Museu de estádio irlandês conta história dos esportes gaélicos

Pelo formato, bola do futebol gaélico lembra a de vôlei (Foto: Bruno Barbosa)
Pelo formato, bola do futebol gaélico lembra a de vôlei (Foto: Bruno Barbosa)

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Hoje a República da Irlanda é um país independente. Mas a desintegração oficial do governo britânico, conquistada no longínquo ano de 1922, só se tornou realidade para o povo irlandês após longas e sangrentas batalhas contra os vizinhos ingleses.

Antes da independência e durante a forte opressão imposta pela Inglaterra, quando brigas territoriais, políticas e religiosas estavam à flor da pele, os irlandeses não queriam, de forma alguma, que a cultura do país fosse apagada e, pior, substituída ao longo dos anos pelos costumes britânicos. Mas não havia muito o que fazer sem o poder em mãos.

Foi então nesse exato ponto da história que o prestígio dos esportes se fizeram valer em benefício de um povo que gritava por socorro.

Em 1884, uma organização nacionalista chamada Associação Atlética Gaélica (GAA, em inglês) foi fundada para promover e manter a cultura irlandesa através dos esportes populares do país. São eles o hurling e o futebol gaélico. Ambos arrastam multidões às arquibancadas.

Os esportes também foram fundamentais para a autoestima do país enquanto este estava tentando se recuperar de um outro grave problema que assolou a ilha entre 1845 e 1849: a grande escassez de alimentos.

- Nós tivemos um grande período de fome aqui. E tudo ficou desorganizado porque as pessoas estavam morrendo. Cerca de 45 anos depois, o GAA foi formado e, originalmente, cobriu todos os esportes. Foi para envolver as pessoas e fazê-las esquecer o período de fome. Recuperá-las – contou Kevin Nichol, supervisor geral do museu GAA, em entrevista exclusiva ao LANCE!Net.

Em museu, importância dos esportes gaélicos é destacada em detalhes (Foto: Bruno Barbosa)

Em 1920, entretanto, o estádio de Croke Park foi palco de um verdadeiro massacre. Em represália pela morte de soldados britânicos durante confronto contra os irlandeses, o exército inglês invadiu o campo em meio a um jogo de futebol gaélico e abriu fogo, matando 13 jogadores e um jogador irlandês. O episódio ficou marcado na história como “Bloody Sunday” (Domingo Sangrento).

- Mas o estádio foi também o instrumento para aproximar as pessoas novamente após o massacre. Se você pensar que nosso ganho se tornou todo mundo, e pessoas de ambos os lados (Irlanda e Inglaterra) começaram a jogar nosso jogo juntas. Foi um grande momento da história – ressaltou Nichol.

Logo após conquistarem a soberania, no entanto, os irlandeses, como forma de protesto ao ataque de 1920, proibiram em Croke Park a prática de todas as modalidades esportivas criadas pelos ingleses: o rúgbi e o futebol - este último encontrado até hoje em jornais da Irlanda como ‘soccer’. O veto durou mais de cem anos.

- Neste estádio, só temos o GAA. Mas tínhamos o futebol e o rúgbi quando eles foram restabelecidos em seus próprios estádios – explicou o supervisor, referindo-se ao moderno Aviva Stadium, também em Dublin.

Chamado Hurley, este bastão é utilizado para pontuar no hurling (Foto: Bruno Barbosa)

Em 2008, a Seleção Brasileira venceu a Irlanda por 1 a 0 em Croke Park. Na época, o amistoso foi apenas o quinto jogo de futebol disputado no local.

- Nosso estádio é o quarto maior da Europa. Comporta 82 mil pessoas por jogo, enquanto o outro comporta apenas 50 mil.

A grandeza de Croke Park, inclusive, faz dele o maior estádio de esportes amadores do mundo. Apesar da força cultural que têm, hurling e futebol gaélico nunca se tornaram profissionais.

- Após os jogos, eles (jogadores) sabem que na segunda-feira estarão indo trabalhar normalmente – diz John Campbell, guia de tour do estádio.

- Não somos profissionais. Somos completamente amadores. Não pagamos nossos jogadores – reforça Nichol, que aproveita para destacar uma outra diretriz do GAA.

- A primeira coisa que fizemos quando criamos a liga foi dizer não à religião e à política.

Pelo formato, bola do futebol gaélico lembra a de vôlei (Foto: Bruno Barbosa)

O real valor dos esportes gaélicos para os atletas, afirma Nichol, é de poder representar seus vilarejos, a terra humilde de onde vieram.

- Eles jogam pelo orgulho do país, pelo orgulho de seus condados. Isso tudo nos faz voltar ao que eu disse sobre ser uma vila. Eles estão representando suas próprias vilas pelos times do condado.

Considerando a grande colaboração do hurling e do futebol gaélico para a República da Irlanda durante a luta pela independência e pela reestruturação após o período de fome, os esportes, talvez, não poderiam ter suas honras melhor valorizadas pelo supervisor Nichol.

- Significam tudo. Nossos esportes são mais do que até mesmo a religião, são mais do que a vida e a morte.

O hurling

Considerado um dos esportes mais rápidos do mundo, o hurling lembra muito o hockey. Cada equipe conta com 15 jogadores titulares, sendo um goleiro, seis defensores, dois meio-campistas e seis atacantes. Com o auxílio de um bastão chamado Hurley, é preciso marcar pontos em traves em forma de “H”.

O futebol gaélico

Muito tradicional na Irlanda, este esporte é uma mistura do rúgbi, futebol e handebol. Cada equipe também possui 15 jogadores, distribuídos em suas posições da mesma forma que o hurling. As traves também lembram a letra “H”, e os jogadores precisam chegar até o gol adversário utilizando as mãos e os pés.


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