O São Paulo derrotou o Atlético-MG por 2 a 0 no domingo. Mas um outro jogo, distante mais de 10 quilômetros do Morumbi, terminou sem vencedores: na Praça da República, no centro da capital paulista, duas facções da Independente, principal torcida Tricolor se enfrentaram com paus, pedras, barras de ferro e muita pancadaria numa briga pelo poder da organizada.
Foi a mesma história de sempre: o conflito foi marcado pelas redes sociais - desta vez através de grupos de Facebook e Whatsapp. E a polícia chegou quando a batalha já havia começado fazendo um bom número de feridos e levando pânico a quem passava e aos frequentadores de uma feira onde barracas foram transformadas em escudo de proteção contra os vândalos. Bombas de efeito moral e balas de borracha chegaram a ser usadas para controlar os cerca de 100 baderneiros, de lado a lado.
Ha mais de três anos, uma decisão das autoridades de segurança pública do Estado de São Paulo estabeleceu que os clássicos estaduais – mesmo quando disputados em competições nacionais, como o Brasileirão e a Copa do Brasil – deveriam ter torcida única nos estádios. A medida foi uma resposta a brigas entre as organizadas Mancha Alviverde, do Palmeiras, e Gaviões da Fiel, do Corinthians, que transformaram em praça de guerra vários pontos da cidade, em abril de 2016, deixando como saldo várias pessoas feridas e um morto.
No início desse ano, chegou-se a cogitar a revogação da medida, que acabou mantida, entretanto, por pressão do Ministério Público Estadual, apesar da posição contrária quase unânime dos clubes. Relatórios apresentados pela Polícia Militar também sustentaram a manutenção da torcida única, com indicação de uma queda de 21 para 12 dos conflitos entre rivais, comparando-se três anos anteriores e posteriores à decisão.
Não é uma vitória, muito ao contrário. A pancadaria deste fim de semana entre são-paulinos, no coração da capital e antes de um jogo contra um adversário que sequer tem sua torcida no estado, mostra o quanto a proibição é frágil para combater a violência em torno do futebol. Não foi o primeiro caso de conflitos entre facções organizadas de um mesmo clube – já houve cenas de barbárie entre palmeirenses da Mancha e da TUP, entre corintianos e entre santistas, sem falar no assassinato de um dos fundadores da principal torcida do Verdão, em 2017, que revestiu-se de suspeitas de uma disputa interna, com a expulsão de 20 sócios, inclusive dois ex-presidentes.
O policial militar que comandou a operação de repressão aos bárbaros da Independente admitiu que as provocações e os desentendimentos dentro da facção não são de hoje e que o conflito de domingo foi o ponto culminante dessa disputa. Ora, se a polícia sabia disso deveria ter agido antes, identificando os potenciais brigões, convocando-os e responsabilizando-os antes de que pudessem agir, aí sim, ameaçando a ordem pública e a segurança de quem nada tem a ver com isso
Este o X da questão. O que as autoridades paulistas demonstram é que continuam incapazes de enfrentar o problema como deve ser enfrentado: com inteligência que identifique e previna esses conflitos, seja entre torcedores rivais ou de um mesmo time, antes de que eles aconteçam e façam vítimas. Algo que o simples monitoramento de redes sociais, além de outras técnicas de investigação, é capaz de proporcionar sem que seja preciso cercear o direito do verdadeiro torcedor, do cidadão de bem, assistir o seu time jogar no estádio onde estiver.
Ao esconder-se atrás de estatísticas de pseudo melhorias nos índices de violência, perpetuando a torcida única – e isso já foi dito e repetido inúmeras vezes – o Estado assume na verdade a falência da segurança de grandes eventos em São Paulo.
Dia 28/10/2019 13:11
Atualizado em 29/10/2019 07:10