‘Dividido entre a esperança e a razão’, Fortaleza tenta acabar com drama

Após sucessivas frustrações, time cearense tem nova chance de voltar à Série B. Contra o Juventude, neste domingo, o desafio é domar a tensão. ‘Chegou a hora’, diz cantor Fagner

Cerca de 60 mil torcedores do Fortaleza são esperados no jogo de domingo 
(foto:Eduardo Viana/Lancepress)

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“Tenho um coração dividido entre a esperança e a razão.”

Raimundo Fagner dá risada quando lhe pergunto se o verso inicial de “Borbulhas de Amor”, sucesso na voz do cantor cearense, combina com o momento vivido pelo torcedor do Fortaleza. Neste domingo, às 19h, o Tricolor de Aço enfrenta o Juventude, pelas quartas de final da Série C do Campeonato Brasileiro. O confronto define qual dos dois clubes vai disputar a Segunda Divisão em 2017. O jogo de ida, em Caxias do Sul, terminou em empate sem gols. No Castelão, quem vencer se classifica.

- É um drama, um martírio. Como todo torcedor do Fortaleza, estou ansioso para acabarmos logo com isso. Chegou a hora - diz o músico, de 66 anos.

Fagner tem motivos para cultivar esperança. Atual bicampeão do estado, o Tricolor terminou a primeira fase da Terceirona como líder do Grupo A. Os 30 pontos conquistados lhe deram o direito de decidir a vaga em casa, onde a equipe é especialmente forte. Em maio, pela Copa do Brasil, duelou com o Flamengo, um dos candidatos ao título da Série A, no Castelão. Venceu por 2 a 1, diante de mais de 36 mil torcedores. Para este domingo, a diretoria do clube cearense projeta público superior a 60 mil pessoas.

Fagner tem motivos, porém, para permanecer racional, desconfiado. Carrega uma cautela decorrente das decepções acumuladas desde o último rebaixamento, em 2009.

- Temos uma torcida vibrante, apaixonada, que não merece mais esse sofrimento. Mas estamos falando de futebol, né? Tudo pode acontecer, as coisas se resolvem no campo - reconhece o cantor, como quem se prepara para o pior.

"Estou muito esperançoso. A torcida do clube e o estado do Ceará merecem o acesso, sem desmerecer o Juventude. Ninguém aguenta mais (Fagner, cantor)


Parece até maldição. Em 2012, o Fortaleza deixou escapar o lugar na Segunda Divisão ao perder como mandante para o Oeste por 3 a 1 - a partida de ida havia terminado sem gols.

No ano seguinte, um empate por 2 a 2 diante do Sampaio Corrêa-MA, com direito a gol sofrido no minuto final, impediu a equipe cearense de chegar ao mata-mata.

Em 2014, o Leão do Pici, como o Fortaleza também é conhecido, alcançou as quartas de final. Depois de dois empates (0 a 0 e 1 a 1), porém, foi eliminado pelo Macaé, por consequência do gol marcado como visitante pela equipe carioca.

A campanha do ano passado foi ainda mais frustrante. O time então sob o comando de Marcelo Chamusca passeou na fase classificatória, mas voltou a negar fogo na hora H. No primeiro duelo do confronto contra o Brasil, em Pelotas (RS), derrota por 1 a 0. Na volta, um dolorido 0 a 0. Afinal, o Tricolor desperdiçou 13 chances claras. Acertou duas bolas na trave. Eduardo Martini, o goleiro do Xavante, teve uma tarde de Gordon Banks.

- Não me lembro de outro jogo em que um time tenha criado tantas oportunidades e saído sem vencer. Não gosto nem de lembrar. É página virada - diz o goleiro Ricardo Berna, um dos remanescentes da equipe de 2015.

Talvez seja este o principal desafio do Fortaleza: evitar que os fantasmas assustem os jogadores em uma partida que exige nervos de aço. Uma psicóloga tem trabalhado diariamente com o elenco leonino. Tenta afastar dos atletas o peso dos fracassos anteriores.

Berna compara o cenário ao vivido no Fluminense às portas do título brasileiro de 2010:

- Lá, a ansiedade era grande porque a torcida queria muito uma conquista nacional. Tivemos de manter o controle emocional. Todos sabemos do projeto do Fortaleza de estar na Série A em 2018, no ano do centenário. Mas temos de dar um passo de cada vez - alerta o goleiro. 

"Todos sabemos do projeto do Fortaleza de estar na Série A em 2018, no ano do centenário. Mas temos de dar um passo de cada vez (Ricardo Berna, goleiro)


É difícil dissipar a tensão. Um dos líderes da equipe cearense, o volante Corrêa, ex-Palmeiras, não quis dar entrevista para o Lance!. O presidente Jorge Mota, eleito em dezembro de 2014, desculpou-se tão logo atendeu o telefone:

- Rapaz, você me perdoe, mas não vou falar, não. Vai que eu digo alguma coisa que é mal-interpretada... Melhor me preservar.

A preocupação da direção é com o futuro. A saúde financeira do Leão do Pici está ligada ao acesso. Para honrar a folha salarial do departamento de futebol (quase R$ 1 milhão por mês, a mais cara entre as 20 equipes da Terceira Divisão), o clube depende da arrecadação com venda de ingressos e do programa de sócio-torcedor. Os seis patrocinadores presentes no uniforme pagam um total de R$ 1,5 milhão por ano. Somente os direitos de transmissão da Série B rendem R$ 5 milhões a cada time participante.

- Estamos confiantes de que, desta vez, vamos conseguir a vaga. Não há mal que dure para sempre - afirma o vice-presidente do Fortaleza, Ênio Mourão.

- Mas o que vai fazer a gente subir ou não é a atuação da equipe. Temos de fazer o nosso melhor. Se isso será suficiente, nós vamos descobrir depois do jogo - acrescenta o dirigente, também dividido entre a esperança e a razão.

Bate-bola com Raimundo Fagner, cantor e torcedor do Fortaleza

‘Ninguém aguenta mais’

LANCE! - Acha que o Fortaleza, desta vez, vai subir?
Fagner - Estou muito esperançoso. A torcida do clube e o estado do Ceará merecem o acesso, sem desmerecer o Juventude. Ninguém aguenta mais.

Tem conseguido assistir aos jogos do time?
Eu moro no Rio, fica difícil ir ao Castelão. Mas vejo sempre os jogos pela TV. O time é bom. A diretoria fez uma mescla de jovens com experientes.

Como começou sua relação com o clube?
Eu me criei no Pici (bairro onde se localiza a sede social do Fortaleza), com o meu irmão (Fares Lopes) me levando ao clube. Ele foi presidente do Fortaleza e também da Federação Cearense. O Ricardo (Teixeira) queria, inclusive, que ele o sucedesse na CBF, várias pessoas também queriam. Minha casa era frequentada por jogadores do Fortaleza. Sou tricolor desde pequeno.

Você chegou a jogar pelo Fortaleza, não?
Foi em 2002. Entrei no segundo tempo de um amistoso contra o Maranguape, no lugar do Clodoaldo, que era um dos ídolos da torcida. Conversei com o zagueiro adversário, pedi para ele pegar leve comigo. Ele respondeu que só deixaria eu jogar se desse um CD autografado para a minha mulher. Não marquei gol, mas fiz a minha graça (risos).

Vai assistir ao jogo decisivo?
Estarei em Minas Gerais para fazer um show. Será na Serra da Piedade, durante a tarde. Se tudo der certo, já estarei no hotel, em Belo Horizonte, antes de a partida começar.

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