O esporte protesta: veja como as manifestações nos Estados Unidos ecoaram em todas as modalidades

Em momento histórico, atletas decidem não atuar devido a 'caso Jacob Blake' e endossam pressão pelo fim do racismo no país. LANCE! traça um panorama da reação

Em protesto à morte de Jacob Blake, NBA não teve partidas no meio de semana. A WNBA também não teve jogos
Foto: Kevin C. Cox/AFP

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A indignação com a forma como os negros são subjugados nos Estados Unidos eclodiu de maneira histórica no esporte americano. Pela primeira vez, a NBA, a MLB, MLS e o tênis se depararam com boicotes ou adiamentos causados pela indignação de atletas com um novo caso no país: Jacob Blake, que levou sete tiros nas costas e ficou paraplégico.

A mobilização surge em um cenário no qual a população americana se mostra fatigada com a conduta da polícia americana contra negros.  

- O racismo continua muito forte nos Estados Unidos. Mas a sensação com estas manifestações é de que o povo está no limite. A violência aumentou muito, a repressão policial acontece de forma diferente entre negros e brancos. A postura do presidente Donald Trump também dá margem para que o país se divida - afirmou, ao LANCE!, Fábio Malavazzi, brasileiro radicado nos Estados Unidos há 30 anos e que, após passagens por canais como ESPN, TNT Latin e Space, hoje trabalha na NBA League Pass.

Atletas da NBA já tinham estado em protestos contra o assassinato de George Floyd, que morreu asfixiado por um policial em 25 de maio. Meses depois, eles decidiram que a manifestação tinha de ir além da frase "Vidas Negras Importam" estampada nas quadras. O Milwaukee Bucks não compareceu para jogar e ganhou a solidariedade do Orlando Magic, que recusou-se a ganhar por W.O. As partidas do meio de semana foram remarcadas depois de uma intensa reunião que evidenciou a conscientização.

- O LeBron James se firmou mais uma vez como uma referência entre os atletas sobre os movimentos sociais. Além de ser um astro nas quadras, ele é muito ativo politicamente, debate questões políticas. Foi essencial inclusive para que houvesse um despertar entre os atletas para estes atletas - afirmou Malavazzi.

A WNBA (voltada para o basquete feminino do país) também teve partidas adiadas devido a protestos.

A REAÇÃO NAS DEMAIS LIGAS

Baseball - protesto
Mets e Marlins: 42  segundos de silêncio e saída de campo (Reprodução / SNY)

As manifestações não ficaram restritas à "bolha" da NBA. A Major League Baseball (MLB) lidou com adiamentos de partidas e se deparou também com uma cena comovente no duelo entre New York Mets e Miami Marlins.

As duas equipes entraram para o confronto e ficaram por 42 segundos em silêncio. Depois, todos abandonaram o campo, de acordo com a ESPN, em sinal de protesto pela morte de Jacob Blake. 

O narrador de beisebol da ESPN, Ernesto Jerez, contou que o número 42 tem um valor simbólico.

- Foram 42 segundos por honra a Jackie Robinson, que quebrou a barreira racial na MLB e vestia este número. Tanto que nenhuma equipe adota na sua numração o 42. Em todos os anos, a competição celebra o 42 de Jackie Robinson en 15 de abril para esta data em homenagem a ele e também em protesto pelos atos de violência contra negros - e, em seguida, apontou:

- O que aconteceu no duelo entre Mets e Marlins foi mais um exemplo de união das equipes diante dos problemas dos Estados Unidos. Trata-se da busca por criar consciência por meio do esporte de que estas coisas podem continuar a acontecer - completou.

Leo Landino, produtor da modalidade na ESPN, também detalhou.

- Com a explosão da indignação pelo país afora, os atletas profissionais têm se mostrado cada vez mais envolvidos nos protestos sociais, em mostrarem sua representatividade - afirmou.

Landino apontou alguns jogadores que se manifestaram com mais veemência.

- Alguns jogadores têm sido mais firmes no movimento "Black Lives Matter", como alguns dos (New York) Yankees. Um astro que se manifestou foi Mookie Betts, atleta que fez recentemente um contrato milionário. Mas, no meu modo de ver, aderir a este movimento devia ser uma coisa mais pessoal, em vez de fazer com uma liga inteira - disse.

O tênis também se deparou com uma mudança: após Naomi Osaka se recusar a disputar a semifinal do Masters 1000 na última quinta-feira, todas as partidas foram transferidas para esta sexta-feira.

MLS: A FORÇA DOS ATLETAS FALA MAIS ALTO

Inter Miami x Atlanta
Inter Miami e Atlanta United entraram em campo, mas não jogaram (Reprodução / ESPN FC)

A Major League Soccer também teve de mudar sua programação devido à manifestação de atletas. A bola rolou exclusivamente na vitória por 3 a 1 do Orlando City sobre o Nashville.

Inter Miami e Atlanta United chegaram a entrar em campo e posaram unidos com a camisa estampada "Black Lives Matter", mas não jogaram. Outras duas partidas também não foram realizadas.
 
- Todos se uniram de alguma forma ao protesto do "Black Lives Matter". Tanto que o Sindicato dos Jogadores de Futebol (MLS Players) se mostrou amplamente favorável aos atletas não entrarem em campo.  Mas naturalmente não deve durar muito -  afirmou Richard Mendez, comentarista da ESPN americana.

Logo depois, a Major League Soccer emitiu uma nota oficial manifestando seu repúdio ao racismo e anunciando o adiamento.

A National League Hockey (NHL) foi outra competição que anunciou o adiamento das partidas dos seus playoffs. Os quatro jogos acontecerão no fim de semana. 

ANO ELEITORAL E CONVULSÃO SOCIAL: O PANO DE FUNDO AMERICANO

Donald Trump ainda não era o presidente dos Estados Unidos. Hillary Clinton liderava todas as pesquisas e especialistas tinham certeza da sua eleição.
Trump, que divide opiniões, chamou a NBA de 'organização política' (Reprodução)

A comoção em torno da segregação racial ocorre em um ano que seguirá intenso nos Estados Unidos. A conduta do atual presidente, Donald Trump, divide opiniões de maneira severa.

- Trata-se de uma figura muito controversa, suas declarações têm forte impacto nos meios de comunicação - detalhou Leo Galdino. 

Trump reagiu aos protestos na última quinta-feira, acusando a NBA de ter se tornado uma "organização política". 

A proximidade da corrida eleitoral aumenta o desejo por mudanças.

- Além do povo escolher o novo presidente, haverá eleições para o senado e deputados. Muitas das equipes são financiadas por grupos de empresários. Haverá uma pressão muito grande - afirmou Fábio Malavazzi, que destacou: 

- Hoje procuramos alguém que nos guie e nos dê uma perspectiva de melhora. Nossos líderes falharam nesse aspecto e os jogadores da NBA estão preenchendo esse espaço usando suas plataformas e ações politicas e sociais. Lideram uma geração exausta de tanto conflito e que procura um mundo mais positivo. Essa é uma manifestação por igualdade e empatia. Nós precisamos dessas vozes - completou.

O esporte procura soltar sua voz.

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