Sem deficiência, ‘anjos da guarda’ não abrem mão de esportes paralímpicos

Modalidades como ciclismo, atletismo e o futebol de cinco dão espaço até para atletas convencionais, que buscam sintonia perfeita com times na batalha para subir ao pódio

Márcia Fanhani, cega, faz parceria com a piloto Mariane Ferreira, no ciclismo 
(Foto:Divulgação)

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Eles ganham medalhas e ajudam a obtê-las. Comemoram as vitórias com a mesma intensidade de seus parceiros. O esporte paralímpico está cheio de “anjos da guarda”.

São pessoas que, embora sem qualquer restrição física ou intelectual, desempenham papéis essenciais para a disputa das modalidades. Podem ser vistas nas quadras, pistas e campos onde acontecem os Jogos Paralímpicos do Rio de Janeiro.

Ainda que cada esporte tenha suas peculiaridades, os discursos destes atletas apontam para uma palavra em comum: confiança. É o que mostram a piloto de ciclismo Mariane Ferreira, o guia de atletismo Guilherme Santana e o goleiro de futebol de cinco Luan Gonçalves, integrantes da delegação de 512 pessoas do Brasil no megaevento.

Ex-ciclista da Seleção Brasileira de pista, Mariane, de 26 anos, garantiu sua ida aos Jogos de forma curiosa. Em 2014, foi procurada no Facebook pela paulista Márcia Fanhani, que precisava de alguém para lhe ajudar na preparação.

Engajada em projetos com bicicletas para crianças deficientes, a piloto parecia boa opção. Logo elas ficaram amigas.

– O principal é a segurança que você passa ao atleta. Se eu sentir ansiedade ou insegurança, ela sentirá o mesmo. No ciclismo, somos uma só. É um casamento, como nosso técnico costuma dizer. Uma bicicleta, dois corpos e uma pessoa – disse Mariane, 13ª na prova de perseguição Classe B (Tandem) 3.000m, que ainda competirá com Márcia no ciclismo contrarrelógio, amanhã, e de estrada, no sábado.

– Eu precisei escolher entre o olímpico e o paralímpico, porque não é permitido competir nos dois. Estou focada, tanto na prática quanto na teoria. Estudo esporte paralímpico na Unicamp, em um grupo de estudo e pesquisas sobre modalidades adaptadas – contou a piloto.

Nas pistas, Guilherme ficou famoso por guiar Terezinha Guilhermina, com quem trabalhou até o ano passado. Hoje, o atleta é nome de confiança de Jerusa dos Santos, que compete nos 100m, 200m, e 4x100m T11.

Aos 33 anos e formado em Educação Física, o paulista conta que, desde pequeno, gosta de ajudar quem precisa. Seja nos estudos ou na hora de buscar medalha.

No atletismo paralímpico, o velocista é ligado ao seu guia pelo braço. Mas o membro não pode ser puxado, sob pena de desclassificação.

– Uma professora dizia que eu era bom samaritano. Nunca dei bola. Minha motivação é fazer a atleta melhorar seu desempenho – disse.

Na bocha, os calheiros posicionam uma canaleta para ajudar os atletas a lançar a bola no caso dos que apresentam maior comprometimento motor.

Goleiro ouve piadas e ajuda a ambientar colegas

O goleiro Luan Gonçalves não se desanima quando é chamado para jogar futebol de cinco, praticado por deficientes visuais, ainda que tenha paixão por futsal convencional desde a infância.

Titular da Seleção Brasileira nos Jogos Paralímpicos do Rio, o atleta de 23 anos diz se sentir à vontade, apesar das piadas que tem de escutar de colegas.

– O pessoal chega e fala “como leva gol de cego?” Eu tento explicar, mas não acreditam muito. Só quando eu mostro o vídeo (risos) – disse Luan, que defende o Agafuc (RS).

– Quando ficamos perfilados para o hino, os jogadores me perguntam “como está o público? Tem muita gente?”. Tenho uma responsabilidade, mas eles são independentes.

Os goleiros não são os únicos não deficientes que participam dos jogos. No futebol de cinco, existe o chamador, posicionado atrás do gol para orientar as jogadas de ataque.

No Brasil, a missão é do paulista Luís Felipe Campos, de 29 anos, também preparador físico do time.

– Eu me sinto jogador de linha – disse o profissional, que não hesita em comemorar com os companheiros um gol no centro do campo.

QUEM SÃO ELES

Mariane Ferreira
Paulista de Aguaí, começou no ciclismo aos 18 anos e chegou a defender a Seleção Brasileira convencional. Hoje, aos 26, é piloto de Márcia Fanhani, cega desde sempre devido a uma atrofia do nervo óptico. 
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Guilherme Santana
Nascido em São Paulo, começou a competir na faculdade. Estreou como guia no Mundial de Christchurch-2011, com Terezinha Guilhermina, e hoje compete com Jerusa Santos, que descobriu glaucoma aos 18.
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Luan Gonçalves
Nascido em João Pessoa, começou no futsal aos oito anos e joga até hoje, no Clube dos Oficiais da Polícia Militar. Conheceu o futebol de cinco pelo zagueiro Damião, seu amigo, em 2013. Foi campeão mundial em 2014 e ouro no Parapan de Toronto (CAN).

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