Se existe uma linha tênue entre genialidade e o delírio, Aaron Rodgers já a cruzou faz tempo. E parece ter queimado a ponte no caminho de volta.
O agora Quarterback dos Steelers, ex-Green Bay Packers e New York Jets, é indiscutivelmente um dos maiores talentos que a NFL já viu. E não vou mentir: foi quem me fez acompanhar a NFL em meados de 2011. Um jogador 4x MVP de uma liga onde menos de 2% dos jogadores universitários de futebol americano conseguem entrar. Além disso, um Super Bowl conquistado no currículo, precisão cirúrgica, leitura de jogo absurda e movimentação que, em seu auge, parecia uma dança. Mas não é de hoje que sua atuação mais comentada não tem sido nos campos. Tem sido nos estúdios de podcast, nas coletivas recheadas de ironia, nos papos místicos e nas teorias dignas de episódio do seriado “The Office”.
Rodgers já foi o garoto-prodígio que sucedeu Brett Favre sem tremer. Hoje, é o sujeito que insinua que a mídia mente sobre tragédias como o 11 de setembro, defende ivermectina em rede nacional e entra em guerra com jornalistas por não querer ser “rotulado”. A dúvida que fica é: em que momento ele achou que virou um filósofo iluminado?
Podemos começar falando da primeira polêmica que surgiu em 2016, quando seu irmão, Jordan Rodgers, afirmou em um reality, "The Bachelorette" que o Quarterback da NFL se afastou da família e não falava com nenhum membro desta há anos. Aaron Rodgers nunca comentou muito publicamente, mas já disse em entrevista que não estava de acordo com a doutrina religiosa que todos por lá seguiam. O assunto foi colocado debaixo do tapete.
Porém, as coisas começaram a desandar quando, em 2021, Aaron Rodgers disse estar “imunizado” contra a COVID-19. A única forma oficial de imunização conhecida - e que a NFL endossou seus jogadores - era a vacinação. Para o QB, não. A fala dele, na prática, significava: não tomei vacina, mas vou enrolar vocês com palavras bonitas. O problema não foi só a escolha pessoal (a NFL permitia jogadores não vacinados com protocolos específicos), e sim a manipulação da narrativa. Ele enganou a franquia, o público e a imprensa.
Depois disso, vieram as entrevistas com o Joe Rogan, onde o Quarterback virou praticamente garoto-propaganda da pseudociência, falando de ivermectina, tratamentos alternativos e desafiando a “cultura do cancelamento” como se fosse um mártir do livre pensamento.
Isso sem falar nos rituais que Aaron Rodgers disse participar para fortalecer sua espiritualidade. Claro que não tenho nada contra, mas um deles chama a atenção: estar por uma semana em uma cabana no meio do mato, sem luz, meditando. É claro que isso virou meme nas redes sociais.
Em 2024, a situação escalou. Durante uma entrevista ao The Pat McAfee Show, Aaron Rodgers insinuou que o colunista Jimmy Kimmel poderia estar envolvido com a “Lista de Epstein”. O apresentador da ABC respondeu ameaçando o QB de processo. Rodgers recuou, mas o estrago já estava feito.
E como se não bastasse, recentemente, ele deixou no ar dúvidas sobre o atentado de 11 de setembro, insinuando que "há perguntas que nunca foram respondidas". Essa fala gerou indignação até entre jogadores e jornalistas tradicionalmente simpáticos a ele.
Podemos, ainda, citar o momento em que viu um OVNI, em 2006. Ou o caso de suas ex-namoradas o chamarem de "Tóxico" como, por exemplo, Shailene Woodley.
Aaron Rodgers chegou a polemizar, ainda, durante a corrida presidencial de Donald Trump para o comando dos Estados Unidos. O jogador se posicionou e, claro, dividiu opiniões.
Ainda Quarterback da NFL, Aaron Rodgers parece mais preocupado em virar trend topic do que em liderar um ataque, nesses últimos anos. Ele sempre foi excêntrico. O famoso jogador "fora da curva". Mas agora parece que abraçou de vez o papel de antagonista da imprensa, da ciência, do bom senso. A cada aparição pública, parece mais distante do líder admirado que ergueu o Lombardi Trophy em 2011.
O pior? Ele sabe disso. E gosta.
O futebol americano é um jogo coletivo, mas a narrativa da NFL sempre valorizou seus Quarterbacks como ícones culturais. Aaron Rodgers teve tudo para ser um deles. E talvez ainda seja, mas por razões muito diferentes das que ele gostaria.
Hoje, ele é mais lembrado por suas frases do que por seus passes. E no fim das contas, isso pode ser o maior desperdício de talento da era moderna da liga. Claro que não por prêmios individuais, até porque quem tem 4 MVPs e diversos Pro Bowls ganha um passe quase que direto para o Hall da Fama. Mas pela possibilidade de ter conquistado mais de um Super Bowl na carreira e se juntar aos grandes do Olimpo da NFL.
Aaron Rodgers vai se aposentar após a temporada 2025, como ele mesmo já disse. Mas seu legado já está manchado por escolhas que extrapolam o campo. O problema não é ele pensar diferente. O problema é que, ao contrário de quando tinha a bola nas mãos, fora do campo ele parece preferir lançar polêmicas em vez de verdades.
E nesse jogo em que já foi um gênio, está prestes a se aposentar de forma quase que anônima devido ao caos fora de campo.