Dia 27/10/2015
20:08
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A família é o ponto de apoio do ser humano. E foi na família, mais precisamente no filho Antônio, de 4 anos, que o ponteiro Dante, da Seleção Brasileira masculina de vôlei, pensou quando teve de deixar a quadra no segundo set da decisão olímpica, em Londres, contra a Rússia, por conta de dores no joelho esquerdo. E foram os ensinamentos aprendidos com o filho que fizeram o experiente jogador ir para o sacrifício no tie break. O ouro não veio, mas Dante não tem o sentimento de culpa por não ter tentado.

Após a Olimpíada de Pequim-2008, o ponteiro ficou afastado da Seleção por dois anos para cuidar de Antônio. Ao lado da mulher Sibele e da filha Giovanna, hoje com 8 anos, ele acompanhou o drama do filho, que sofria com um problema no coração. Uma cirurgia precisou ser feita antes mesmo de o bebê completar um mês de vida.

Após vencer essa batalha, Dante enfrentou outra: Antônio sofreu paralisia cerebral. Hoje, o ponteiro comemora pois seu filho está bem de saúde. Morando no Rio há um ano, quando veio jogar no RJX, o jogador aguarda o resultado dos exames realizados nos joelhos para saber se vai precisar operar. Ele sofre com uma dor crônica no joelho direito há muito tempo, fruto de uma artrose na articulação patelar, além de uma calcificação no tendão patelar.

Nesta conversa com o LANCENET!, Dante conta como a doença do filho mudou o seu modo de pensar a vida e o ajudou a superar as dores no joelho nos Jogos de Londres.

Na final, você foi para o seu limite físico?
Quando saí, não estava mais aguentando. Meu joelho não me permitia fazer certos movimentos. Mas não quis transmitir o problema para ninguém. Se você mostra fraqueza, o bicho pega. Eu travava os dentes para jogar.

O Bernardinho fala com o Fiapo (fisioterapeuta) “prepara ele” no tie break.
O Fiapo perguntou: "E aí?" Eu pedi mais dois remedinhos e fui para o pau. Uma final olímpica merece qualquer tipo de sacrifício. Não conseguia raciocinar direito por causa da dor, mas estou tranquilo. Eu me sacrifiquei pela Seleção.

Quando você voltou, pensou que a lesão poderia se agravar?
Hora nenhuma pensei nisso. E nem poderia pois assim não jogaria. As consequências eu deixei para pensar depois da partida.

E quando esfriou, foi uma noite complicada para dormir?
Doía, não vou mentir. À noite nem tanto pois ainda estava sob efeito dos remédios. Mas no dia seguinte estava muito dolorido. Hoje, porém, não estou tomando nada.

No que você pensou naquele momento? No filho, na família?
Claro! Meu maior exemplo é o Antônio, que lutou pela vida e hoje graças a Deus está ótimo. Quando saí, me foquei nele. A dor no joelho não é nada perto do que meu filho passou. Tenho um guerreiro em casa e busquei força através dele. Se eu não tivesse jogado o tie break acho que hoje estaria me culpando.

O Antônio mudou muito a sua forma de ver e analisar a vida?
Não só a vida e quem acompanhou o caso sabe o quanto foi difícil. Antes eu pegava uma gripe e já reclamava, ficava assustado. Parecia que o mundo ia acabar. Aprendi a não ficar reclamando das pequenas coisas e passei a dar valor a isso. O Antônio veio e mostrou o quanto vale uma vida. Foi um aprendizado para todos nós. Ele mudou a minha vida. É um guerreiro por natureza.

Você estava jogando na Grécia quando o Antônio nasceu. Foi o pior momento da sua vida por conta do problema de saúde dele?
Foi porque eu não sabia o motivo da cirurgia. A operação foi para corrirgir um problema no coração e isso foi curado. Mas depois teve a paralisia cerebral. No Brasil, ele entrou num aparelho, totalmente forte. E ali, em três vezes, correu risco de morrer. Muita gente fala que o índice de mortalidade nessa fase é alto. Mas ele resistiu às três vezes.

Dante: Não vi o jogo contra a Rússia ainda e nem quero ver

E a Giovanna? Parece que a criança mais velha vê uma situação como essa de forma diferente.
A Giovanna é uma filha maravilhosa, uma protetora para o Antônio. Ela sabe tudo o que está se passando com o irmão. Sabe as horas de tomar o remédio, os nomes das terapeutas. E ela não reclama da vida. Outro dia caiu da bicicleta, bateu a boca, que sangrou. Ela começou a chorar, mas logo parou ao lembrar do que o irmão passou.

E ela gosta de vôlei?
Ela fala que é a mascote do RJX. Passou a gostar de vôlei quando viemos para o Rio. Vai sempre nos treinos comigo, pega bolas, o pessoal brinca com ela. A Giovanna quer ir a jogo, entende o esporte e fica brava comigo no telefone dizendo o que eu deveria ter feito numa partida, me dá conselhos.

Como será para o pai Dante se a filha virar jogadora de vôlei?
Por incrível que pareça, ela diz que não quer. Ela quer ser cantora. Mas ainda é cedo. E não vou fazer pressão. Vou deixá-la tomar a decisão. Mas, se for jogadora, vou ficar contente e darei alguns conselhos.

Voltando ao assunto do físico, por este ser um ciclo especial, da Rio-2016, dá para abrir mão de alguma coisa para você chegar bem, sem lesões na Olimpíada?
Em 2013, eu pretendo dar uma descansada da Seleção. Quero estar inteiro nos três últimos anos. Se o Bernardinho continuar como técnico da Seleção, vou conversar com ele sobre isso, ver o que acha.

Essa foi sua quarta Olimpíada e você jogou no sacrifício, como o Nalbert em Atenas-2004 e o Giba agora. Isso serviu de lição?
É isso que vamos conversar. Fui para o sacrifício em 2012. Quem me conhece sabe que não arrego. Mas quero estar 100% em 2016. Porém, se tiver de ir para o sacrifício novamente, encaro sem problema.

O que você faz quando não está no vôlei? Sei que você tem negócios na sua fazenda em Itumbiara em parceria com os jogadores de võlei João Paulo Bravo e Marlon.
Fico com a família, gosto de ir a praia, passear com o Antônio e a Giovanna, ir ao cinema. A paixão pelo gado vem desde o meu bisavô. Minha família sempre mexeu com gado de corte, mas eu prefiro o Nelore. Há cinco anos eu criei o Nelore D18 e entrei nesse mercado. O João adorava fazenda e virou meu sócio em fevereiro de 2011. O Marlon entrou cinco meses depois.

E como funciona esse negócio envolvendo a raça Nelore?
O que fazemos é o melhoramento genético da raça. E o que é isso? Você tem de extrair a melhor qualidade do animal. É um ciclo. A filha tem de ser sempre melhor do que a mãe. E também temos animais para a disputa de campeonatos. E como se ganha dinheiro nisso? Quanto mais posições você ganha com seu animal, mais valorizado ele fica. Ainda estamos num patamar modesto, mas pretendemos chegar nos caras grandes. Além de ser um negócio, é uma terapia maravilhosa.

Tem nomes engraçados?
Não, pois são letras. Mas agora que você falou, vou falar com meu gerente. Quando nascer um bicho nervoso, esquentado, vou colocar Bernardinho (risos).

Você consegue acompanhar de perto os negócios?
Só vou lá nas férias, mas acompanho tudo pela TV, assisto leilões no canal Rural e no site Programa Leilões. Nas viagens com a Seleção, eu fico no quarto vendo isso e o Rodrigão, que divide quarto comigo há 12 anos, fica jogando pôquer o dia inteiro.

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