para a temporada, idealizar modelo de jogo, colocar em prática, fazer gestão de vestiário... Foram experiências que, com certeza, deixaram o Alberto mais preparado e mais cascudo - diz Fernando Miranda, que está estudando para ser treinador após auxiliar o amigo no Red Bull.

Fernando Miranda e Valentim no Red Bull
Fernando Miranda e Valentim - Red Bull Brasil / Media Manager

- Ele fez um trabalho bom. O treino dele é curto, dura no máximo uma hora, mas é intenso, não deixa ficar parado. Ele explicava o por quê de cada trabalho, o motivo de estar treinando daquele jeito. Quando o adversário era mais fechado, treinava de um jeito. Quando era mais aberto, treinava de outro. Ele estuda bastante o adversário também - relata Lucas Taylor.

Mineiro de sangue quente

Natural de Oliveira (MG), Alberto Valentim tem características de um bom mineiro. Tranquilo e até certo ponto tímido com quem não tem intimidade.

- Ele faz jus às características do mineiro, fica na dele, não é muito de ficar se expondo, mas está sempre bem-humorado. A distração dele é fazer exercício, todo dia corre os 10km dele, é super de boa. Dificilmente você o vê estressado - diz Fernando Miranda.

Mas o sangue também ferve. Ricardo Drubscky lembrou de um episódio:

- Apesar de ser um mineirinho do interior, ele tem sangue latino, ele ferve, tem espírito bastante aguerrido mesmo. Uma vez jogamos no campo do Vitória, estávamos ganhando de 2 a 0 com um jogador a menos e teve um jogador que cometeu uma atitude meio irresponsável, foi negligente em uma jogada. O Alberto deu um grito para o cara fazer direito, e aí um outro jogador pediu calma para ele. Ele falou: "Estou calmo. Você vai ver quando eu ficar nervoso". Gostei de ouvir aquilo, mostrou que ele estava inserido no contexto, querendo ajudar. Sei discernir bem quando há interferência e quando há parceria.

Toda essa trajetória deu a Alberto Valentim a chance de dirigir o Palmeiras em 14 jogos, com nove vitórias, um empate e quatro derrotas - contanto a passagem atual e as vezes em que foi interino. Se depender dele, dos jogadores, da torcida e de conselheiros próximos ao presidente Maurício Galiotte, essa história ainda terá muitas páginas escritas. 

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