Ex-gerente abre o jogo sobre saída: ‘Falava 90% do tempo sobre dinheiro’


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Ex-gerente de futebol do Botafogo, Sidnei Loureiro abriu o jogo e, em entrevista ao LANCE!Net, nesta sexta-feira, falou pela primeira vez sobre o que o motivou a deixar o clube. A grave crise financeira pesou bastante e o desgaste diante dos jogadores, após promessas não cumpridas por pagamento dos atrasados no mês passado, foi a gota d'água.

- O que mais motivou foi a crise financeira e o desgaste dos problemas no dia a dia. Não é fácil trabalhar com dois, três meses de salários atrasados. Eu ficava 90% do tempo falando de dinheiro. Isso é uma função nossa, mas não o tempo todo. Não 90% do tempo. Coloquei meu cargo à disposição porque achava que era preciso uma mudança - disse.

Para Sidnei, o problema de salário atrasado tem influenciado bastante para o momento ruim do time, mas acrescenta outro ponto importante: a incerteza de uma continuidade no clube para muitos jogadores do elenco:

- Hoje, 50% do elenco, 90% do time titular, tem contrato somente até o final do ano. Isso também gera uma incerteza, uma insegurança. Também porque é um ano de eleição, em que o atual presidente não pode se reeleger. Então, são esses dois fatores, mas com o problema financeiro pesando mais.

Os salários atrasados resultaram em seguidas reclamações por parte do grupo. O ex-gerente julga tal atitude como legítima, mas confessa grande insatisfação com a decisão dos jogadores de protestarem justamente às vésperas da partida contra o Unión Española, pela Libertadores. O confronto, em pleno Maracanã, poderia garantir a classificação antecipada, mas o time perdeu por 1 a 0. Posteriormente, foi eliminado:

- Eles resolveram fazer o protesto antes do jogo e aquilo foi um tiro no pé. Tirou o foco. Durante uma semana se falou mais de greve e protesto do que a chance de classificar antecipadamente. Foi o único momento que falei que eles erraram. Ali desandou tudo. O grupo poderia ter entendido a importância daquela partida, ter mais calma. A história poderia ter sido diferente.

E tal atitude quase levou Bolívar a ser mandado embora. Sincero, o ex-gerente revela que a decisão de afastar o zagueiro seria para servir como uma espécie de lição para todo o grupo.

- Acho que todos tiveram parcela de culpa pela não passagem de fase. Foi um ponto crucial de todo trabalho. Todo mundo errou e todo mundo teve de pagar um preço. A diretoria paga até hoje, está sendo cobrada sempre. A comissão técnica foi cobrada, tanto que houve corte e demissão. E os jogadores teriam de ser cobrados. Essa era ideia da diretoria. Então houve uma conversa para o afastamento do Bolívar. Por ser um dos líderes do grupo, não que levasse todo mundo a fazer as coisas, mas por ser uma pessoa esclarecida, que falava tudo mais amplamente. Foi comunicado que não faria mais parte dos planos. Depois houve uma conversa dos atletas com a diretoria e vimos que se poderia fazer de outra forma. Que bom que o Bolívar ficou e está podendo ajudar o time. Mas depois do leite derramado todo mundo tem que assumir a responsabilidade. Os atletas precisavam assumir aquela mudança de foco.

Veja a entrevista completa abaixo:

O quanto a crise financeira pesou para você deixar o clube?
Isso traz muita dificuldade de se trabalhar, de desenvolver o projeto e a gente entende esse problema dos jogadores e da comissão técnica. Não é fácil trabalhar desta forma. Então tomei a decisão colocar o cargo à disposição ao presidente, que no seu entendimento era hora de ter uma mudança também.

Como vinha sendo a conversa diariamente com os jogadores?
Essa é nossa função, nosso trabalho é ser o elo entre diretoria e atletas. Uma das nossas funções é essa. O que não faz parte é fazer todo planejamento em cima de um orçamento que é passado no início do ano e com dois meses esse dinheiro não aparecer. O dinheiro não chegou, devido a vários problemas. Não estou julgando.

Mas o que foi passado no início do ano, sobre orçamento e tudo mais?
O Botafogo termina 2013 classificado para a pré-Libertadores e já com problema financeiro grande no clube. É feita uma reunião, em que o departamento financeiro e CEO do clube passa que teria de fazer uma redução no orçamento do departamento de futebol para viver um ano de 2014 com a saúde financeira bacana. Se tivesse dinheiro, a gente podia montar um time melhor, mas foi tudo feito dentro do que nos foi passado. O grande problema foi que, além de ter montado um elenco mais econômico, o dinheiro não veio. Se você acorda uma coisa e não funciona, como o pagamento dos salários em dia, acontece o que está acontecendo. Particularmente eu não era a favor da saída de alguns atletas, queria que o Oswaldo (de Oliveira) ficasse no cargo, mas a redução foi grande e as decisões foram tomadas nesse sentido.

Na época em que você saiu do clube, houve uma situação complicada, em que os jogadores se recusaram a viajar (para a Paraíba) porque havia a promessa do pagamento de atrasados naquela semana. Foi isso mesmo?
A diretoria passou para a gerência que a gente iria receber uma verba e seria destinada a pagamentos. Isso foi repassado aos jogadores e, por algum motivo, a verba não chegou e os atletas mais uma vez não receberam dentro do prazo acordado. Realmente não foi a primeira vez, aconteceram outras vezes, aí ficou muito complicado e por isso também coloquei meu cargo à disposição. Mas não foi algo do momento. Já estava amadurecendo isso há algum tempo.

O que mais deu errado neste ano?
A falta de dinheiro.

E o quanto isso pesa para o atual momento do time?
Pesa 90%. Porque não é só a questão financeira. É de política e de incertezas também. O Botafogo tinha a política de que o jogador quando chegava assinava por três, quatro anos. A nova gerência entendeu que seria melhor fazer um ano de contrato, pois pela Lei Pelé, se o clube fica insatisfeito com o atleta precisa depois pagar o período todo de contrato. Foi feito isso pensando na saúde financeira do clube posteriormente. Mas acaba tendo um outro lado. Atualmente, grande parte do nosso elenco tem vínculo só até o fim do ano e com uma incerteza se vai ou não continuar.

As coisas só vão melhorar quando a situação financeira for resolvida então...
Digo que não só quando a financeira for resolvida, mas quando alguém do clube, vice de futebol, não sei, alguém começar a fazer a transição e mostrar aos atletas o que será 2015. Isso é importante. Todo mundo sabe que tenho uma ligação com Mauricio e com a saída dele eu automaticamente sairia. Minha presença... Os atletas não me enxergavam como uma continuidade de trabalho. Por isso também coloquei o cargo à disposição, porque era importante abrir espaço para quem poderia dar essa continuidade para 2015.

O que fica de legado no clube?
O maior legado que fica é o trabalho da base. Foi importante para o clube, está sendo importante. Todo mundo sabe que a divisão de base do Botafogo era terra arrasada, que não revelava nenhum jogador de qualidade, que pudesse se tornar ídolo do time principal, como Vitinho, Gabriel e Dória, há muitos anos, não negociava um atleta da base, venda de atleta, desde o Beto, em 1996, para o Napoli (ITA). A longo prazo, foi mais importante para o clube até do que a conquista da volta à Libertadores.

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