‘O que está faltando na Olimpíada é um olhar mais isento’

Diário da tocha - A ex-jogadora de basquete Janeth Arcain carregou a tocha em Santo André (SP)
Ex-jogadora de basquete Janeth Arcain carrega a tocha (Foto: Rio 2016/Marcos de Paula)

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Se o governo prende preventivamente gente que troca mensagens na web, faz apologia aos atentados islâmicos e negocia a compra de armas é criticado. São colunistas que dizem que a ação assusta a população, afasta o público das arenas, deixa o carioca em pânico. Mas esses críticos, via de regra, não são os mesmos que gastam páginas de jornal, espaços nos sites e minutos de rádio e TV questionando a capacidade da polícia e dos órgãos de inteligência brasileiros no enfrentamento das ameaças terroristas? Não dá para entender, parece até que nunca estão satisfeitos com nada.

Mas é um pouco mais do que simples mau-humor.

Nesse período pré-olimpico, o que vale é descer o cacete no Rio e na organização dos Jogos. Alguns segmentos da grande imprensa nacional não conseguem sequer dissimular uma certa dor de cotovelo de quem no fundo nunca conviveu bem com essa coisa de olimpíada numa tal de "Cidade Maravilhosa". Como pode ser lá e não cá?, perguntam na intimidade.

Já em uma boa parte da mídia americana, percebe-se, sem preocupação de desfarçar, um certo ar de vingança dos que desde 2009 não engoliram que a poderosa Chicago tenha sido preterida pela assembléia do COI em favor de uma terra carioca, subdesenvolvida e ainda por cima habitada por bárbaros.

Parece até uma competição olímpica. Em que há medalhas de ouro, de prata e de bronze em disputa por quem conseguir mais assuntos, por quem caçar mais pelo em ovo para criticar a cidade, as arenas, os bastidores etc etc etc... Só isso pode explicar que coisas tão banais como um poste no caminho de uma ciclovia ganhe na mídia um espaço absolutamente desproporcional ao tamanho da notícia, com destaque nas homes e nas primeiras páginas.

A relação de problemas realmente graves é extensa. Atrasos e indícios de favorecimento aos amigos e superfaturamento das obras, legados que não serão entregues, queda da ciclovia Tim Maia, falhas no combate á zika, criminalidade crescente, ameaça de terrorismo, falência econômica – e política - do Rio, declarações tresloucadas e explosivas do prefeito Eduardo Paes.

Organizar uma olimpíada em uma cidade que tem sua infra-estrutura urbana consolidada, como fez Londres em 2012, já não é tarefa das mais simples. E não foram poucas as mazelas, as denúncias e os conflitos que surgiram por lá. O que dirá, então, num lugar em que serviços essenciais, do saneamento ao transporte, do aparato de segurança aos equipamentos de saúde ainda carecem de requisitos básicos para o pleno atendimento das demandas da população.

Por isso, apontar essas falhas é essencial. Essa, aliás, é uma obrigação da mídia, algo que não pode em momento algum ser relevado. Mas o que está faltando no caso da olimpíada é uma dose de humildade – ou de bom senso -, é um olhar mais isento, capaz de reconhecer o que esses Jogos antes mesmo da pira ser acessa já trouxeram para o Rio e sua gente.

Ganha um doce – ou um lugar no pódio - quem já tiver lido sobre o quanto as novas linhas de BRT (os ônibus expressos sobre canaletas) que cruzam a cidade, a ligação do metrô até a Barra e os “bondinhos” que passaram a percorrer ruas e avenidas do centro vão influenciar positivamente a vida de milhões de pessoas pós-olimpiadas.

Ah, e a revitalização da região portuária? Quantas fotos você já viu que revelem o quão bonito ficou aquilo ali? Com os armazéns recuperados, os boulevards arborizados, o Museu do Amanhã e o Museu de Arte do Rio. Garanto que ia te interessar tanto ou mais do que o tal poste no meio da ciclovia...

O que resta é torcer para que, ao menos quando as competições começarem, uma dose de bom humor e tolerância contagie o ambiente. Sem ufanismo – algo tão desprezível quanto a má vontade -, mas com realismo. E vamos em frente que a tocha está chegando.

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