O Sport Club Corinthians Paulista carrega há décadas um dos apelidos mais marcantes do futebol brasileiro: “Timão”. Este nome se tornou tão popular que transcendeu as arquibancadas e virou sinônimo do próprio clube, sendo usado por torcedores, imprensa e até mesmo em campanhas oficiais do time alvinegro.
Mas você conhece a verdadeira história por trás desse apelido icônico?
- A chegada de um craque mundial que mudou a história do clube em 1966
- O papel fundamental de um jornalista visionário na criação do termo
- Como uma temporada frustrada acabou gerando o apelido mais duradouro do futebol paulista
O ano de 1966: Quando tudo começou

A história oficial do apelido “Timão” começou em 1966, durante uma das épocas mais esperançosas da história corintiana. Naquele ano, o presidente Wadih Helu estava determinado a acabar com o jejum de títulos do Campeonato Paulista, que já durava 12 longos anos.
Para montar um verdadeiro esquadrão, o Corinthians investiu pesado no mercado da bola. Do rival Portuguesa vieram dois jogadores experientes: o zagueiro Ditão e o volante Nair. Mas a contratação que realmente mexeu com a imaginação da torcida foi a chegada de Manuel Francisco dos Santos, o lendário Garrincha.
Aos 32 anos e já com problemas no joelho, o “Anjo das Pernas Tortas” chegou ao Parque São Jorge como a última esperança de quebrar a maldição. O investimento foi alto: 220 milhões de cruzeiros pelo passe, equivalente a cerca de 100 mil dólares na época.
Thomaz Mazzoni: O criador de lendas
Thomaz Mazzoni era muito mais que um simples jornalista esportivo. Trabalhando no jornal A Gazeta Esportiva, ele havia se tornado uma verdadeira lenda da imprensa paulista, conhecido por sua criatividade na criação de termos que marcaram o futebol brasileiro para sempre.
Mazzoni já havia criado os nomes dos principais clássicos paulistas que usamos até hoje: Derby (Corinthians x Palmeiras), Majestoso (Corinthians x São Paulo), Choque-Rei (São Paulo x Palmeiras) e San-São (Santos x São Paulo). Também foi responsável por apelidos como “Campeoníssimo” para o Palmeiras e “Clube da Fé” para o São Paulo.
Em 2 de março de 1966, véspera da estreia de Garrincha pelo Corinthians, A Gazeta Esportiva estampou uma manchete histórica: “Vocês vão ver como é Ditão, Nair e Mané”, numa clara referência à música de Jackson do Pandeiro sobre a seleção de 1962.
O momento histórico: Nasce o “Timão”
A estreia oficial de Garrincha aconteceu em 6 de março de 1966, contra o Cruzeiro, no Mineirão, pelo Torneio Rio-São Paulo. O Corinthians venceu por 2 a 1, com uma atuação destacada do camisa 7, que ainda mostrava lampejos de sua genialidade.
Foi exatamente após essa partida que Thomaz Mazzoni fez história. Na edição seguinte de A Gazeta Esportiva, ele se referiu ao Corinthians como “Timão” pela primeira vez. A manchete trazia: “Mané foi ‘show’, alegria e gol da vitória em Minas”, acompanhada do resultado “‘Timão’: 2 a 1”.
O termo surgiu da impressão de que aquela equipe, com tantos reforços de peso, seria um verdadeiro “timão” – uma força poderosa capaz de conduzir o clube rumo aos títulos. Mazzoni sempre teve o dom de capturar o sentimento do momento e transformá-lo em palavras que grudavam na memória popular.
A ironia do destino: Fracasso que virou eternidade
Paradoxalmente, a temporada de 1966 foi um completo fracasso esportivo. Garrincha, limitado pelos problemas físicos e pelo alcoolismo, fez apenas 13 partidas pelo Corinthians e não marcou nenhum gol. O “Timão” não conquistou título algum, enquanto assistia ao arquirrival Palmeiras levantar a taça do Campeonato Paulista.
As torcidas rivais logo encontraram uma forma de provocar: nos estádios, começaram a gritar “Cadê o Timão? Cadê o Timão?” em tom de deboche. Mas o que era para ser motivo de chacota acabou tendo o efeito contrário: o apelido grudou definitivamente no clube.
A Fiel Torcida abraçou o termo com carinho, transformando uma provocação em marca de identidade. O que havia nascido como expectativa e virado decepção, renasceu como símbolo de resistência e paixão.
A teoria alternativa: O escudo naval
Existe uma segunda versão, menos documentada, sobre a origem do apelido. Alguns defendem que “Timão” surge do formato do escudo do Corinthians, que contém dois remos e uma âncora – elementos náuticos que lembrariam o timão de uma embarcação.
Esta teoria sugere que torcedores e admiradores, ao observarem o brasão do clube, faziam a associação visual com o leme de um navio, peça fundamental para conduzir a embarcação. O timão, como instrumento de direção e controle, simbolizaria a força e determinação necessárias para guiar o clube rumo às vitórias.
Embora esta versão seja romanticamente atrativa, a primeira explicação – relacionada a Garrincha e Thomaz Mazzoni – é considerada oficial pelo próprio clube e está documentada no Memorial do Corinthians.
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De 1966 aos dias atuais: Mais de 50 anos de história

Ao longo de mais de cinco décadas, o apelido “Timão” se consolidou como parte integrante da identidade corintiana. Hoje é impossível imaginar o clube sem essa alcunha que transcendeu gerações.
O termo aparece em músicas da torcida, campanhas publicitárias, produtos oficiais e até mesmo em documentos do próprio clube. Virou sinônimo de força, tradição e paixão – valores que a torcida corintiana carrega com orgulho.
Curiosamente, o apelido que nasceu de uma temporada de frustrações acabou testemunhando os maiores momentos da história do clube: os títulos de 1977 e 1982, a era da Democracia Corintiana, as conquistas da Libertadores e do Mundial de Clubes.
O legado de Thomaz Mazzoni no futebol brasileiro
A criação do apelido “Timão” é apenas um exemplo do legado deixado por Thomaz Mazzoni no jornalismo esportivo brasileiro. O imigrante italiano, que chegou criança ao Brasil, revolucionou a forma de falar sobre futebol no país.
Mazzoni modernizou a linguagem esportiva, criou termos que persistem até hoje e estabeleceu um padrão de criatividade que influenciou gerações de jornalistas. Sua morte, em 1970, foi lamentada por todo o meio futebolístico, e a Federação Paulista chegou a decretar luto oficial de três dias.
O Centro Esportivo da Vila Maria hoje leva seu nome, eternizando a memória do homem que, com uma simples palavra numa manchete de jornal, criou um dos apelidos mais duradouros do futebol brasileiro.
Timão: Muito mais que um simples apelido
A história do apelido “Timão” revela muito sobre a cultura futebolística brasileira e o poder da imprensa na criação de símbolos duradouros. O que começou como uma esperança em 1966, passou por decepção e deboche, mas acabou se transformando em uma das marcas mais reconhecidas do futebol nacional.
Os principais aspectos dessa história incluem:
- A genialidade de Thomaz Mazzoni em capturar o espírito de uma época e transformá-lo em linguagem popular que atravessaria gerações
- A capacidade da torcida corintiana de ressignificar uma provocação, transformando o que era motivo de chacota em símbolo de orgulho e identidade
- Como um momento específico da história – a chegada frustrada de Garrincha – pode gerar consequências duradouras que definem a identidade de uma instituição centenária