O caminho até o Vale da Morte

Alexandre Castello Branco está na reta final de seus treinos para enfrentar temperaturas extremas na Badwater, nos Estados Unidos

Alexandre Castello Branco treina na sauna para a Badwater. (Foto de Beto Noval)
Alexandre Castello Branco treina em uma sauna para se adaptar ao clima da Badwater. (Foto de Beto Noval)

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Por Alexandre Castello Branco. Já estamos em junho. Parece que foi ontem que recebi a notícia que havia sido selecionado para competir na corrida mais difícil do mundo, a Badwater. Na verdade, já se passaram pouco mais de quatro meses e agora falta apenas um mês para esse sonho se tornar realidade. Como passou rápido e, ao mesmo tempo, como foi longo e cansativo.

Os últimos meses foram uma montanha russa de sentimentos. No lado profissional, fui demitido de um emprego de quase 20 anos sem qualquer explicação sobre o motivo. Foi duro. Ao mesmo tempo, logo em seguida embarquei num projeto do medalhista olímpico de judô Flávio Canto, que promove o esporte na formação de crianças e jovens nas escolas, algo que sempre acreditei. Se tem uma coisa que as ultramaratonas me ensinaram foi que sempre teremos altos e baixos e só cabe a gente decidir como vamos encará-los.

No lado esportivo, comecei o treinamento extremamente animado e motivado. Planejamento feito, nutricionista, trabalho de força. Tudo. Nas últimas semanas, encaixei também o famoso treinamento de calor dentro da sauna seca. Aos poucos, estou aumentando o tempo que permaneço nela fazendo exercícios e assim vou me acostumando com o calor que vou enfrentar lá no Vale da Morte em julho. Treinar na sauna, numa temperatura de 70ºC, é mais difícil que parece, pelo que percebi. É engraçado o olhar curioso de quem passa e vê um maluco subindo os degraus da sauna, correndo no mesmo lugar, fazendo abdominal. Se eu estivesse no lugar deles também acharia loucura.

Ao mesmo tempo, precisei também definir rápido a minha equipe de apoio e fazer todas as reservas de hotel, aluguel de carro, comprar passagens (ui!) e ver cada detalhe da prova. A logística da Badwater é algo surreal. Por ser uma prova nos Estados Unidos, num lugar inóspito, no meio do deserto, e essa época ser altíssima temporada por lá, tudo é mais caro e mais difícil. Cada atleta precisa obrigatoriamente ter no mínimo duas pessoas na equipe de apoio, utilizando apenas um carro. E esse carro não pode ser qualquer um, só alguns modelos são permitidos por causa do tamanho da estrada que a prova acontece. Enfim, a planilha de itens e coisas para resolver até lá é extensa.

Como equipe de apoio eu tinha duas opções. Levar aqui do Brasil meus amigos que já fizeram apoio comigo antes e conhecem como funciona o esquema ou buscar alguém que já more nos Estados Unidos e queira fazer parte. A prova é tão concorrida e desejada que existe uma comunidade de pessoas, corredores ou não, que se colocam à disposição para fazer apoio para “estranhos”, apenas para vivenciar a Badwater. Escolhi a primeira opção, por achar que apesar dos custos e tudo mais, eu prefiro ter comigo pessoas que me conhecem bem e que quando eu estiver no fundo do poço (e certamente chegarei lá!), vão me ajudar a voltar pro jogo, além de me proporcionar boas risadas.

Meu Crew Chief (chefe de equipe) será o Beto Noval, fotógrafo e amigo/irmão desde sempre. Ele já foi da minha equipe de apoio duas vezes em provas de 217km e conhece bem como funciona.

O Marcos Vinicius (Vinão), meu amigo desde sempre também, que corre e já fez um Ironman no Havaí, será pacer pela primeira vez e acho que ainda não tem ideia do perrengue que vai enfrentar lá. Por enquanto está achando tudo ótimo, mas espera só entrar na segunda madrugada sem dormir para gente ver se vai continuar assim.

Ahahah E o terceiro e último integrante da equipe será o Gustavo Castello Branco (Gusta), meu primo, que me conhece desde 1 ano de idade, também corre, e está mega empolgado em ser pacer pela primeira vez.

Além disso, a Joyce, minha esposa, Mike e Milton, amigos que já foram meus pacers algumas vezes, serão minha “central de controle” no Brasil, medindo meu progresso, distribuindo as informações da prova para todos e compartilhando com a equipe atual toda experiência que já têm em competições e apoios no passado.

Sei que é um risco contar com dois estreantes numa prova como essa, mas acho que quando estiver precisando de uma ajuda para sair de um momento complicado da corrida, vou preferir ter rostos conhecidos por perto, mesmo sem toda a experiência necessária.

No mais, a verdade é que já estou um pouco de saco cheio de treinar tanto e me manter disciplinado por tanto tempo. Já são quatro meses treinando seis vezes por semana, com períodos de pico com mais de 100km semanais, musculação pesada, alimentação controlada, e muito mais. Apesar de ainda ter um volume e treinamento para fazer nesse último mês, sinto que já estou praticamente pronto, só precisando de ajustes finais.

Estou me cuidando e preocupado também com o aumento dos casos de Covid-19, que pode ser decisivo num momento como esse, caso eu ou alguém da minha equipe teste positivo.

Enfim, reta final. Tenho pensado que o pior já passou e que agora é só afinar as coisas para viajar tranquilo, com a sensação que fiz tudo que podia ser feito. Dia 5 de julho embarco para os Estados Unidos e a partir daí a aventura começa de fato.

Nunca achei que diria isso, mas nunca esperei tanto para ir para um lugar chamado Vale da Morte, com temperaturas de até 55º. Em breve, finalmente o bicho vai pegar!

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