Dia 28/10/2015
06:28
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O Campeonato Amazonense terminou no último dia 4 com o modesto Penarol bicampeão e mais um fiasco de bilheteria. Na sede amazônica da Copa de 2014, o Estadual agoniza. O número de torcedores dos 80 jogos da competição somados é 37.971. Não encheria o novo estádio que está sendo construído em Manaus para o Mundial, com capacidade de 47 mil lugares.

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É preciso ser apaixonado para acompanhar o Estadual. Os nove clubes que disputaram o campeonato estão praticamente quebrados, sem jogadores de destaque. As partidas têm baixo índice técnico e, com isso, não atraem público. A média este ano foi de 447 pagantes. Em um jogo do segundo turno, havia apenas 12 corajosas testemunhas. Devido às dificuldades financeiras, em 2011 o Amazonas terá somente um representante do Brasileirão (na série D). Em Manaus sequer há estádio. O antigo Vivaldão foi destruído para a construção de uma arena. Os jogos são no campo emprestado do Sesi.

– É triste ver uma cidade com quase 2 milhões de habitantes deixar o futebol acabar – disse o encanador industrial Antônio Dourado, 47 anos, torcedor do Nacional que leva o filho Pedro, 12 anos, para o campo.

No dia 21 de maio, em Manaus, o LANCE! acompanhou a semifinal entre São Raimundo e Nacional, maior clássico local. Público: 1.181 pagantes. A partida entre os dois grandes do Amazonas já arrastou 40 mil torcedores, já foi disputa na série B do Brasileirão. O último confronto, mesmo decisivo, foi apenas uma caricatura do passado. Nada de filas para entrar. Nada de congestionamento na chegada. Com cadeiras de sobra, foi fácil achar um lugar sob a marquise para fugir do sol. O jogo rolava e uma criança dormia traquilamente nos braços da mãe. O pipoqueiro, desanimado, torcia pela chegada do intervalo. Atrás do gol, garotos jogavam bola despreocupados com o campo principal.

– São os mesmos de sempre que estão aqui. Já fui em jogo com 60 pagantes – lamentou o comerciante Rubens Moraes, 31 anos, da Furacão Azul, do São Raimundo.

Onde vai parar o Amazonense?


Jogadores ganham mais na várzea

O  Amazonense está tão desprestigiado nos últimos anos que as promessas locais muitas vezes preferem abrir mão do Estadual para jogar o Peladão, um campeonato amador com enorme sucesso em Manaus. Os times do Peladão costumam a pagar prêmios melhores por partida jogada. E em dia.

– Tive dois ou três convites do profissional. Mas esse estadual está quebrado – disse Ricardo Oliveira Babilônia, o Mutante, eleito o último craque do Peladão.  

Campeonato em números
- 80 jogos foram disputados em dois turnos por nove times.
- 244 gols foram marcados. O melhor ataque foi o do Fast/Ulbra, com 33 gols.
- 37.971 torcedores pagaram ingresso nos 80 jogos somados
- 474 pagantes é média de público por jogo do campeonato
- 12 pagantes foi o menor público da competição. Foi no jogo entre Rio Negro e Penarol.
- 2.869 pessoas foi o maior público. Foi na final do primeiro turno entre Penarol e  Nacional, em Itacoatiara.
- 339 mil reais foi a renda de todos os jogos. Não pagaria um mês de despesas na nova arena.


Arena poderá atrair torcida, diz governo

O governo do Amazonas, responsável por erguer a Arena da Amazônia, acredita que estádio construído para a Copa poderá atrair torcedores. A obra, com 47 mil lugares, custará R$ 500 milhões, mais R$ 5 milhões ao ano para manutenção.
 
– Com o estádio novo e moderno, a torcida terá mais inspiração – disse Miguel Capobiango, coordenador da Unidade Gestora da Copa.

Contra o argumento de que o novo estádio irá virar um elefante branco, ele lembra que a Arena não será mantida somente pelo futebol. O local poderá receber shows e eventos executivos em salas especiais. Capobiango, admite, no entanto, que é preciso aumentar a média de público do Estadual.

Dirigentes pensam diferente. Clamam por auxílio público para o futebol do Amazonas crescer.

– Este ano o governador prometeu R$ 90 mil para cada time. Depois reduziu para R$ 25 mil, mas ainda não pagou – protestou Cláudio Nobre, vice-presidente do Fast/Ulbra, um dos semifinalistas.

 

Desinteresse: Garotos jogam bola durante o clássico entre Nacional e São Raimundo



Equipe do interior vira sensação

É em Itacoatiara, a 300 quilômetros de Manaus, que o Amazonense ainda consegue ser atraente. Nos jogos do Penarol (foto ao lado), o estádio local costuma ficar cheio em confrontos importantes. Atual bicampeão, o clube foi fundado em 1947 inspirado no uruguaio Peñarol. A média de público é de cerca de 900 pagantes. A presença da torcida no estádio virou orgulho estadual.

— Aqui, as pessoas se envolvem muito com o time. Estão, literalmente, vestindo a camiseta — contou Ila Rabelo, presidente do clube.

No quebrado futebol amazonense, o Penarol virou sinônimo de organização. Conquistou fama de bom pagador, algo difícil entre os times profissionais. O gasto mensal do time — incluindo o centro de treinamento em uma chácara e a folha de pagamento –  é de R$ 90 mil. Valor baixo para os padrões do futebol no centro do país, mas uma fortuna para a realidade local. O sucesso só é possível com o apoio da prefeitura de Itacoatiara, que desembolsa mensalmente cerca de metade dos gastos.

O clube agora está preocupado com o caixa para disputar a Série D do Brasileirão. O governo estadual novamente prometeu ajudar com dinheiro, mas o valor ainda não foi definido.



Penarol, atual bicampeão, é o clube que mais atrai torcedores (Foto: Divulgação)

Jardel foi plano de marketing

Inspirado em grandes clubes brasileiros que contrataram craques, o Rio Negro também criou seu plano de marketing no início do Amazonense. Contratou Jardel,
37 anos, ídolo no Grêmio nos anos 90 e um dos maiores artilheiros do futebol português. Barrigudo, Jardel chegou em Manaus com pompa. Desfilou pela cidade no caminhão dos bombeiros e ficou hospedado no melhor hotel. Ele receberia casa, comida, carro, motorista particular e R$ 100 mil por mês, valor fora da realidade local, onde os salários dificilmente passam de R$ 3 mil.

O atacante ficou quase dois meses, treinou, deu entrevistas, mas nunca jogou. Foi embora reclamando de não recebimento do salário, motivo de piada entre os torcedores de todos os clubes. Fundado em 1913, o Rio Negro é o segundo clube mais antigo do Amazonas. É dono de 18 títulos estaduais e sempre teve uma torcida fiel.


Bate-Bola
Ivan Guimarães - Diretor de competições da Federação Amazonense de Futebol

Por que o Campeonato Amazonense está tão desprestigiado?
O primeiro problema é cultural. Os amazonenses torcem mais para os times do Rio ou São Paulo. Infelizmente, falta um pouco de amor próprio.

Mas o desinteresse não é reflexo da baixa qualidade dos times?
Também é, claro. Este ano até melhorou um pouco, mas os times estão desestruturados. Quando tem um ou dois times bons disputando competições nacionais, eles acabam puxando os outros. Aconteceu isso entre 1998 e 2006, quando o São Raimundo disputava série B do Brasileirão.

O que pode ser feito para que uma sede de Copa não fique nessa situação?
Precisamos encontrar uma maneira de unir clubes, federação e governo para reverter essa situação. Um Estado com a importância do Amazonas precisa ter um campeonato melhor. Interesse do público há.

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