Esta, que é a marca mitológica mais forte, está pronta para ser quebrada! Aliás, já poderia ter sido, na temporada de 2024 ou a atual, caso o acaso não tivesse ceifado a vida do atual recordista mundial, Kevin Kiptum, que em outubro de 2023, na Maratona de Chicago, quebrou a melhor marca do mundo (2:01:09) de posse do gigante Eliud Kipchoge, cravando 2:00:35! Sim, por parcos 36 segundos, Kiptum não entrou para a galeria dos Mitos Eternos do Esporte. Mas infelizmente o destino não lhe deu outra oportunidade para o feito mítico, ceifando sua vida, em fevereiro de 2024, aos 24 anos, num trágico acidente automobilístico. Em sua curta carreira, pode participar de apenas 3 maratonas, e todas as corridas abaixo de 2 horas e 2 minutos, tendo colocado suas 3 marcas entre os 6 melhores tempos do mundo, de todas as épocas!

Infortunadamente, o atletismo mundial, vive uma entressafra forçada, com a aposentadoria de Kipchoge e a morte de Kiptum, vivemos uma escassez de possíveis postulantes à eternidade. Temos, no momento, Sisay Lemma (ETH) e Sebastian Sawe (KEN), como esforçados discípulos, com alguma chance de protagonizarem a quebra das 2 horas numa maratona.

Recordista da maratona, Kelvin Kiptum faleceu em acidente automobilístico (Foto: Kamil Krzaczynski / AFP)

Mas, talvez, o grande nome, o mais credenciado pelos seus resultados e recordes mundiais, e sua eficiência motora (velocidade de deslocamento + economia energética), seja o ugandense Jacob Kiplimo, que colecionava grandes marcas, entre os 3 mil metros em pista e o recorde mundial da meia maratona. Agora, Kiplimo já tem resultados espetaculares também na maratona. Num espaço de 5 meses, este ano, ele estreia em maratonas, em Londres (em abril), com um vice campeonato, e a, incrível para uma estreia, marca de 2:03:37!

Em menos de 5 meses, na sua segunda maratona, vence Chicago de forma categórica, com 2:02:23, superando todos os grandes maratonistas atuais. E Kiplimo quer mais. Quer que 2026 seja o ano perfeito de sua vida: ele quer criar duas chances perfeitas. Sim, duas maratonas escolhidas a dedo. Uma, no primeiro semestre, para correr entre 2:00:30 e 2:01:30, provavelmente em Londres. E a segunda, aí existe uma dúvida atroz. Escolhe Berlim, a cidade dos recordes cadentes, ou Valencia, a cidade mundial das corridas, que está tentando (e quase já conseguindo) roubar a cena de Berlim, como a mais veloz do mundo.

Ah, fico daqui me perguntando, como seria um encontro de Kevin Kiptum e Jacob Kiplimo, numa maratona veloz como Berlim ou Valencia? O destino nos privou deste encontro!

Voltando ao futuro, podemos afirmar: onde Kiplimo escolher, lá será a prova em que a luz vermelha de Recorde Mundial e, sim, novamente, também quebra da barreira das 2 horas numa maratona oficial, irá acender e piscar!

Marca na maratona já foi quebrada?

Mas, calma lá, dirá você, letrado leitor, a quebra das duas horas na maratona já aconteceu, tolo escriba!

E eu, do meu canto, inspiro fundo e, lentamente, expiro idem, e respondo: sim e não!

Sim, em 12 de outubro de 2019, um projeto ousado de uma marca esportiva, iniciado quase 2 anos antes, teria seu grande final, em Viena, na Áustria, onde um seleto grupo de maratonistas e fundistas, escolhidos a dedo, fortemente treinados para um objetivo: criar as condições perfeitas para que um fora de série cumprisse a meta: percorrer a distância da maratona (42.195 metros) em menos de 2 horas! Significa encaixar o ritmo de 2'50 p/km do início ao fim do percurso. Supra-humano? Desumano?

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E assim foi. Quem assistiu à transmissão do evento teve uma aula de fisiologia, exercício extremo e de logística dinâmica, onde tudo funcionou em treinada harmonia. Seja pelo revezamento de grupos de grandes fundistas, que cercavam Kipchoge por todos os lados, criando uma barreira dinâmica para neutralizar ventos de frente, ou laterais. E grupos de ciclistas e corredores incumbidos de hidratar e alimentar Kipchoge durante todo o percurso. Percurso este, escolhido entre centenas de outros, que entregasse particularidades fundamentais: temperatura entre 8 e 12º, linearidade (percurso plano) quase total, proteção de árvores frondosas para frear ventos e rajadas laterais, e que não tivesse que cumprir mais de 5 voltas (o percurso teria que ser multi-voltas). Acompanhado por meio milhão de pares de olhos vienenses, e milhões de outros através do mundo, Kipchoge cumpriu o seu papel de líder de um pelotão destemido, que quilômetro a quilômetro, volta a volta, regia seu grupo como um maestro, orientando com gestos e sorrisos leves, medindo o esforço e buscando soluções para imprevistos. Foi quase um passeio, em altíssima velocidade. Cem metros antes de cruzar a meta, seus companheiros diminuem para que Kipchoge cruze a linha sozinho, seus trabalhos foram feitos com precisão, era hora de deixar mais um mito ser destruído. Eliud Kipchoge finaliza o desafio sorrindo, em 1h:59:40, enfim a DISTÂNCIA da maratona foi cumprida abaixo de 2 horas, mas…

… sempre há um "mas". Kipchoge não quebrou nenhum recorde oficial da maratona, pois era um evento promocional, onde muitas regras foram quebradas. Ainda ficou pendente o verdadeiro mito: a maratona abaixo das 2 horas! O princípio básico é que ele terá que ser batido dentro de uma…. MARATONA, ora! Seguindo todas as regras e normas da federação internacional que rege o atletismo!

Então, amigos que nos acompanham em nossa jornada dupla semanal por aqui, aguardem o segundo semestre de 2026, pois Jacob Kiplimo, e alguns bons coelhos escolhidos um a um, devem escolher entre fins de setembro em Berlim, ou começo de dezembro, em Valencia, onde o Trem das 2 horas (precisamente o dos 119 minutos) deve largar para buscar a eternidade, usando as pernas, pulmões e coração de Jacob Kiplimo. Provavelmente, larguem primeiro em Berlim, e, se algo der errado, devem abandonar (para evitar desgaste excessivo, não prejudicando Valência), continuarem treinando para alinharem novamente em Valência, para o ataque final ao "sub 2" verdadeiro!

Kipchoge, em 2019, mostrou que sim, é possível percorrer os 42.195 metros abaixo de 2 horas. É humano(embora eu ainda discorde que estes moços frequentam desde que nasceram neste nosso planetinha, mas, vá lá) o esforço, mas é preciso estar pronto. É preciso amadurecer o corpo em provas menores, de pista, adquirindo mais velocidade e eficiência nos 5 e 10 mil metros. Para buscarem o asfalto, de preferência militando por um tempinho na meia maratona, tentando corrê-la na casa de 56' a 57'. E aí sim, enfim, buscar a maior de todas, a senhora do asfalto, a MARATONA.

Que venha logo o segundo semestre de 2026, pois nós, órfãos de Eliud Kipchoge, aguardaremos ansiosos o futuro chegar. E mais um mito do esporte ir por terra, e desta quebra surgir mais um imortal do esporte. Quem sabe Jacob Kiplimo, que, aliás, está inscrito no Mundial de Cross Country, sua modalidade de nascença, ganhe a imortalidade das mãos de seu mentor e amigo, ele, Eliud Kipchoge, o dono do "sorriso do lagarto" **

Lauter Nogueira
** obrigado, mais uma vez, João Ubaldo Ribeiro

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