A frase "Aqui é trabalho", que marcou a carreira de Muricy Ramalho nos últimos anos, está aposentado. Um dos principais responsáveis pelo tricampeonato da Copa Libertadores, o treinador santista já criou um novo bordão: "Aqui é muito trabalho".
Mas o que mais falta para um técnico tetracampeão brasileiro? Ao término da partida diante do Peñarol, no Pacaembu, Muricy Ramalho deixou por alguns instantes a euforia do título sul-americano para analisar e traçar o planejamento do Peixe para o restante temporada. Ele quer mais!
Confira a entrevista do campeão Muricy Ramalho:
TÍTULO MERECIDO?
"O Santos mereceu o título. Tem jogadores diferentes e uma diretoria legal, diferente, que acreditou no meu trabalho, e a torcida, é claro. Mas eu mereci esse título. Estava engasgado. Há dez anos ou mais, em todo lugar que eu passei, eu ganhei títulos, mas a cobranca é a mesma: a Libertadores. Todos mereceram, mas eu também mereci isso. Eu estou brigando há muitos anos por isso. Levei azar em algumas decisões, mas nunca abaixei a cabeça. Tomei muita porrada e nunca revidei. Tenho personalidade para responder. Chegou a minha vez e estou muito feliz. De ontem para hoje, não foi fácil. Estou com meus três filhos, que vieram. Eles me cobram em casa, a responsabilidade é muito grande. Minha esposa sozinha em casa sofreu muito, certeza. Não consegui falar com ela e queria mandar um beijo. Dedico o título a você."
RESUMO SOBRE O TEMPO NO SANTOS
"Escolho bem os times em que eu trabalho. Fui para o Rio sob desconfiança, mas consegui ser campeão. Sai do Fluminense e me perguntaram, antes da Libertadores, e eu disse que o Santos era o time mais forte. É o destino sabe, me tirar de um lugar que nem o Fluminense, maravilhoso, e me colocar em outro pra conquistar. Não tem segredo, é confiar no trabalho. Três meses e já ganhei dois títulos. Isso não é trabalho. É muito trabalho"
TÍTULOS...
"Vivo de títulos, se não ganhar me mandam embora. Ganho, ganho, ganho e ganho e me cobram. Parece que nunca ganhei nada. A gente vai ter dificuldades. A gente não pode se enganar. Muito difícil o Brasileirão. As conversas com a diretoria não estão parando. Um time que ganha, que nem o Santos fica valorizado. A diretoria vai fazer o impossível para segurar. Vai ser difícil, no Brasileirão vamos sofrer. Para contratar vai ser difícil, muito caro. Se mantiver a base, com uma peça ou outra, temos chances. O Barcelona é favorito no Mundial, mas eu acredito sempre. Se mantiver a base e colocar uma ou duas peças, temos chances."
LEMBRANÇAS DE OUTRAS LIBERTADORES
"Madrugada foi muito difícil. Durmo muito bem, mas quando eu acordo, é complicado. Vem as imagens de chegar bem perto do título. Fiz uma campanha ótima com o São Paulo, mas não consegui. Aí vêm aqueles rótulos. Algumas pessoas, para justificar os erros, apontam que você está errado. Nunca desisti, nunca abaixei a cabeca, e é isso. Preciso ganhar, se não ganhar, eu sei que estou morto. Dou a minha vida, não durmo, não como, mas consegui. Todos mereceram ganhar, mas, se tinha um cara que merecia, era eu. Lutei para caramba"
VOLTA POR CIMA
"Dedicação, mesma maneira de ser, de lutar. Na Portuguesa Santista e em todos os lugares, lutava igual. Podia voltar para um time grande, mas quando sai do São Paulo, em 97, não gostei muito, prometi muito que ia dar uma volta e voltar para ganhar. Voltei e fui tri brasileiro. E a torcida reconhece isso. Sempre tive vínculo com o clube, morei em Santos, Tenho apartamento no Guarujá, frequento Santos. Meus amigos falavam que eu tinha que trabalhar no Santos. Deus faz a coisa certa, quem faz o certo e trabalha, Deus ajuda"
SAÍDA DO FLUMINENSE E ATRITOS COM A IMPRENSA
"Quando eu sai do Fluminense, alguns de vocês, 50% da imprensa, diziam que eu saí porque a gente nao ia ganhar a Libertadores. Depois de 25 dias que eu dei de prazo, peguei um time que precisava ganhar lá sem Zé Eduardo, Elano e Neymar. Fui pra Assunção sabendo que era difícil. Podia escolher podia começar no Santos no Brasileiro. Deixar a bronca, mas como eu confio, eu sabia. Ali os jogadores acreditaram no meu trabalho. Se você faz a coisa correta, você tem chance de ganhar"
BARCELONA
"Difícil estudar o Barcelona, eles são bons demais"
RÓTULO DE CAIR NO MATA-MATA
"Mata-mata me incomodava porque não era verdade. Ganhei um monte de mata-mata, uma Conmebol no mata-mata. As pessoas tem de falar a verdade. Tinha de falar que eu não ganhei a Libertadores, o que era verdade. O problema era ganhar a Libertadores, mas não significa que eu era ruim. Se criou isso para justificar erros de pessoas e, daí, jogaram em mim que eu não sabia jogar mata-mata. Mas eu sabia que tinha chances"
MUDANÇA DA POSTURA DO TIME
"Conversei com eles. Quando eu vi o Santos jogar, via muita pilha. E o Santos não sabe jogar assim. Neymar, Ganso, Elano, são os jogadores diferenciados. Mas se você como técnico não dá importância aos outros... Você tem alguns jogadores, não o time. E precisávamos disso. Contra o Peñarol, diziam que o Martinuccio não jogou, mas o Adriano que não deixou. O Santos dá espetáculo agora... Antes também, mas os zagueiros ficavam expostos. Tinha que lutar sem a bola, vamos sofrer sempre. Passaram Dorival Júnior, Adilson Batista, Marcelo (Martelotte). Tinha que ter equilíbrio. Peñarol fez o gol por acidente. Não é defesa, é equilíbrio"
BI DA LIBERTADORES
"No Brasil, se falar que quer o bi da Libertadores a responsabilidade vai ser muito grande. O próximo campeonato que eu quero é o próximo. Já estou há um mês preocupado. Faço reuniões com diretores, porque a gente vai sofrer. Não quero participar do Brasileiro só por participar. Quero ser campeão"
GANSO E NEYMAR NO MUNDIAL?
"Não vou falar com o Ganso e o Neymar. Se eu puder orientar em relação a arbitragem, perfeito. Para ajudar a carreira dele. Mas nunca vou interferir em um sonho. Joguei e sei como é. Sou técnico do Santos, mas não vou me meter no contrato deles. Falar que não pode ir pra não sei onde, que tem que ficar até o Mundial... Não é problema meu. Não me meto com jogador. Não falo para jogador vir pro meu time. Claro, quem não gostaria de ter eles até o fim do ano. Se passar da classificação e pegar o Barcelona, com eles já vai ser difícil. Sem eles pior ainda. Mas me meter na carreira deles, nunca"
REFERÊNCIA
"Lembrei do Marinho (pai). Se sou assim, é por ele. Tinha uma coisa que é muito importante, que era ser correto. E isso eu tento passar para os meus filhos. Quando eu to com loucura da Seleção, eles ficaram bravos, já perdi muito no futebol por isso. Isso quem me ensinou foi meu pai. Com toda a ignorância, falta de estudo, isso ele me deu: aprendizado"
PARCELA DE CONTRIBUIÇÃO
"Eu acho que a porcentagem em time bom que nem o Santos é comissão, e não só o técnico, 20 %. Os matemáticos se equivocaram... Falaram 30%, mas é 20%. Em um time que nem esse, com esses caras, você é só 20%. 30% só em um time pior. No caso do Santos, você é só 25%. Era uma situação complicada. Tinha a estreia contra o Cerro e eu não poderia empatar. Esses caras são diferentes"
FOLGA NESTA QUINTA-FEIRA?
"Os caras merecem folga, eu não. Volta na segunda. Arouca está jogando demais. O Zé... Amanhã vai em 300 programas de televisão. Pode ligar. Ele vai estar desde de manhã"
ATUAÇÃO DO ZÉ EDUARDO NA FINAL
"Foi o melhor jogo do Zé no santos. Ele é lutador, não desiste nunca"
ARREPEDIMENTO DE TER RECUSADO A SELEÇÃO?
"Se eu me arrependo do que eu fiz? Não me arrependo porque naquele momento eu tinha gente do meu lado, Celso Barros (presidente da Unimed), entre outros. Se eu tomei essa atitude foi por eles, que foram corretos comigo. Eu tinha que dar exemplo para a torcida e aos jogadores do Fluminense. Acredito muito na coisa correta. Não aceitei, mas fiquei tranquilo. Fomos campeões (Campeonato Brasileiro) no fim do ano. Depois, fui campeão paulista, e conquistei o título mais importante da minha vida, a Libertadores"