Antes do aniversário do Timão, LNET! visita a origem: Corinthian-Casuals
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– Com licença. O senhor sabe onde fica o Corinthian-Casuals?
– Estou indo para lá. Vamos?
Foi com esse gesto cordial, na saída da estação de trem Tolworth, mais de uma hora distante do centro de Londres, que Glenn Bwatt conduziu a reportagem do LANCENET! até à quase anônima sede do clube que inspirou o nome do Sport Club Corinthians Paulista, que completa neste sábado 102 anos de existência.
Na caminhada de cerca de oito minutos por uma calçada estreita, numa área residencial, em 28 de agosto, este inglês de 60 anos, cabelos pintados de preto e sotaque arrastadíssimo explicou por que deixa sua casa para cuidar do gramado da agremiação que diz já ter defendido.
– O Casuals é frequentado por amigos. É uma confratenização. Você vai ver. E o campo é bem cuidado.
Na bilheteria, três pessoas esperam sua vez de comprar o ingresso, que custa 8 libras (cerca de R$ 24). Glenn avisa o tesoureiro que um jornalista do Brasil está com ele. A catraca é liberada.
E MAIS:
Corinthian-Casuals tem números irrisórios perto do Corinthians
O nome do "estádio" impressiona: King George's Arena. O gramado também. Sem buracos visíveis, parece melhor do que muito campo no Brasil que recebe jogos da Série A. Mas a estrutura do local é parca. São três alas de arquibancada, todas protegidas por telhas de metal. As laterais têm quatro minidegraus de concreto, enquanto a central conta com bancos. Não tem placar, o sistema de som é ativo, mas apenas acionado quando há substituições. Se você não conhece os jogadores, sairá de lá sem saber quem fez gol.
A torcida é fiel a seu modo. A maioria fica sentada e esboça poucas reações, o extremo oposto do que se conhece dos corintianos. Nada de bandeira ou música. Um ou outro puxa um "Let's go Casuals" ou parodia gritos de outros times ingleses, mais por farra do que por apoio. A cerveja ajuda a desinibir alguns no decorrer da noite.
O jogo do Casuals é apenas um bom motivo para encontrar amigos e confraternizar. Todos se conhecem, mas não há olhares intimidadores a estranhos. Nesse, foram 127 pagantes. A renda? 1015 libras. Ou pouco mais de R$ 3 mil.
FOTOS:
Confira as imagens da visita do LANCENET! ao Corinthian-Casuals
Se o Timão nasceu amador em 1910 para se tornar o clube com a segunda maior torcida do Brasil, o Corinthian-Casuals parou no tempo. Disputa a Divisão 1 Sul da Ryman Football League, campeonato semiprofissional, mas diz ser o único entre os 22 participantes que não paga salários. A renda das partidas ajuda nas despesas com aluguel, taxas de arbitragem e viagens. Com orgulho, se autointitula o único time amador da Inglaterra.
Fundado em 1882, mas com o nome atual desde 1939 após a fusão de dois clubes, o Corinthian-Casuals sobrevive da generosidade que existe em seus fiéis seguidores.
O JOGO
O esforço foi enorme, mas traçar um paralelo entre jogadores dos Corinthians do Brasil e da Inglaterra é uma missão inglória. Até Rob Cavallini, Casuals de nascimento e Timão por adoção, tem dificuldades. Por exemplo, o técnico Kim Harris é uma espécie de Tite do futebol amador? "Sim, até porque é um ótimo treinador", ele responde.
Mas pouco se viu da filosofia de Adenor Bacchi na noite da última terça-feira no King George's Arena. O Corinthian-Casuals teve o jogo na mão, mas perdeu a cabeça e, por pouco, não perde o jogo: 4 a 4 com o Three Bridges, pela terceira rodada da Divisão 1 Sul da Ryman League.
Jamie Byatt, camisa 9, foi o nome do jogo. Marcou dois gols no primeiro tempo, um deles de pênalti, e fez o Casuals ir ao intervalo com 3 a 0 no placar, surpreendendo até os mais assíduos torcedores. Classificado por Cavallini como "mais ou menos um Emerson Sheik", fisicamente ele se parece com Madson, meia que se destacou pelo Santos (canhoto e de baixa estatura). Mas pela marra e aptidão por ser herói e vilão num piscar de olhos, tem mais jeitão de Jorge Henrique.
O Casuals vencia por 4 a 1 (após um golaço de Tom Jelly por cobertura), mas Byatt atropelou um adversário, o que gerou sua expulsão. Com um a menos, e sem posse de bola, maior ponto fraco desse time, o Corinthian só assistiu à reação do Three Bridges.
Na entrevista coletiva pós-jogo, com certeza Tite diria que faltou equilíbrio.
Historiador Rob Cavallini estava com uma camisa do Corinthians
CURIOSIDADES
1) Com copo de plástico, mas sem ambulância
O estádio do Corinthian-Casuals carece de estrutura. Os vestiários ficam numa casinha atrás da cozinha do restaurante. Não há ambulância nem qualquer sinalização de equipamentos de primeiros socorros, por exemplo. Se algo acontece por lá, resta torcer para a ajuda chegar rápido. A saída de emergência é um portão que dá em outro campo, menor. A única "medida de segurança" tomada é no pub. A cerveja só é servida em copos de vidro para quem consumir a bebida no recinto. Se a intenção é saboreá-la na arquibancada, o líquido vai para um recipiente de plástico.
2) Até quem veste verde é bem-vindo
Usar alguma peça de roupa verde, cor do arquirrival Palmeiras, no meio da torcida do Corinthians costuma gerar situações tensas nos jogos. O mesmo não acontece na torcida do Casuals. Dois alviverdes vestindo o uniforme do Plymouth Argyle, clube da Quarta Divisão da Inglaterra eram também os mais assíduos no pub. Um deles tinha o braço direito quase todo tatuado em homenagem ao Argyle, com a frase Green Army (Exército Verde). Por conta do grau alcoólico, tiveram dificuldade de dizer seus nomes à reportagem.
3) Casamento sem tapete na cor do rival
A raiz que o Corinthian-Casuals plantou no Brasil também floresceu no coração de Rob Cavallini. Historiador e autor de três livros sobre o clube, o inglês virou corintiano, maloqueiro e sofredor. A paixão platônica também virou livro. Em 2010, ele tentou se fixar no Brasil e abriu um pub em São Paulo. O negócio naufragou e ele retornou à Inglaterra, onde voltou a se dedicar ao Casuals. No período, esteve em vários jogos do Timão. "Fui a Bogotá, Montevidéu, Porto Alegre..." conta o corintiano, que planeja ir ao Japão acompanhar o Mundial de Clubes. Rob se casou com uma brasileira. Na cerimônia, havia um tapete verde na decoração. "Mandei tirar na hora" ressalta.
4) Brian Phillips, o faz-tudo
Aos 66 anos, Brian Phillips é uma espécie de faz-tudo do Casuals. Ajuda na bilheteria e no suporte ao clube que frequenta desde 1988. Também toma conta da "loja oficial": uma caixa de papelão, guardada num depósito com escada e ferramentas, com camisas do Corinthian, vendidas por 30 libras (cerca de R$ 90). Ele tem boas lembranças dos brasileiros que costumam visitar o clube, e foi buscar (e vestir) uma das camisas que ganhou, da Estopim. "Uma vez, um grupo de brasileiros veio assistir à um jogo. Quando saiu o gol do Casuals, eles foram à loucura, entraram no campo e carregaram o jogador. A partida ficou paralisada", conta Phillips, de sorriso fácil, mas faltando alguns dentes.
5) Cadê a bandeira do Casuals?
Da centena de torcedores que viram o jogo com o Three Bridges, o LANCENET! localizou apenas dois vestindo o uniforme do Casuals. Rob Cavallini estava com uma camisa do Corinthians. Do nada, surgiu uma bandeira do Timão, colocada atrás do gol adversário. "Não tem bandeira do Casuals?" perguntou a reportagem. Ninguém soube responder...
6) Timão e goleada no United: orgulhos
No dia 26 de novembro de 1904, em Leyton, pouco mais de 500 espectadores testemunharam um marco do futebol inglês. Nesta data, o Corinthian, um dos clubes que originaram o atual Corinthian Casuals, goleou o hoje todo poderoso Manchester United por 11 a 3. Foi a pior derrota já sofrida pelos Red Devils. A celebração dos cem anos dessa data, em 2004, contou com um amistoso entre o Casuals e o time de jovens do United, no King George's Arena.
Outra data marcante na história do Corinthians-Casuals foi 13 de abril de 2008, quando celebrou seus 125 anos de história em amistoso no mítico Wembley com o AFC Wimbledon. Os dois jogos geraram pequenos livros, dos quais a reportagem do LANCENET! foi gentilmente premiada. Em ambos há páginas dedicadas à ligação com o Corinthians.
SITUAÇÃO NO CAMPEONATO
No dia do aniversário do Corinthians brasileiro, o Casuals entra em campo pela quarta rodada da Divisão 1 Sul da Ryman League. Fora de casa, enfrenta o Maidstone United. O Casuals ocupa a 12a colocação na tabela, com três pontos em três partidas. O líder é o Crawley Down Gatwick, com nove. O torneio tem 22 equipes, e o lanterna acaba rebaixado.
QUEM É? - Corinthian Casuals
Com esse nome, existe desde 1939, após a fusão de outros dois clubes amadores da Inglaterra: o Corinthian (fundado em 1882) e o Casuals (em 1883). Foi esta primeira agremiação que excursionou pelo Brasil em 1910 e inspirou o nome do Sport Clube Corinthians Paulista.
ENCONTROS
1965
Depois de um amistoso com o Arsenal em Londres, o Timão foi presenteado pelo Casuals com uma salva de prata.
1983
Dois membros do Corinthians Paulista são convidados a participar do jantar do centenário do Corinthian Casuals.
1988
No dia 5 de junho, veteranos do Corinthians enfrentaram o Corinthian Casuals em amistoso no Pacaembu. Sócrates marcou o gol do jogo, e atuou os últimos 15 minutos com a camisa rosa e grená do Casuals.
2001
Integrantes do Corinthian Casuals viram no estádio a decisão do Campeonato Paulista.
NO MUNDO VIRTUAL
O Corinthian Casuals é amador, mas tem perfis oficiais no Facebook e no Twitter (@CorinthianCas), contas moderadas por dois torcedores: Stuart Tree e Nick Overend. Eles usam as redes sociais para espalhar wallpapers com a tabela de jogos da equipe. Uma frase chama a atenção na última versão: Vai Corinthians, provavelmente sugerida por algum alvinegro que acompanha os ingleses pela internet.
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