Goleiro Renan fala da decisão de parar e da vida longe dos holofotes

Ex-Corinthians e Avaí surpreendeu ao se aposentar dos gramados aos 27 anos e, ao LANCE!, contou como leva a vida sem a badalação do mundo da bola

Renan se aposentou do futebol
Lara Mota

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Na semana em que completou 27 anos, o goleiro Renan (ex-Avaí e ex-Corinthians) anunciou a aposentadoria, surpreendendo justamente por abandonar a profissão ainda jovem. Morando em Santa Catarina, ele tem levado uma vida sem badalação e distante da realidade do futebol, que ele vivia desde as categorias de base. O LANCE! foi até Itapema, a 60 km da capital Florianópolis para ouvir Renan e ver de perto a nova vida do agora ex-goleiro, que continua com as mãos calejadas, mas de tanto trabalhar na construção civil.

De boné e chinelo de dedo, Renan anda pela praia cumprimentando a todos, dá pra ver o quanto é bem quisto. A vida é pacata, ele sequer tem redes sociais. A cidade tem 60 mil habitantes, número que aumenta muito na temporada de veraneio. E é nesse clima que Renan escolheu viver quando parou de jogar.

- Eu posso falar que se encerrou um ciclo que eu considero vitorioso, dez anos como profissional. Hoje eu me considero um aposentado, um construtor, estou na construção civil agora junto com a minha família e é vida que segue. Eu acho que tudo tem um começo, meio e fim e que o meu fim no futebol chegou -, revela.

A tranquilidade com que ele encara o fim da carreira de goleiro impressiona. E a pergunta que fica é se o futebol deixou mágoas irreversíveis a ponto de ele querer deixar a profissão.

- Todo mundo tem mágoa no futebol. Você é retirado do time em um momento em que você acha que está bem e o treinador acha que você está mal, mas eu não tenho mágoa de nenhum treinador. Às vezes a gente fica um pouco triste, mas eu aprendi uma coisa: a gente não erra, a gente aprende -, completa.

Renan surgiu nas categorias de base do Avaí. No profissional, teve um desempenho que despertou o interesse de grandes clubes e rendeu a ele inclusive uma convocação para a seleção brasileira. O técnico era Mano Menezes e o plano era levar Renan para a olimpíada de Londres em 2012. Foi Mano quem o indicou ao Corinthians e ele chegou como grande promessa na posição. Já sob o comando de Tite, foram apenas três jogos com a camisa do clube paulista: derrota para o Cruzeiro (0x1), derrota para o Avaí (3x2) e vitória contra o América MG (2x1). A torcida não perdoou o desempenho abaixo do esperado e começou aí um ciclo de empréstimos que só terminou quando o contrato de cinco anos com o Corinthians acabou.

Em clubes do interior, Renan viveu um outro lado do futebol, com salários atrasados, falta de estrutura e de apoio. - Tem muita coisa errada no futebol. Hoje o futebol brasileiro está pagando por isso, é só ver televisão. A gente vai se decepcionando, isso foi me desgastando, se tornou cansativo e chegou em um ponto em que eu não aceitava mais tanta ilusão e tanta mentira.

A última vez em que entrou em campo foi pelo Tigres, do Rio de Janeiro, onde fez 13 partidas em 2016. Parar foi um processo amadurecido ao longo deste ano.

A vida fora do futebol

Mãos de goleiro são sempre judiadas, mas as de Renan têm marcas pouco comuns à profissão, adquiridas recentemente, na nova função que ele exerce como construtor civil. O dia para ele começou na obra, amarrando as ferragens do novo prédio que estão erguendo.

- Eu cuido da parte burocrática da obra, mas quando tem que por a mão na massa a gente põe, não tem problema nenhum, sem medo, sem vergonha nenhuma, porque eu admiro as pessoas que trabalham o dia todo debaixo do sol. Eu sou um cara vencedor, porque eu consigo ficar o dia todo trabalhando como servente de pedreiro na obra. Corto ferro, amarro, faço massa, estou aprendendo ainda... (risos) ponho um tijolinho às vezes, estou em fase de aprendizado -, revela com um sorriso de contentamento no rosto. A empresa familiar está crescendo aos poucos. Renan trabalha ao lado do pai e do irmão, empreendendo nas cidades da região.

O filho Bernardo tem cinco anos e nasceu quando ele estava emprestado ao Estoril de Portugal. O menino não tem muitas lembranças do pai em ação, mas Renan se orgulha do que tem para mostrar. - Ele de vez em quando pede: papai, você não vai jogar? Aí a gente explica que o papai está em outro ramo. De vez em quando ele pega umas fotos e umas camisas e pergunta, aí eu vou na internet e mostro pra ele. E ele gosta de futebol, qual criança que não gosta? Mas vai ficar guardado e com certeza ele vai colocar no YouTube um dia e dizer: esse era meu pai.

A única saudade que Renan tem é dos amigos. - Sinto falta da concentração, das amizades, de treinar.. eu gostava muito de treinar, eu era o primeiro a chegar e o último a sair em todo clube que eu passei, então a gente sente falta daquela resenha, mas agora é outra rotina né, é vida nova. Nós estamos no final do ano, é começar 2018 com o pé direito e trabalhar, esquecer futebol um pouquinho. Falta a gente vai sentir quando ligar a televisão e ver o Maracanã cheio ou ver a Ressacada lotada como a gente via aqui em Santa Catarina. Mas isso faz parte, vai ficar guardado na memória de todos que me acompanharam e na minha e da minha família, não vou esquecer tudo o que eu vivenciei no futebol.

A postura é corajosa, nem sempre esse término se dá de maneira tranquila. Renan mudou de ares e de vida, está claramente mais leve e feliz e deixa como recado um agradecimento, e a lição de que existe vida fora do futebol. - Agradeço a todos que sempre me apoiaram. Só tenho que agradecer tudo o que deu certo no futebol, tudo o que deu de errado, não me arrependo de nada -, afirma. E completa: - Hoje eu estou tranquilo, de bem comigo mesmo e com a minha família. E quando a gente está próximo da família, as coisas acontecem naturalmente e fica tudo certo.

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