Os gandulas no futebol brasileiro transcenderam sua função básica de repor bolas e se tornaram personagens únicos, capazes de influenciar lances decisivos. Entre momentos heroicos e polêmicas, esses auxiliares do jogo representam uma tradição peculiar do futebol nacional.
A cultura dos gandulas no Brasil criou figuras emblemáticas que marcaram a história do esporte. Desde casos famosos como o de Fernanda Maia até situações controversas que mudaram resultados de partidas, os gandulas brasileiros são muito mais que simples recolhedores de bola.
- Podem acelerar ou retardar o ritmo do jogo conforme a conveniência do time da casa
- Já protagonizaram lances que resultaram em gols históricos e polêmicas memoráveis
- Representam uma tradição única do futebol brasileiro com influência direta no resultado das partidas
A origem curiosa do termo “gandula” no futebol brasileiro
O termo “gandula” tem origem no português arcaico “gandulo”, que significa pessoa vadia ou folgada. Já era usado no Rio de Janeiro desde os anos 1930 para designar garotos que ficavam ao redor dos campos assistindo aos jogos por horas.
Existe uma lenda popular que atribui a origem do nome ao jogador argentino Bernardo Gandulla, que jogou no Vasco em 1939. Segundo o mito, ele ficava no banco e corria para buscar as bolas, mas isso não é verdade histórica.
Na realidade, Gandulla jogou 30 dos 31 jogos que disputou pelo Vasco, marcando 10 gols. O termo já existia antes de sua chegada ao Brasil, mas a coincidência temporal com a oficialização dos gandulas em 1940 ajudou a perpetuar essa lenda urbana.
Fernanda Maia: a gandula que virou lenda do futebol brasileiro
Em 29 de abril de 2012, Fernanda Maia protagonizou um dos momentos mais emblemáticos da história dos gandulas brasileiros. Na final da Taça Rio entre Botafogo e Vasco, ela repôs rapidamente a bola para um lateral que resultou no gol de Loco Abreu.
A narração icônica de Luís Roberto imortalizou o momento: “Gol do Loco Abreu! E a jogada que começou com o gandula”. O comentarista depois corrigiu: “Não é o gandula, mas a gandula”, dando ainda mais destaque ao lance.
Fernanda trabalhava como gandula há três anos e sempre aplicava a mesma técnica de colocar a bola diretamente na mão do jogador para agilizar o jogo. Hoje, ela é apresentadora esportiva e locutora oficial do Estádio Nilton Santos.
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Casos polêmicos que marcaram a história dos gandulas

O futebol brasileiro registra diversos casos de gandulas que interferiram decisivamente em partidas. Um dos mais bizarros aconteceu em 2006, quando um gandula do Santacruzense chutou a bola para dentro do gol contra o Atlético Sorocaba.
A árbitra Silvia Regina validou o gol após ver a bola dentro da rede, sem perceber a intervenção do gandula. O lance gerou enorme polêmica e processo no Tribunal de Justiça Desportiva para anular a partida.
Outro caso emblemático ocorreu em Sergipe, quando o gandula Rinha defendeu um chute que seria gol do Sergipe contra o Guarany. O lance foi filmado e viralizou, mostrando como os gandulas podem se tornar “jogadores extras” nas partidas brasileiras.
O protocolo da CBF para controlar os gandulas
Percebendo que os gandulas estavam se tornando fator casa excessivo, a CBF criou em 2012 um protocolo específico para regulamentar a atividade. As novas regras visam transformar os gandulas em auxiliares neutros, não mais “jogadores extras”.
Segundo o protocolo, a bola deve ser rolada para os atletas ou deixada no solo fora do campo. É proibido rolar a bola diretamente para dentro do campo de jogo ou entregá-la na mão dos jogadores quando há placas publicitárias.
Desde 2004, em torneios organizados pela CBF, os gandulas não podem ser menores de idade. A medida busca maior profissionalização da função e reduzir comportamentos inadequados durante as partidas.
As estratégias e “espertezas” dos gandulas brasileiros
No Brasil, os gandulas tradicionalmente favorecem o time da casa, afinal são escolhidos pelos próprios clubes mandantes. Essa prática gerou ao longo dos anos uma série de estratégias que influenciam diretamente o resultado das partidas.
Quando o time da casa está ganhando, os gandulas costumam “sumir” com as bolas, retardando as reposições para consumir tempo. Já quando o time precisa do resultado, eles aceleram ao máximo a devolução das bolas.
Alguns casos famosos incluem gandulas que passavam recados de treinadores, provocavam jogadores adversários e até ameaçavam repórteres durante transmissões. Essa cultura criou um folclore único no futebol brasileiro.
Atenção: O caso mais emblemático foi no Morumbi, onde gandulas seguravam bolas reservas quando Rogério Ceni saía para cobrar faltas, evitando contra-ataques com o gol vazio.
A profissionalização dos gandulas no futebol moderno
Ser gandula não é profissão regulamentada, mas no Brasil quem exerce a atividade recebe cerca de R$ 70 por jogo, além de lanche e vale-transporte. Em 2012, houve uma proposta no Congresso para regulamentar a atividade.
A FIFA determina que uma partida deve ter 14 gandulas: três nas laterais do campo e quatro atrás de cada gol. Os extras são chamados de “maratonistas” e têm a função de buscar bolas chutadas mais longe.
Em campeonatos de maior estrutura, os gandulas sempre têm uma bola à mão para reposição imediata. Agilidade e neutralidade são características essenciais, embora na prática a neutralidade seja frequentemente questionável.
Gandulas famosos e seus momentos históricos

Além de Fernanda Maia, outros gandulas ficaram famosos por suas atuações no futebol brasileiro. Em 2011, um gandula do Santos devolveu rapidamente a bola para Neymar em uma partida da Libertadores, permitindo uma jogada que resultou em gol.
O episódio de Charlie Morgan no futebol inglês também teve repercussão no Brasil. O gandula foi empurrado por Eden Hazard após se recusar a devolver rapidamente a bola, mostrando como essa tensão existe em outros países.
Casos como esses mostram que os gandulas podem se tornar protagonistas involuntários de momentos decisivos, influenciando diretamente o curso das partidas e entrando para a história do esporte.
Por que os gandulas são diferentes no Brasil
O futebol brasileiro desenvolveu uma cultura única em relação aos gandulas, muito diferente de outros países. Enquanto em outras nações eles são figuras discretas e neutras, no Brasil se tornaram personagens ativos do espetáculo.
Essa característica reflete a criatividade e o “jeitinho brasileiro” aplicado ao futebol. Os gandulas não são apenas funcionários técnicos, mas extensões da torcida e do clube, participando ativamente da estratégia para buscar vantagens.
A paixão exacerbada pelo futebol no Brasil transformou até mesmo funções auxiliares em elementos estratégicos. Os gandulas brasileiros representam essa intensidade única que caracteriza o futebol nacional.
O futuro dos gandulas no futebol brasileiro
Com a crescente profissionalização do futebol, os gandulas tendem a se tornar mais neutros e técnicos. As novas gerações de árbitros são mais rigorosas com comportamentos inadequados, coibindo excessos.
Experimentos como o uso de mulheres estudantes de Educação Física como gandulas em São Paulo mostraram alternativas para reduzir a parcialidade. A medida visa “desanuviar o ambiente e expulsar baderneiros”.
O desafio é manter a agilidade do jogo sem comprometer a neutralidade. Os gandulas continuarão sendo peças importantes do futebol brasileiro, mas com comportamentos mais profissionais e éticos.
Entre a tradição e a modernização do futebol
- Os gandulas brasileiros criaram uma cultura única de participação ativa nas partidas
- Casos históricos como o de Fernanda Maia mostram a influência que podem exercer em momentos decisivos
- A CBF busca equilibrar a tradição com a necessidade de neutralidade e profissionalização da função