Imagem arranhada? Especialistas opinam sobre fato de patrocinadores se ‘afastarem’ da Olimpíada

Temor de associação da marca a evento em meio à escalada da pandemia de Covid-10, impasses contratuais... LANCE! traz o que está em jogo nesta discussão

Tokyo 2020 - Estádio Olímpico
Japão teve terceiro dia seguido de recorde de infectados por Covid-19. Coincidentemente, Jogos Olímpicos ocorrem neste período em Tóquio(Foto: Divulgação/Tokyo2020)

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A preocupação com a imagem vem rondando os bastidores dos Jogos Olímpicos de Tóquio. Empresas como Toyoya e Panasonic, além de Fujitsu e Nippon Life omitiram campanhas publicitárias e, algumas delas, sequer enviaram representantes à cerimônia de abertura de um evento organizado em meio a uma nova escalada da pandemia do novo coronavírus.

De acordo com levantamento da "Our World In Data", foram registrados 9.675 casos de Covid-19 nas últimas 24 horas, no terceiro dia seguinte no qual foi ultrapassado o recorde de infectados. Deste número, 3.865 infecções ocorreram em Tóquio, cidade-sede dos Jogos Olímpicos. O Comitê Olímpico Internacional (COI) confirmou na quinta-feira (29) novos casos de Covid-19, totalizando 200 casos na competição. Porém, frisou que os Jogos não estão afetando o sistema de saúde japonês.

Sócio da Sports Value, Amir Somoggi detalha ao LANCE! que o mercado é muito sensível à imagem de um evento ao qual sua marca está associada.

- É semelhante ao que aconteceu na Copa América no Brasil, que se tornou o anti-marketing esportivo. Você passa anos investindo em uma propriedade como os Jogos Olímpicos, que não te dão propriedade na arena. É um evento no qual vale muito mais conectar sua marca com os valores positivos do esporte e fazer ações promocionais de ativação. Só que neste episódio, fica muito claro que as empresas são muito sensíveis ao que acontece no momento. Por mais que uma Toyota queira ativar a marca, as pesquisas indicam que vai pegar mal perante a população, que não pode acompanhar os Jogos. Mas como ativar promoções se ninguém pode ir a ginásios e estádios? - declarou.

Executivo com experiência profissional em diretoria comercial, de marketing e novos negócios do esporte, Renê Salviano apontou que o episódio da Olimpíada expõe um dilema para os patrocinadores.

- Entendo que existe uma preocupação muito grande das marcas com a opinião dos consumidores, porém são contratos feitos há muito tempo e acredito que não existia sequer sinal de pandemia. Geralmente existe um planejamento comercial superior a quatro anos para eventos deste porte - e, em seguida, destacou:

- São decisões difíceis de serem tomadas e que geram prejuízos em qualquer tomada de decisão, seja ela em abortar a participação ou em tomar uma decisão equivocada, dependendo da marca e ~do público consumidor - completou.

Criador da agência de marketing esportivo HeatMap, Renê Salviano frisou que as redes sociais são levadas em conta.

- Sem dúvida, e faz sentido esta preocupação. Estamos vivendo momentos de grandes crises causadas por fatos ou comentários que acabam dividindo opiniões. Alguns casos que misturam com fatos políticos e outras frentes que acabam tomando proporções até muito maiores - disse.

QUESTÕES CONTRATUAIS

Tóquio-2020
Rescisões contratuais são mais complexas em eventos de grande porte (Reprodução)

Uma eventual rescisão contratual nos Jogos Olímpicos pode acarretar até em uma dolorosa consequência financeira. Renê Salviano detalhou que há muito em jogo.

- Devem ser analisadas as cláusulas de cada contrato antes de uma rescisão. Eventos deste porte são ativados anos antes. Com certeza, existe um valor de prejuízo considerável em caso de rescisão - pontuou.

Ex-advogado do Comitê Olímpico Brasileiro (COB), Pedro Henrique Mendonça detalhou como são feitas as negociações para Jogos Olímpicos. 

- Em regra, os contratos de patrocínio se dão em dois níveis distintos. Há os patrocinadores mundiais, cujos contratos são celebrados pelo Comitê Olímpico Internacional e não necessariamente se vinculam a uma única edição dos Jogos. Além disto, há os patrocinadores locais, com contratos firmados pelo comitê organizador local e vinculados àquela edição específica dos Jogos Olímpicos. Esses patrocínios são regidos por instrumentos contratuais próprios, que definem os direitos e deveres do patrocinador e do patrocinado - disse.

O consultor da CSMV Advogados destacou que a não-ativação das marcas, como vem acontecendo com empresas como a Toyota e a Panasonic, pode existir em um contrato.

- A princípio, é possível que as partes envolvidas em um contrato de patrocínio estipulem, no instrumento contratual, cláusulas que permitam ao patrocinador decidir pela não exposição de sua marca em determinado evento ou em circunstâncias específicas - afirmou.

Mendonça também enumerou quais são os caminhos para os Comitês se resguardarem em eventuais situações de crise.

- Juridicamente, os contratos são das mais importantes ferramentas nesse sentido, uma vez que podem estipular condições específicas para essas situações excepcionais, conferindo maior segurança jurídica aos contratantes. Por isso, é essencial ter muita atenção aos detalhes na celebração de um contrato, contando com uma assessoria jurídica especializada que possa orientar quanto aos riscos da contratação e apresentar possíveis soluções para eliminá-los ou, ao menos, reduzi-los - declarou.

MARCAS PODEM VIRAR O JOGO? 

Anéis Olímpicos
Ajuda no combate à Covid-19 e ativações para fãs: conceitos vistos por especialistas em marketing (AFP

O zelo dos patrocinadores abre espaço também para novas perspectivas em torno da Olimpíada. Renê Salviano abordou uma ação que seria bem quista em meio à pandemia de Covid-19. 

- Imagine que as verbas que seriam gastas em grandes ativações com público poderiam ser revertidas para proteger a saúde de todos os atletas, treinadores e todo o staff que trabalham neste evento. Quando digo proteger estou falando do pré-evento, dos dias de evento e de toda a desmontagem e volta dos profissionais que fizeram tudo acontecer até às suas casas e - frisou:

- Isto sim seria uma ação realmente pensada no ser humano, e que poderia fazer a diferença nos diversos debates que tem acontecido mundo afora - complementou.

Amir Somoggi, por sua vez, volta suas atenções para a forma como as marcas podem dar um alento aos apaixonados por esporte.  

- O ideal na experiência do fã. Essas empresas têm acesso a vários conteúdos que ninguém tem. Como os espectadores estão em casa, o interessante é oferecer conteúdos para eles. Se as empresas não vão ativar suas marcas na Olimpíada devido ao temor da imagem ficar arranhada, façam com que as pessoas se sintam felizes! É uma promoção de maneira lúdica, inteligente. Além disto, é benéfico para o torcedor - e ressaltou:

- Nessa época de crise, seria interessante criar sistematicamente uma geração de conteúdo para a Olimpíada. A Budweiser faz isso com a NBA muito bem!  Os patrocinadores podiam investir muito em conteúdos exclusivos, entrevistas, histórias dos Jogos Olímpicos. Enfim, fazerem canais de comunicação com o torcedor, aumentando a visibilidade da marca de maneira educada, sem soar oportunista  - completou. 


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